quarta-feira, 4 de dezembro de 2024

“ALASKA”

OU

(GODOT CHEGOU

E NINGUÉM PERCEBEU?)

OU

(SE ENTENDI

OU NÃO ENTENDI,

O IMPORTANTE

É QUE EMOÇÕES

EU VIVI.)

 





 

         Teoricamente, um espetáculo de TEATRO, antes de agradar ou não a um espectador, como espetáculo, no todo, precisa ser “entendido”. É necessário que a pessoa que esteja na plateia consiga compreender a história, no mínimo, e procure caminhar, por si só, de acordo com suas decodificações, pelos vários meandros que vai encontrando, ao longo da narrativa, para ir destrinchando os conflitos existentes na trama, mesmo que cada um dos espectadores procure um atalho diferente, por tal e qual motivo. Cada um entendeu o que pôde ou quis; ou o que foi possível entender. E isso se aplica a qualquer gênero teatral. Num drama, muito mais ainda. Mas há exceção para tudo. E comigo, de vez em quando, isso também acontece. E é normal, viu?    


 


 

Ocorre, vez por outra, de determinados espetáculos me agradarem, sem que eu saiba, exatamente, por quê. Sinto que a peça foi bem montada, que é bonita, que tem muitas qualidades, entretanto, por sua complexidade textual e por exigir muito da atenção do espectador e de sua capacidade de embarcar na “viagem” que ela propõe, saio do Teatro pensando em revê-la; em certas oportunidades, volto para casa, sentindo-me um “burro” e “zurrando” qualquer coisa, quando alguém fala comigo. Seria possível que, em outro momento meu – e eu estava mal na noite de 31 de outubro de 2024, poucos dias após ter voltado de uma viagem de um mês ao exterior e com alguns problemas pessoais pendentes, sem falar nas duas horas e meia que levei, dirigindo de casa ao Teatro Poeira -, eu estivesse mais “disponível” para um embarque naquela “nave”, e eu e ela pudéssemos nos aproximar, como se espera numa simbiose entre palco e plateia. E foi isso o que aconteceu no dia em fui assistir ao espetáculo “ALASKA”, em longa temporada no Teatro Poeira (VER SERVIÇO.). Acho que não era o dia para termos marcado aquele “date”. Era, pelo menos, o que eu pensava.



 


SINOPSE:

A peça se passa no estado do Alaska, que também nomeia o drama, escrito pela dramaturga estadunidense CINDY LOU JOHNSON.

Enquanto uma forte nevasca cai do lado de fora, Henry (RODRIGO PANDOLFO), uma figura solitária, é surpreendido por uma insistente batida na porta de sua cabana.

Trata-se de uma visita desconhecida: Rosannah (LOUISE D’TUANI), uma jovem vestida de noiva, que, após dirigir, ininterruptamente, por semanas, entra na habitação, após esmurrá-la, e se instala no local.

Eles se veem presos no mesmo espaço-tempo, longe de tudo e de todos, sem a menor possibilidade de desafiar a intempérie, sendo obrigados a conviver com suas verdades, para, quem sabe, assim, alcançarem essa possível cura.




 

       É com base nessa enigmática SINOPSE acima, aparentemente muito simples, e em nada mais, que tentarei escrever sobre a peça, que revi no último dia 29 de novembro de 2024, como havia prometido ao meu querido amigo RODRIGO PANDOLFO, que, além de ser o personagem Henry, ainda tomou a si a imensa responsabilidade de dirigir o espetáculo. Acho muito difícil a direção desse texto, pelo que já cumprimento PANDOLFO.



 

CINDY LOU JOHNSON, dramaturga norte-americana, parece ter bebido, até ficar trôpega, “borracha”, em fontes de gente muito importante, como Jarry, Genet, Beckett, Arrabal e Ionesco, por exemplo, alguns dos grandes mestres do Teatro do Absurdo, e, das obras da autora, “ALASKA (“Brilliant Traces”, no original) é a mais famosa. A título de brincadeira, sem abandonar o mote, seria o caso de mandar, não sei como, um recadinho a Samuel Beckett, que nos deixou em 1989, dizendo-lhe que ninguém precisa mais esperar Godot, porque essa entidade já apareceu; e sob a forma de uma mulher, vestida de noiva.



