O
TOPO
DA MONTANHA
(“I HAVE A DREAM!”.
ou
ESSE SONHO TEM DE SE
TORNAR
REALIDADE!)
Um
espetáculo chegou ao Rio de Janeiro
e está em cartaz no Teatro SESC
Ginástico: “O TOPO DA MONTANHA”.
Depois
de grande sucesso em São Paulo (estreou em 9 de outubro de 2015) e em
outras cidades brasileiras, tendo sido visto
por mais de 50.000 espectadores, aportou, aqui, incensado pela grande mídia. E
COM MUITO MERECIMENTO!!!
Não porque tem dois atores globais no
elenco, e sim porque tem dois grandes ATORES,
TAÍS ARAÚJO e LÁZARO RAMOS (obedecendo, simplesmente, à ordem alfabética),
contando uma história bem escrita, igualmente dirigida e que fala de amor e fraternidade, que trata de liberdade e igualdade, que é um tratado de respeito ao ser humano, de
valorização do Homem, independentemente, e acima, de qualquer coisa.
No caso em tela, a temática é o “racismo”, vocábulo feio, sonora e
visualmente, e, mais ainda, semanticamente, o que causa maior asco, palavra que
jamais poderia ter sido criada nem fazer parte do léxico da língua portuguesa.
Mas, infelizmente, o termo teve de ser cunhado, em todas as línguas – é uma
lástima - porque foi necessário um substantivo para nomear um dos
comportamentos mais abjetos da raça que se diz “humana”.
SINOPSE:
O nome da peça faz alusão ao último discurso do Reverendo MARTIN LUTHER
KING JR. (I’ve Been to the
Mountaintop) realizado em Memphis,
na Igreja de Mason, no dia 3 de abril de 1968, um dia antes de
seu assassinato, cometido na sacada do Hotel
Lorraine.
É, exatamente, neste cenário, do quarto
306, e na sequência de suas derradeiras palavras públicas, que o reverendo MARTIN LUTHER KING JR. (LÁZARO RAMOS)
conhece CAMAE (TAÍS ARAÚJO), a
misteriosa e bela camareira, em seu primeiro dia de trabalho no
estabelecimento.
Repleta de segredos, ela confronta o líder religioso, em clima de
suspense e, simultaneamente, debochado e provocador.
Desse modo, em perfeito jogo de provocações, faz o reverendo se
lembrar de que, como todos, é humano.
Por meio do humor e da emoção, faz rir e pensar, com retórica atual,
seja para americanos ou brasileiros.
Um
adjetivo, aplicado à personagem CAMAE,
na sinopse acima, justifica o fato
de eu ter de ser um tanto cuidadoso, ao analisar este espetáculo, para não
tirar a grande surpresa reservada aos que vão assistir à peça, em seus momentos
finais. O meu leitor jamais me perdoaria um “spoiler” de grandes proporções, que o desestimulasse a assistir ao
espetáculo. Preparem-se para duas grandes revelações, bombásticas: uma
sobre CAMAE e outra sobre Deus!
A peça
estreou em Londres, em 2009 e foi conhecer a Broadway, em 2011.
De acordo com o “release”, enviado pela assessoria
de imprensa (LAÍS MAURÍLIO LIMA DE
SOUZA), “A encenação, que conquistou tantos
espectadores, relembra que, há quase cinquenta anos, no dia 4 de abril de 1968,
o mundo se despedia de MARTIN
LUTHER KING JR., o pastor protestante e ativista político, que se tornou
ícone, por sua luta pelo amor ao próximo e pelo repúdio à segregação racial
norte-americana. Vale lembrar que, somente entre 1883 e 1959, cerca de cinco
mil negros foram linchados, nos estados do Sul do país – e é este o momento
histórico que a jovem dramaturga KATORI
HALL (acréscimo meu: negra, de 35 anos) desconstrói na ficção.
A escrita, diga-se de passagem, faz sentido, mesmo quando comparado os
dias de hoje à situação política daqueles tempos. Por exemplo, a frase do
espetáculo ‘PAREM A GUERRA DO VIETNÃ E COMECEM A LUTAR CONTRA A POBREZA’, vista
sob a ótica do presente, ainda parece possível ser proferida e ressalta as
características de um líder, que teve a força de amar aqueles que jamais
puderam amá-lo de volta”.
