CAMILLE E RODIN
(CRIADOR E CRIATURA: QUEM É
QUEM?)
O espetáculo CAMILLE E RODIN, que está em cartaz no Teatro Maison de France e que encerrará
a temporada no dia 13 de abril (apenas mais uma semana) é uma peça que conta a
relação amorosa e conflituosa entre um mestre da escultura e uma discípula.
É
muito interessante a biografia de Camille
Claudel. Apesar de as maiores loas
serem sempre cantadas em louvor a Rodin,
afirma-se, com muita frequência, que a criatura teria superado o criador. Dizem até que muitas das esculturas atribuídas
a ele teriam sido, na verdade, feitas por Camille.
Tendo ingressado, em 1881, na Academia
Colarossi, em Paris, uma escola que formava artistas escultores, teve alguns
mestres, até chegar a Auguste Rodin,
o qual, com o passar do tempo, percebeu, impressionado com o trabalho da jovem,
que lhe devia uma atenção especial, convidando-a a frequentar seu atelier, como
discípula e modelo.
Começou auxiliando o mestre em suas obras,
criando, paralela e ocultamente, as suas próprias, ambas com muitos traços em comum. Os dois se envolveram e
mantiveram um caso ardente de amor, cheio de percalços, uma vez que Rodin não se decidia a romper seu compromisso
antigo com Rose Beuret, com
quem morava e até tinha um filho,
para assumir a relação com Camille.
Rodin não parecia ser
sincero com Camille, apesar de
fazer-lhe muitas juras de amor, em cartas a ela escritas. Tinha fama de mulherengo, enquanto ela morria
de ciúmes dele.
Em 1888, Camille deixou o lar dos pais e foi morar numa casa alugada por Rodin, chamada por eles de “Retiro Pagão”, a partir de quando
passaram a frequentar, juntos, locais públicos, assumindo o romance, um grande
escândalo para a época.
Camille queria que Rodin se casasse com ela, mas ele insistia em ser apenas o amante,
dizendo-lhe que não poderia abandonar a mulher que o socorrera tantas vezes em
momentos de dificuldade. Na verdade,
aquilo parecia uma simples desculpa e um sinal de que o mestre tinha medo de
que a discípula o suplantasse.
Em
1892, Camille sofreu um aborto. Não se sabe se foi natural, mas o drama, certamente,
a abalou. Ela abandonou o “Retiro Pagão” e decidiu se afastar de Rodin. Para recuperar o "tempo perdido",
concentrou-se no trabalho, para desvincular sua arte da do amante. É sua fase mais produtiva.
Tornou-se muito triste e depressiva, por
acusações de que copiava o mestre ou de que suas obras não teriam sido feitas
por ela. Não contava com a aprovação da
família, na escolha da profissão, nem com a aceitação da sociedade, que não
perdoava uma mulher querer ser artista. Rompeu
com Rodin, definitivamente, em 1898.
Sentindo-se humilhada, desprezada, ferida em seu
orgulho de mulher e de artista, completamente desorientada e achando que Rodin, na verdade, havia se aproveitado
dela, para atingir maior notoriedade, Camille
Claudel passou a sentir por ele um estranho sentimento, mesclado de amor e ódio,
que a levou a uma (discutível, até certo ponto) paranoia
e à loucura.
Passou a ter um comportamento estranho e tonou-se
obsessiva, chegando a desejar a morte de Rodin, como um meio de se libertar do
jugo de seu “algoz”.
Com o passar do tempo, as crises paranoicas foram
se multiplicando e se tornando mais acentuadas, fazendo-a crer, ela mesma, em
seus delírios. Deixou-se, então, falar
sozinha, isolando-se num hotel, chegando à esquizofrenia.
Também chorava muito e principiou a ter
ideias de suicídio. Criava histórias
imaginárias, que passou a achar que eram puramente verdadeiras. Vivenciou, a partir de então, uma terrível época, em que suas crises de loucura aumentaram, e caiu num
grande abatimento físico e psicológico, não se alimentando mais e desconfiando
de todas as pessoas, achando que todos desejavam matá-la. Isolou-se completamente.
A morte do pai, o único que a apoiava, em 1913,
fez piorar, por completo, sua depressão e a abandonar a realidade mais ainda.
Entrou em uma crise violenta, quebrando tudo, suas próprias obras, e gritando
desesperadamente, até ser internada num manicômio,
vindo a morrer, em 1943, aos 79 anos de idade, após trinta anos de internação e
desespero, passando todo esse tempo amarrada e sedada.
O espetáculo me agradou, no geral, mas não posso
deixar de fazer algumas considerações que não contam com o meu humilde aval.
O cenário é bem interessante e me chamou a atenção,
logo que adentrei o teatro. Assim como,
no espetáculo VERMELHO, cuja
proposta da cenografia era mostrar o atelier de um grande pintor, aqui, o
espectador “invade” o que seria o atelier de um escultor. Senti-me íntimo de Rodin. Viajei, no espaço e no tempo, até a Paris da segunda metade do século XIX.
Não sei se os palcos em que o espetáculo foi
montado anteriormente eram maiores que o do Teatro Maison de France, mas a
impressão que tive foi de que os cenotécnicos tiveram de “espremer” tudo num
espaço incompatível com os elementos cenográficos.
O cenário é dividido em dois espaços (ou três?): o
atelier e o manicômio (mais o “Retiro Pagão”?). Numa das laterais do palco, uma
cama de solteiro e uma escadaria, que dava para uma espécie de jirau. Parecia
ser uma extensão do atelier, tudo um único espaço. Não ficou bem claro, para mim, se a cama era
a do manicômio ou se era um dos móveis do “Retiro Pagão” (dois ou três
espaços?). Parece que está mais para
este.
As várias entradas e saídas por umas portas
laterias, um tanto injustificáves (as três), confundem um pouco o espectador,
a meu juízo.
Penso que apenas quem conhece a história dos dois
protagonistas entendeu a cena em que ela revela, sem usar as devidas palavras,
que perdera um filho do artista. Os
dois, simplesmente, se olham, cada um abrindo uma das duas portas laterias, e
ele lhe pergunta, mais ou menos, assim: “Por
que você não me disse isso?”, ao que ela responde: “Você passa a mão no meu corpo toda noite e nunca notou...”
O texto,
de FRANZ KEPPLER, ou melhor, a
história que o autor conta ao grande público atinge seu objetivo, mas inquieta e frustra um pouco
os que conhecem mais a história de Camille, com ênfase na relação com Rodin.
É boa a direção
de ELIAS ANDREATO, a quem muito
admiro, como diretor e ator, longe, porém, de ser seu melhor trabalho de
encenador.
A cenografia,
de MARCO LIMA, é muito boa, com as
ressalvas já feitas, assim como o desenho
de luz, de WAGNER FREIRE. Excelente o figurino, de MARICHILENE
ARTISEVSKIS.
Muito bonita e inspiradora a trilha sonora de JONATHAN
HAROLD.
Gostei bastante dos trabalhos de LEOPOLDO PACHECO e de MELISSA VETTORE. Ele também é responsável pelo visagismo do espetáculo. Ambos se entregam, totalmente, aos personagens,
e o resultado é um belo trabalho de interpretação, que emociona a plateia.
Bela proposta; bom espetáculo. Recomendo.
(FOTOS: PRODUÇÃO / DIVULGAÇÃO DO ESPETÁCULO)
Para escrever esta resenha, contei com a ajuda
de MARISA SÁ, amiga, grande admiradora e conhecedora da obra de Camille
Claudel, a quem agradeço.
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