 

CINDY não cansa de lançar mistérios no ar, na esperança – acho que só a autora fica nela – de que o público vá entender todas as suas provocações. Por exemplo, o que faz uma mulher, vestida de noiva, dirigir, do Brasil ao Alaska, abandonando os convidados na igreja e deixando o noivo à sua espera, no altar, como se tivesse entrado num “surto”, e, depois de o carro enguiçar e já começar a ficar soterrado pela neve, ir, após caminhar muito, parar na casa de um profissional da área de petróleo, que trabalha numa plataforma e vive, tranquilo, por vontade própria (?), como um ermitão, a cerca de quilômetros de distância de casa? Já começa aí a procura pela “verossimilhança perdida”, se é que ela importa.



 

Ou aquela “Godot” não estava ali, nunca esteve, e ainda se fazia esperar, por alguém que prima pela liberdade e prazer de viver sozinho, mas que, no fundo, vive à espera/procura de alguma companhia, mesmo sendo uma “bagunceira”, como Rosannah, que deixa os sapatos molhados jogados no chão, espalhados pela casa, mexendo com as memórias “afetivas” de Henry? “O que me incomoda eu queimo”. “Como uma forma de expurgar alguma coisa? Fica a pergunta no ar. Talvez a existência, um dia, de uma terceira personagem, que não aparece em cena, uma filha dele, possa responder a isso.



 

E se essas memórias também não existissem, porque não se pode recordar o que nunca se viu ou se teve ou se viveu? Também é uma possibilidade, que nos levaria a duvidar da sanidade mental do homem. Seria, também, mais uma camada que a autora utiliza para se sobrepor a outras e para dificultar a vida de quem espera uma história linear, algo “pão-pão-queijo-queijo”, “sanduíche” que jamais saboreará nesta peça.



 

Diz a SINOPSE, em seu trecho final: sendo obrigados a conviver com suas verdades, para, quem sabe, assim, alcançarem essa possível cura”. Quais seriam essas verdades? Diálogos parecem nos revelar as ditas cujas, mas, até onde se pode ou se deve acreditar nelas? Problema de quem redigiu esse trecho que encerra a referida SINOPSE da peça ou fragilidade cognitiva de minha parte, que “verdades” são essas, se é que elas existem? Eu, pelo menos, me virei do avesso, para chegar até elas e fiquei pelo meio do caminho, talvez porque não são mesmo para virem à luz. Alcance, quem puder, “essa possível cura”. A que “cura” se referem, partindo-se do pronome demonstrativo “essa”, que deveria fazer menção a algo já mencionado? Que “cura”? Quem precisa dela? Um precisa do outro, para se curar de quê? Das marcas do passado, dos erros cometidos, dos arrependimentos, das oportunidades perdidas...



 

É um profundo desafio, um exercício abissal, tentar entender o texto, se é que isso é tão importante assim, diante da beleza plástica da montagem. Não é à toa que esta peça é catalogada como um “drama psicológico”. Mais “drama” ou mais “psicológico”? Meio a meio. Os personagens “embaralham o que é verdade ou ilusão desse encontro”, acompanhados dos bailarinos ALEXANDRE MAÏA e TAYSON PIO, “que trazem uma linguagem de universo fantástico, por meio de intervenções de dança, traduzindo os conflitos mentais das protagonistas”. A ideia de incorporar à cena o trabalho dos dois excelentes profissionais, que também se viram na contrarregragem, é um dos grandes acertos da peça.