Segundo depoimentos do ator protagonista e um dos produtores do espetáculo, LÁZARO RAMOS, ao lado de TAÍS, sua esposa, “Este texto me perseguiu, como
ator, por dois anos, por meio de pessoas que diziam que eu tinha de fazê-lo, no
Brasil. E é contemporâneo, porque é uma história também sobre enfrentar medos.
Sobre os trilhos da coragem e do afeto”.
Tenho de concordar com LÁZARO:
não só é bastante contemporâneo como também não está restrito às fronteiras
norte-americanas. Ele, o texto, é
capaz de dizer muito, a todas as pessoas, negras ou não, em todo o mundo. Mexe
com a sensibilidade e a emoção de qualquer pessoa que tem afeto, amor, apreço e
respeito pelo seu semelhante.
E é TAÍS quem complementa: “Tínhamos
muito receio de que o texto fosse americano demais e não tocasse as pessoas.
Mas o tempo e uma boa tradução nos convenceram de que as questões do amor e da
igualdade são relevantes e próximas a todos nós”.
O próprio LÁZARO já havia feito uma tradução do original, cujo resultado não
lhe agradou. A excelente tradução utilizada é de SÍLVIO JOSÉ
ALBUQUERQUE E SILVA, ou, simplesmente SÍLVIO
ALBUQUERQUE, o qual conseguiu “dar vida a temas universais e ainda
envolventes” num texto,
segundo ele, no qual “(KATORI) HALL revela um líder, ao mesmo
tempo radical e pragmático, profético e imprevidente, sonhador, sedutor, frágil
e, sobretudo, humano”.
O tradutor, grande admirador e conhecedor da vida e obra de KING, era chefe de gabinete do
ex-ministro do STF, Joaquim Barbosa, e entregou uma
tradução do texto, que fizera, a LÁZARO RAMOS, quando este fora a
Brasília, com a intenção de entrevistar S. Exª, para um programa de TV.
Penso que esse seja o grande mérito
do texto original e da tradução: mostrar um MARTIN LUTHER KING sob outra ótica, totalmente humanizado, não quase canonizado,
como o é, até hoje. Se Jesus, antes
de tudo um Homem, também teve suas fraquezas e medos, até na hora da morte, por
que não poderia – como, realmente, deve ter acontecido – KING ter passado pelas mesmas sensações e incertezas, em sua pregação?
Também
é importante falar que, a dramaturga não deixou de mencionar, como uma prestação
de homenagem, Malcom X, resgatando-lhe o pensamento. Al Hajj Malik Al-Shabazz era seu nome verdadeiro (1925/1965), que também
foi um dos maiores defensores do Nacionalismo Negro nos Estados Unidos, tendo fundado a Organização
para a Unidade Afro-Americana, de inspiração separatista. Defensor dos direitos dos afro-americanos, ele, que teve o
pai brutalmente assassinado, conseguiu mobilizar brancos e negros na
conscientização sobre os crimes cometidos contra a população afro-americana.
Para negros e brancos, índios ou
amarelos, para todos os que enxergam, no “racismo”,
um câncer, que precisa ser extirpado, completamente, de todas as sociedades, a
imagem que MARTIN LUTHER KING JR.
deixou foi a de um quase santo, entretanto pouco se sabe, ou se fala, do seu
lado Homem. KATORI HALL teve a coragem de desconstruir um mito e mostrar um
grande herói, sim, que habitava (n)um ser humano.
Parti para o Teatro Ginástico com uma enorme expectativa. Achava que iria sofrer,
certamente, e chorar, talvez muito, com um drama, que mostrasse os últimos dias
de vida do grande líder humanista. Fui preparado para usar o lenço, mas não me
utilizei dele. Mas a peça não é bem, ou somente, sobre isso. É claro que me
emocionei, em determinadas cenas, bastante, entretanto a proposta da autora é
chamar o público a uma reflexão, mas, sobretudo, quase o tempo todo, de uma
forma leve, regada com bastante humor, por parte da personagem de TAÍS, a qual demonstra, mais uma vez,
nos palcos – lugar onde quem se diz artista mostra a que veio de verdade (nada
contra quem se recusa a fazer TEATRO)
-, uma competência no ofício, já demonstrada em cerca de dez espetáculos
teatrais de que já participou, fora seus trabalhos em outras mídias.
