segunda-feira, 7 de abril de 2014


CAMILLE E RODIN
 
(CRIADOR E CRIATURA: QUEM É QUEM?)





 
 
O espetáculo CAMILLE E RODIN, que está em cartaz no Teatro Maison de France e que encerrará a temporada no dia 13 de abril (apenas mais uma semana) é uma peça que conta a relação amorosa e conflituosa entre um mestre da escultura e uma  discípula.
 
            É muito interessante a biografia de Camille Claudel.  Apesar de as maiores loas serem sempre cantadas em louvor a Rodin, afirma-se, com muita frequência, que a criatura teria superado o criador.  Dizem até que muitas das esculturas atribuídas a ele teriam sido, na verdade, feitas por Camille.
 
            Tendo ingressado, em 1881, na Academia Colarossi, em Paris, uma escola que formava artistas escultores, teve alguns mestres, até chegar a Auguste Rodin, o qual, com o passar do tempo, percebeu, impressionado com o trabalho da jovem, que lhe devia uma atenção especial, convidando-a a frequentar seu atelier, como discípula e modelo. 
 

 
 

Começou auxiliando o mestre em suas obras, criando, paralela e ocultamente, as suas próprias, ambas com muitos traços em comum.  Os dois se envolveram e mantiveram um caso ardente de amor, cheio de percalços, uma vez que Rodin não se decidia a romper seu compromisso antigo com Rose Beuret, com quem morava e até tinha um filho, para assumir a relação com Camille. 
Rodin não parecia ser sincero com Camille, apesar de fazer-lhe muitas juras de amor, em cartas a ela escritas.  Tinha fama de mulherengo, enquanto ela morria de ciúmes dele. 
Em 1888, Camille deixou o lar dos pais e foi morar numa casa alugada por Rodin, chamada por eles de “Retiro Pagão”, a partir de quando passaram a frequentar, juntos, locais públicos, assumindo o romance, um grande escândalo para a época.
            Camille queria que Rodin se casasse com ela, mas ele insistia em ser apenas o amante, dizendo-lhe que não poderia abandonar a mulher que o socorrera tantas vezes em momentos de dificuldade.  Na verdade, aquilo parecia uma simples desculpa e um sinal de que o mestre tinha medo de que a discípula o suplantasse.
            Em 1892, Camille sofreu um aborto.  Não se sabe se foi natural, mas o drama, certamente, a abalou.  Ela abandonou o “Retiro Pagão” e decidiu se afastar de Rodin.  Para recuperar o "tempo perdido", concentrou-se no trabalho, para desvincular sua arte da do amante.  É sua fase mais produtiva.
Tornou-se muito triste e depressiva, por acusações de que copiava o mestre ou de que suas obras não teriam sido feitas por ela.  Não contava com a aprovação da família, na escolha da profissão, nem com a aceitação da sociedade, que não perdoava uma mulher querer ser artista.  Rompeu com Rodin, definitivamente, em 1898.
 
 
 
 
Sentindo-se humilhada, desprezada, ferida em seu orgulho de mulher e de artista, completamente desorientada e achando que Rodin, na verdade, havia se aproveitado dela, para atingir maior notoriedade, Camille Claudel passou a sentir por ele um estranho sentimento, mesclado de amor e ódio, que a levou a uma (discutível, até certo ponto) paranoia e à loucura. 
 
Passou a ter um comportamento estranho e tonou-se obsessiva, chegando a desejar a morte de Rodin, como um meio de se libertar do jugo de seu “algoz”.
 
Com o passar do tempo, as crises paranoicas foram se multiplicando e se tornando mais acentuadas, fazendo-a crer, ela mesma, em seus delírios.  Deixou-se, então, falar sozinha, isolando-se num hotel, chegando à esquizofrenia.  Também chorava muito e principiou a ter ideias de suicídio.  Criava histórias imaginárias, que passou a achar que eram puramente verdadeiras.  Vivenciou, a partir de então, uma terrível época, em que suas crises de loucura aumentaram, e caiu num grande abatimento físico e psicológico, não se alimentando mais e desconfiando de todas as pessoas, achando que todos desejavam matá-la.  Isolou-se completamente.
 