 

Se tudo o que escrevi sobre a fluência - ou falta dela - de uma história, que não está viva e fácil ao nosso alcance, não deixem de assistir ao espetáculo por todos os outros elementos que ele reúne, como a ótima cenografia, de MIGUEL PINTO GUIMARÃES, tão simples quanto expressiva e criativa; os comedidos e ajustados figurinos, assinados por JAY BOGGO; uma luz indescritível, desenhada por WAGNER ANTÔNIO, de uma beleza ímpar, que constrói imagens indeléveis, na nossa mente, trabalhando, esplendorosamente, com as sombras; da direção de movimento, variada e criativa, de LAVINIA BIZOTTO; e da trilha sonora, agradável e precisa, criada por Azullllllll (É assim mesmo que ele se assina.) 




Todas essas referências já valem o valor do ingresso, entretanto ainda há, no espaço cênico, duas presença de jovens atores que não estão a caminho do acerto; eles já são, acertadamente, dois magníficos atores de TEATRO. Faço questão de frisar o “de TEATRO”, visto que, sobre RODRIGO PANDOLFO, faltam-me adjetivos novos para qualificar, sem ser repetitivo, tudo o que eu já vi esse ator fazer num palco e o que ele é capaz de atingir, na difícil ARTE de representar: Eclético, dinâmico, camaleônico, verdadeiro... Com relação a LOUISE D’TUANINi, foi, para mim, seu batismo sobre as tábuas. Salvo engano, não conhecia seu trabalho de atriz de TEATRO e fiquei extremamente feliz e satisfeito com o que vi, o que, a meu juízo, a credencia a novos desafios, como deve ter sido o do de interpretar Rosannah.



 

 

FICHA TÉCNICA:

Autor: Cindy Lou Johnson

Tradução: Luiza Vilela

Direção: Rodrigo Pandolfo

 

Elenco: Louise D'Tuani e Rodrigo Pandolfo

Bailarines / Performers: Alexandre Maïa e Tayson Pio

 

Cenografia: Miguel Pinto Guimarães

Figurino: Jay Boggo

“Designer” de Luz: Wagner Antonio 

Direção de Movimento: Lavinia Bizzotto

Trilha Sonora: Azullllllll

Assistência de Direção: Rael Barja e Jean Machado

Assistência e Operação de Luz: Walace Furtado

Operação de Som: Gabriel Fomm

Assessoria de Comunicação: Fuga Produções e Comunicação - Ricardo Oliveira

Identidade Visual: Pat Cividanes

Fotografia: Pat Cividanes e Chico Lima

Redes sociais/Mídias Digitais - Rafael Gandra

Cenotécnico: André Salles Cenografia e LC Cenografia

Camareiro/Contrarregra: James Simão

Produção Executiva: Bárbara Montes Claros

Diretor de Produção: Celso Lemos

Administração: D’ Tuani Produções Artísticas e Realejo Produções Artificiais


 


 



 

 

SERVIÇO:

Temporada: de 03 de outubro a 15 de dezembro de 2024.

Local: Teatro Poeira.

Endereço: Rua São João Batista, nº 104 – Botafogo – Rio de Janeiro.
Telefone: (21) 2537-8053.

Dias e Horários: De 5ª feira a sábado, às 20h; domingo, às 19h.
Valor dos Ingresso: R$ 80 (inteira) e R$ 40 (meia-entrada). 

Funcionamento da Bilheteria: De 3ª feira a sábado, das 15h às 21h; domingo, das 15h às 19h. (Sem taxa de conveniência).

Vendas pela plataforma Sympla (Com taxa de conveniência.)

Capacidade: 171 lugares.
Duração: 80 minutos.
Classificação Etária: 14 anos.

Gênero: Drama.

 




 

         Para muita gente, talvez a maioria dos que vêm enchendo cada uma das sessões do Teatro Poeira, pela força do “boca a boca”, já que se trata de mais um excelente espetáculo sem patrocínio, mantendo-se de pé pela arma da propaganda interpessoal, esta peça seja uma experiência totalmente nova, que vale muito a pena se vivenciada.

 

 

 

FOTOS: PAT CIVIDANES

CHICO LIMA.


 

 

 

GALERIA PARTICULAR

(Fotos: João Bartholo.)




Com Rodrigo Pandolfo.

Com Louise D'Tuani.




 

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