Desde sua primeira aparição, há uma empatia muito intensa entre plateia
e personagem, principalmente por parte dos que se consideram minoria. Reforço: por conta da belíssima atuação de TAÍS e da natureza de CAMAE,
totalmente desprovida de pudores e autocensuras. A atriz, muito merecidamente,
foi indicada a um Prêmio de Teatro,
em São Paulo, e deverá sê-lo, também,
em nossa cidade. Lamento, profundamente, que LÁZARO também não o tenha sido,
uma vez que ambos se equivalem, em rendimento, em cena, pondo em prática uma
grande parceria e generosidade entre marido e mulher e colegas do mesmo ofício.
LÁZARO,
como grande ator que é, construiu seu personagem sem a preocupação de imitá-lo,
o que, se não acontecesse, poderia desaguar numa caricatura não bem aceita pelo
público. Ao contrário, e muito corretamente, atua com total naturalidade e
personalidade, como se o nome do personagem fosse outro, mas o que ele
representa, na trama, tivesse a ver com aquele sobre o qual se debruçou a
dramaturga. Não me parece que o ator tenha observado e estudado a voz e os
gestou do personagem, para reproduzi-los, mas, sim, criou uma reprodução
“tupiniquim” – NO MELHOR SENTIDO DE
"BRASILEIRISMO" – do Pastor.
Como ele mesmo disse, em entrevistas, “uma apropriação nossa, que
permitiu compartilhar nosso afeto durante o ensaio. Com isso, entendemos
perfeitamente o grande ensinamento deixado por esse homem”.
A “camareira” (Atenção para o grifo; isso é uma pista.), durante todo
o tempo de duração da peça, não se mostra inferior ao grande líder, o que será
entendido, ao final da encenação, e, de todas as formas, provoca-o, fazendo-o
perceber suas fraquezas, seus vícios, seus acertos e erros, o seu ser na
intimidade, num confronto, por vezes, hilário. KING vê-se obrigado a sucumbir à “pressão” imposta por CAMAE.
Pode faltar tudo ao espetáculo (NÃO FALTA NADA!!!), menos uma “química”
entre o casal de atores, já acostumados a dividir o “set”. Tenho a impressão de
que, salvo melhor juízo, em TEATRO,
é a primeira vez que atuam, ou, pelo menos, que os vejo, juntos, a não ser que
a memória esteja me traindo.
A direção da peça é do próprio LÁZARO
RAMOS, entretanto, envolvido em outros projetos, fez um grande acerto, ao
convidar FERNANDO PHILBERT, para
codirigir o espetáculo com ele. FERNANDO
vem assinando, como diretor assistente
ou titular, alguns dos melhores mais
recentes espetáculos teatrais.
Gostei muito da cenografia,
de ANDRÉ CORTEZ, que mostra, por
meio de paredes de vidro ou vazadas, o interior do quarto em que estava
hospedado KING. É lá que se passa ação;
poucas vezes, foge a essa área. A base dessa ótima cenografia é uma estrutura de metal, que se abre, quase ao final da
peça.
Esse detalhe final da cenografia
é bastante curioso, uma vez que ANDRÉ
utiliza o mesmo processo que aplicou em “Gota
D’Água [A Seco]”, qual seja o de expansão
do cenário. Lá, porém, os movimentos de expansão e contração das paredes se
repetia e, a cada cena em que crescia o embate entre os personagens Joana e Jasão, o cenário de fechava, em função de uma situação de perigo,
que exigia um “fechamento do círculo”. Em “O
TOPO DA MONTANHA”, o movimento é único, apenas o de expansão, no momento em
que uma grande revelação é feita, ao final, e quando o protagonista percebe
que, apesar do seu sacrifício de morrer, lutando pelos fracos e oprimidos,
paradoxalmente, sua morte pode representar uma abertura nas mentes das pessoas
e uma esperança de um futuro melhor, não só para os negros, mas para todos os
discriminados. O “circulo se expande” e abre as portas para um espaço eterno. Tudo feito por CAMAE, e isso não é só um detalhe. Sem
dúvida, um momento de grande inteligência da direção/cenografia.
Mais do que um técnico no assunto, apresento-me como um grande
apreciador da iluminação, no TEATRO, e posso dizer que me pareceu muito boa e
correta a luz de WALMYR FERREIRA.
Os demais elementos técnicos
do espetáculo, como figurinos (TERESA NABUCO), trilha sonora (WLADIMIR
PINHEIRO) e desenho de som (LAÉRCIO
SALLES) atendem às necessidades do espetáculo, estando dentro do correto e
ajustado à montagem.
Não posso, também, deixar de mencionar o bom trabalho de videografismo, de RICO e RENATO VILAROUCA.