A morte do pai, o único que a apoiava, em 1913, fez piorar, por completo, sua depressão e a abandonar a realidade mais ainda.   Entrou em uma crise violenta, quebrando tudo, suas próprias obras, e gritando desesperadamente, até ser internada num manicômio, vindo a morrer, em 1943, aos 79 anos de idade, após trinta anos de internação e desespero, passando todo esse tempo amarrada e sedada.
 
O espetáculo me agradou, no geral, mas não posso deixar de fazer algumas considerações que não contam com o meu humilde aval.

 
 
 
 
O cenário é bem interessante e me chamou a atenção, logo que adentrei o teatro.  Assim como, no espetáculo VERMELHO, cuja proposta da cenografia era mostrar o atelier de um grande pintor, aqui, o espectador “invade” o que seria o atelier de um escultor.  Senti-me íntimo de Rodin.  Viajei, no espaço e no tempo, até a Paris da segunda metade do século XIX. 
 
Não sei se os palcos em que o espetáculo foi montado anteriormente eram maiores que o do Teatro Maison de France, mas a impressão que tive foi de que os cenotécnicos tiveram de “espremer” tudo num espaço incompatível com os elementos cenográficos. 
 
O cenário é dividido em dois espaços (ou três?): o atelier e o manicômio (mais o “Retiro Pagão”?).  Numa das laterais do palco, uma cama de solteiro e uma escadaria, que dava para uma espécie de jirau.  Parecia ser uma extensão do atelier, tudo um único espaço.  Não ficou bem claro, para mim, se a cama era a do manicômio ou se era um dos móveis do “Retiro Pagão” (dois ou três espaços?).  Parece que está mais para este.
 


 

 
As várias entradas e saídas por umas portas laterias, um tanto injustificáves (as três), confundem um pouco o espectador, a meu juízo.
 
Penso que apenas quem conhece a história dos dois protagonistas entendeu a cena em que ela revela, sem usar as devidas palavras, que perdera um filho do artista.  Os dois, simplesmente, se olham, cada um abrindo uma das duas portas laterias, e ele lhe pergunta, mais ou menos, assim: “Por que você não me disse isso?”, ao que ela responde: “Você passa a mão no meu corpo toda noite e nunca notou...”
 
O texto, de FRANZ KEPPLER, ou melhor, a história que o autor conta ao grande público atinge seu objetivo, mas inquieta e frustra um pouco os que conhecem mais a história de Camille, com ênfase na relação com Rodin.
 
É boa a direção de ELIAS ANDREATO, a quem muito admiro, como diretor e ator, longe, porém, de ser seu melhor trabalho de encenador.
 
A cenografia, de MARCO LIMA, é muito boa, com as ressalvas já feitas, assim como o desenho de luz, de WAGNER FREIRE.  Excelente o figurino, de MARICHILENE ARTISEVSKIS.
 
Muito bonita e inspiradora a trilha sonora de JONATHAN HAROLD.
 


Leopoldo Pacheco e Melissa Vettore em cena do espetáculo "Camille e Rodin"
 
 

Gostei bastante dos trabalhos de LEOPOLDO PACHECO e de MELISSA VETTORE.  Ele também é responsável pelo visagismo do espetáculo.  Ambos se entregam, totalmente, aos personagens, e o resultado é um belo trabalho de interpretação, que emociona a plateia.

 
 
 
 

Bela proposta; bom espetáculo.  Recomendo.
 
 
(FOTOS: PRODUÇÃO / DIVULGAÇÃO DO ESPETÁCULO)
 
 
            Para escrever esta resenha, contei com a ajuda de MARISA SÁ, amiga, grande admiradora e conhecedora da obra de Camille Claudel, a quem agradeço.
 
 
 
 
 
 
 
 

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