“MANOEL”
ou
(COISA BOA
É SER BOCÓ.)
ou
(POESIA PARA
TODAS AS IDADES.)
Mais uma vez, experimentei a agradável sensação de assistir a
um espetáculo infantojuvenil dirigido por DUDA MAIA. Desta vez, foi “MANOEL”,
um texto de EDUARDO RIOS, livremente inspirado na obra do poeta Manoel
de Barros, interpretado por DAYSE POZATO e LUAN VIEIRA,
em cartaz no Teatro do Centro Cultural OI Futuro (VER SERVIÇO.).
SINOPSE:
Em cena, DAYSE POZATO e LUAN VIEIRA são dois
personagens – batizados de Bocós, em alusão a um termo que Manoel
usa em alguns de seus poemas – que brincam de ser um monte de coisas, descobrem
e inventam palavras; experimentam os sons das palavras, despertando novos
sentidos; catam formigas e galhos secos pelo chão; gostam de ouvir o silêncio
da chuva e brincar de pensar em nada.
Entre brincadeiras e reflexões típicas da infância, os dois percorrem temas presentes na obra do poeta, como a natureza, o nada, o escuro, o silêncio e as inutilidades.
A ideia de montar o espetáculo é de DAYSE POZATO,
surgida quando a atriz e bailarina conheceu um poema de Manoel de Barros,
chamado “O Menino que Carregava Água na Peneira”, no qual o
garoto do título “fazia peraltagens com as palavras”, e sua mãe
dizia que ele seria um poeta. “A peça é para toda a família, tendo como
ponto de partida a obra do escritor mato-grossense”, como diz o “release”
que me foi enviado por PAULA CATUNDA (Assessoria de Imprensa).
No decorrer desta crítica, citarei alguns trechos do referido poema.
A mãe disse que carregar água
na peneira
era o mesmo que roubar um
vento
e sair correndo com ele, para
mostrar aos irmãos.
A mãe disse que era o mesmo
que catar espinhos na água.
O mesmo que criar peixes no
bolso.
O vocábulo “bocó” apresenta vários sentidos,
entretanto a maneira como aparece, na SINOPSE, para fazer referência aos
dois personagens da peça, está na acepção de “tonto, bobo, tolo”,
sem que, entretanto, haja uma conotação negativa; está mais para alguém ingênuo
e sonhador. Os dois personagens agem como o menino do poema. Para isso, EDUARDO
RIOS, com sua extremada sensibilidade e verve poética, escreveu um texto
que extrapola qualquer sentido de beleza, lirismo e poesia. É muito mais do que
tudo isso reunido: Uma “belirismosia” (Adoro neologismos.)
O menino era ligado em despropósitos.
Quis montar os alicerces
de uma casa sobre orvalhos.
A mãe reparou que o menino
gostava mais do vazio do que
do cheio.
Falava que vazios são maiores
e até infinitos.
Os “despropósitos” estão ligados à ideia de “coisas inusitadas”, que fogem ao que se considera “normal”. Do ponto de vista lógico, é claro ser impossível construir a estrutura de uma casa sobre gotas de orvalho, todavia há que se lançar um olhar de pureza, sobre os versos, de alguém que acredita em que tudo é possível, dentro das nossas “viagens”. O menino vivia num mundo idealizado, como os dois personagens da peça.
No escrever, o menino viu
que era capaz de ser noviça,
monge ou mendigo, ao mesmo
tempo.
Os dois bocós-personagens
comportam-se, em tudo, como o menino do poema, assumindo a identidade que bem
lhes convier, sem que nada possa turvar sua visão de mundo. Ambos podem ser o
que bem entenderem.
O menino aprendeu a usar as
palavras.
Viu que podia fazer
peraltagens com as palavras.
E começou a fazer peraltagens.
EDUARDO
RIOS é o menino do poema, transposto, em carne e osso, para diante
de um computador e pôs-se a criar um lido texto em que, guardadas as
devidíssimas proporções, faz as vezes de um “Guimarães Rosa para
crianças”, no sentido de brincar com as palavras, atribuindo-lhes novos
e curiosos sentidos, inventando outras e “subvertendo”, no melhor
sentido, os meandros da gramática. Um artífice dos vocábulos.
Foi capaz de modificar a tarde,
botando uma chuva nela.
O menino fazia prodígios.
Até fez uma pedra dar flor.
Uma coisa sinto-me na obrigação de dizer: todos os
espetáculos de DUDA MAIA direcionados às crianças atingem muito mais os
adultos, visto que, sem querer menoscabar aquelas, cada vez mais espertas e
inteligentes, se comparadas às da minha época, por exemplo, não acredito que um
grande universo infantil consiga alcançar a grandeza e a seriedade contidas nas
mensagens poéticas de “A Gaiola”, “Contos Partidos de Amor”,
“Vamos Comprar um Poeta” e, agora, “MANOEL”, o que,
absolutamente, em nada, faz desmerecer esses textos. É, apenas, a meu juízo,
uma inadequação, em termos de entendimento, com relação à faixa etária à qual
as peças são indicadas. Posso estar enganado, e gostaria de que estivesse.
Isso, absolutamente, invalida o espetáculo; muito pelo contrário, atribui a ele
um grau de seriedade e qualidade incomensuráveis, mas num patamar bem acima do
alcance da média das crianças. Falo como professor que atuou em sala de aula,
durante 47 anos, atendendo a adultos, universitários, mas também a crianças do
segundo segmento do Primeiro Grau.
A mãe falou: Meu filho você vai
ser poeta!
Você vai carregar água na
peneira a vida toda.