FICHA TÉCNICA:
Texto: Katori
Hall
Tradução: Sílvio
Albuquerque
Consultoria Dramatúrgica: Ângelo Flávio
Direção: Lázaro
Ramos
Codireção: Fernando
Philbert
Assistência de Direção: Thiago Gomes.
Elenco: Lázaro Ramos e Taís
Araújo
Voz Inicial da Mãe de Martin Luther King: Léa Garcia
Preparação Vocal: Edi Montecchi
Cenografia: André
Cortez
Assistência de Cenografia: Carmem Guerra
Construção do Cenário: Ono Zone Estúdio/ Fernando Bretas e Waldir Rosseti
Iluminação: Walmyr Ferreira
Assistência de Iluminação: Marcos Freire
Construção do Cenário: Ono Zone Estúdio/ Fernando Bretas e Waldir Rosseti
Iluminação: Walmyr Ferreira
Assistência de Iluminação: Marcos Freire
Figurinos: Teresa
Nabuco
Trilha Sonora: Wladimir Pinheiro
Desenho de Som: Laércio Salles
Projeções: Rico Vilarouca e Renato Vilarouca
Desenho de Som: Laércio Salles
Projeções: Rico Vilarouca e Renato Vilarouca
Fotos de Estúdio: Jorge Bispo
Fotos de Cena: Valmyr Ferreira e Juliana Hilal
Projeto Gráfico: Dorotéia Design, Adriana Campos e Tamy Ponczyk
Revisão: Regina
Stocklen
Serviços de Camareira: Solange Carneiro
Contraregragem: Fabiano Motomoto
Operação de Luz: Kadu Moratori
Operação de Som e Projeção: Fernando Castro
Serviços Técnicos de Projeção: Bruno Mattos
Supervisão Técnica de Projeção: Alexandre Bastos - Novamídia
Serviços Técnicos de Projeção: Bruno Mattos
Supervisão Técnica de Projeção: Alexandre Bastos - Novamídia
Assistência Técnica e de Produção: Igor Dib
Assistência de Administração: Jandy Vieira
Administração Lei Rouanet: Thiago Oliveira
Administração Lei Rouanet: Thiago Oliveira
Produção Executiva e Administração: Viviane Procópio
Administração Geral: André Mello
Direção de Produção: Radamés Bruno
Produção: BR
Produtora
Produtores Associados: André Mello, Lázaro
Ramos e Taís Araújo
SERVIÇO:
Temporada: De 21 de
janeiro a 19 de fevereiro de 2017.
Teatro SESC Ginástico
(513 lugares)
Endereço: Av. Graça Aranha, 187, Centro – Rio de Janeiro
Tel.: (21) 2279-4027
Dias e Horários: 6ªs
feiras e sábados, às 19h; domingos, às 18h
Valor dos Ingressos: R$6,00
(Associados Sesc), R$12,00 (para jovens até 21 anos, estudantes e maiores de 60
anos) e R$25,00 (inteira)
Funcionamento da Bilheteria: De 3ª feira a domingo, das 13h às 20h
Aceita cartões de débito e crédito.
Os ingressos serão gratuitos para o público inscrito no PCG – Programa de Comprometimento e Gratuidade.
Funcionamento da Bilheteria: De 3ª feira a domingo, das 13h às 20h
Aceita cartões de débito e crédito.
Os ingressos serão gratuitos para o público inscrito no PCG – Programa de Comprometimento e Gratuidade.
Classificação Etária: 12 anos
Gênero: Comédia Dramática
Duração: 90 minutos
Ainda ni início da temporada teatral de 2017, "O TOPO DA MONTANHA" já se candidata a um dos melhores espetáculos do ano.
LÁZARO e TAÍS estão à procura de um novo espaço, para que a peça faça uma
segunda temporada no Rio, mas todos
sabemos o quanto é difícil e problemático encontrar uma pauta nesta cidade. Só que não é possível que um espetáculo
como “O TOPO DA MONTANHA” fique restrito a um público pequeno, numa temporada
tão curta!!!
Que os DEUSES DO TEATRO se
apiedem (um pouco de tragédia grega não faz mal a ninguém) dos que ficaram
frustrados, por não conseguir um ingresso para a peça, já que todos foram
vendidos na primeira semana em cartaz, e proporcionem, ao querido, simpático e
talentoso casal, a graça de um novo teatro,
para uma longa temporada da peça.
Que assim seja! Amém!!!
(FOTOS: JORGE BISPO - estúdio -
e
VALMYR FERREIRA e JULIANA HILAL - cena.)
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