Você vai encher os vazios
com as suas peraltagens,
e algumas pessoas vão te amar
por seus despropósitos!
Não sei se a senhora genitora de EDUARDO RIOS também
profetizou que o filho seria, ou nascera, poeta, mas, se não o fez, de certo,
reconheceria isso agora, como eu e todos os que travam contato com seus
escritos. E quem o conhece passa a amá-lo, também, por seus “despropósitos”
literários.
DUDA MAIA prende-se a um estilo de direção bastante
interessante e inconfundível - sua digital -, repetindo-se, sem que haja nisso
algum demérito, na criação de marcações coreográficas que deságuam numa
excelente direção de movimento. Ela costuma pautar seu trabalho de direção nos
movimentos do corpo, nas possibilidades de fala do corpo humano (O corpo
fala.), a fim de que, daí, possa partir para outras explorações. E o resultado
disso é o melhor possível. Um trabalho voltado para o lúdico, o dinâmico, o ativo, o agitado, o inquieto, o móvel, o enérgico, o
movediço, o irrequieto, o mexediço.
Duda Maia, a diretora.
Assim se coloca a diretora sobre seu
trabalho: “Os Bocós conduzem o espetáculo do começo
ao fim, vão brincando de várias coisas. Pesquisamos muito, para construir uma
fisicalidade que trouxesse uma experiência sensorial pela plasticidade,
movimentação e musicalidade...”. Sim, isso está, lindamente, colocado em cena. E EDUARDO RIOS completa: “A gente começa pelo
corpo e, depois, vai para o texto. É um método de trabalho que eu e DUDA temos.
Às vezes, ela faz uma coreografia e me pede um diálogo para aquele movimento. O
roteiro do espetáculo é todo pensado em conjunto...”. Acredito que
esses detalhes sejam bem do interesse de quem está me dando a honra de sua
leitura e poderá ser um futuro espectador da peça.
A beleza e perfeição do texto e da direção estão em consonância com todos
os elementos de criação da peça e o trabalho do casal de atores. “MANOEL” é
um espetáculo que encanta aos ouvidos e aos olhos, pega o espectador sensível
por todos os lados. Tudo o que se refere à estrutura estética desta montagem é
merecedor de créditos positivos, a começar pela ideia de fixar o azul como
sendo “a cor da peça”, presente no cenário, nos figurinos, nos adereços
e na iluminação.
ANDERSO DIAS responde pela simples, porém muito
interessante e significativa, cenografia, que só ocupa o fundo do palco, uma
excelente ideia, por conta das pequenas dimensões do espaço cênico do Teatro
do Centro Cultural OI Futuro. Assim, a dupla de atores fica à vontade
para a sua atuação numa acanhada área, muito bem explorada pela direção. Tudo
na cor azul. São paredes sinuosas, confeccionadas em tiras elásticas, colocadas
uma ao lado da outra, detalhe que serve à inventividade de DUDA MAIA.
KAREN BRUSTTOLIN, uma das melhores figurinistas da
atualidade, que vem sendo muito requisitada pelos melhores diretores e
produtores brasileiros, assinando os figurinos de vários trabalhos em cartaz, no momento, criou dois super criativos e prazenteiros trajes utilizados pela dupla de
atores.
Uma atmosfera onírica, suave e envolvente é obtida, no palco,
por meio da linda iluminação, criada, a quatro mãos, por RENATO MACHADO e
FELIPE MEDEIROS.
Funcionando como uma espécie de "terceiro personagem", “dialogando”,
o tempo todo, com DAYSE e LUAN, a trilha sonora original,
composta por BETO LEMOS, é uma atração à parte, no espetáculo. Não
consigo enxergar a peça sem ela. Todas as canções utilizados pelo compositor, e
músico em todas as gravações, valorizam ritmos brasileiros, principalmente os
nordestinos, sua origem.
FICHA
TÉCNICA:
Texto: Eduardo Rios
Direção: Duda Maia
Assistência de Direção: Luiza Loroza e Carolina Futuro
Elenco: Dayse Pozato e Luan Vieira
Cenografia: Anderson Dias
Figurinos: Karen Brusttolin
Iluminação: Renato Machado e Felipe Medeiros
Trilha Sonora Original: Beto Lemos
Fotografias: Renato Mangolin
Assessoria de Imprensa: Paula Catunda
Direção de Produção: Bruno Mariozz
Produção: Palavra Z Produções Culturais
SERVIÇO:
Temporada: De 04 de março a 07 de maio de 2023.
Local: Centro Cultural Oi Futuro.
Endereço: Rua Dois de Dezembro, nº 63 – Flamengo – Rio de Janeiro.
Telefone: (21)3131-3060.
Dias e Horários: Sábados e domingos, às 16h.
Valor dos Ingressos: R$40,00 (inteira) e R$20,00
(meia entrada).
Vendas pela plataforma Sympla: www.sympla.com.br
O Centro Cultural Oi Futuro é acessível a pessoas com necessidades
especiais.
Duração: 50 minutos.
Capacidade: 63 lugares.
Classificação Indicativa: Livre.
Gênero: Teatro Infantojuvenil.
“MANOEL” é um convite ao sonho, à poesia. É a
representação concreta do “inatingível”, diante dos nossos olhos.
É um mergulho abissal nas profundezas do lúdico e de todas as possibilidades,
inextinguíveis, que ele pode nos proporcionar. E é por isso que recomendo o espetáculo, o qual, certamente, estará
nas premiações referentes ao ano teatral de 2023. “MANOEL” terá uma vida
longa e merece muitas outras temporadas, no Rio de Janeiro e fora da cidade.
FOTOS: RENATO MANGOLIN
GALERIA PARTICULAR:
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