O OLHO
DE VIDRO
(QUANDO SE SENTIR
PELA METADE É,
NA VERDADE,
SER INTEIRO.)
Assistir
ao espetáculo “O OLHO DE VIDRO”, em
cartaz, até o dia 30 de abril, no Teatro do Centro Cultural Correios
é viver uma experiência por inteiro. Nada, ali, é pela metade ou fragmentado,
ainda que o espetáculo tenha sido escrito por RENATA MIZRAHI, contando com fragmentos
de BARTOLOMEU CAMPOS DE QUEIRÓS.
Trata-se
de um monólogo, um dos melhores a que já assisti, na vida, interpretado por CHARLES ASEVEDO, que também é o idealizador do projeto, e dirigido, a seis mãos, pela competência
de três pessoas sensíveis e de muito bom gosto: VERA HOLTZ, GUILHERME LEME
GARCIA e FLÁVIA PUCCI. A
relação de amor e amizade que há entre o quarteto gerou um dos melhores
espetáculos em cartaz, no momento, no Rio
de Janeiro.
É impossível
um espectador não se emocionar com o belo espetáculo com que é presenteado. Via
de regra, muitas pessoas chegam às lágrimas, por total, ou parcial, identificação
pessoal, ou relacionada a alguém próximo, com o que se vê naquele palco.
SINOPSE:
A peça, na primeira
pessoa, é um relato sobre a infância, a relação com o avô que queria ter, a descoberta
da sexualidade, a relação de opressão com o pai e de amor incondicional pela
mãe.
As histórias do livro “O OLHO DE VIDRO DO MEU AVÔ”, de BARTOLOMEU CAMPOS DE QUEIRÓS, e da vida
de CHARLES AZEVEDO se misturam, numa
criação poética, ficcional e documental.
Não existe um limite entre ficção e realidade.
O ator começa seu
depoimento, acreditando que foi sempre pela metade e passou a vida buscando ser
inteiro.
É através dessa busca que
vamos conhecer suas memórias de infância, suas relações familiares delicadas,
suas descobertas de vida, até chegar ao que se tornou hoje.
Um pouco do
rico material, contido no “release”,
que me foi enviado pela assessoria de
imprensa (MINAS DAS IDEIAS – CARLOS GILBERTO e FÁBIO AMARAL): “Foi durante uma viagem a Belo Horizonte,
que o ator CHARLES ASEVEDO conheceu o autor mineiro BARTOLOMEU CAMPOS DE
QUEIRÓS. Um tempo depois, encontrou, entre sua extensa e premiada obra
literária, o livro “O OLHO DE VIDRO DO MEU AVÔ”, publicado em 2004. Estava ali
uma história que o inspirava a subir nos palcos, mas seu desejo ia além, pois
as memórias do livro remetiam, diretamente, às suas próprias memórias de vida.
Foi, então, que convidou os atores VERA HOLTZ e GUILHERME LEME GARCIA,
para repetirem a dobradinha do premiado espetáculo “O ESTRANGEIRO”, e
resolveram convocar a autora RENATA MIZRAHI, para escrever essa conexão,
entre a vida do CHARLES e a história do BARTOLOMEU. Em seguida, a atriz FLÁVIA
PUCCI foi chamada, para integrar o time de criadores, numa direção coletiva,
que marca o olhar de três atores de formações diversas sobre o trabalho de um
único ator em cena”.
Já fica claro
que o lindo e comovente texto,
brilhantemente dito, por CHARLES ASEVEDO,
é um misto de ficção e realidade. Muitas
das vezes, o público fica meio “perdido”, sem saber quando termina uma, para
dar lugar à outra, e vice-versa. Mas é um “perdido”
bom, pois, logo, logo, a pessoa “se acha”;
um “perdido” que prende a atenção do
espectador e o atrai para o palco, para uma viagem na companhia do ator. Foi
assim que me senti, naquela noite de sábado,
25 de março de 2017. “Viajei” no tempo, de mãos dadas ao CHARLES, na sua “viagem”, no seu tempo,
do qual me apropriei. Ele me conduziu e
eu me deixei conduzir.
Ainda do “release”: “Como diz BARTOLOMEU, ‘A memória
é um grande patrimônio que a gente tem. A memória é o que eu tenho de mais
precioso. Mas é preciso, também, saber que, na memória, tanto mora o vivido
quanto mora o sonhado. Mora a vida que eu vivi. E mora a vida que eu sonhei
viver. Então, quando você busca a memória, ela vem sempre misturada. Ela não
vem pura. E é impossível ter uma memória pura. A memória é esta mistura, esta
conversa entre a realidade e a fantasia’”.
BARTOLOMEU
CAMPOS DE QUEIRÓS nasceu em 1944, na cidade de Pará de Minas (MG) e faleceu em 16 de janeiro de 2012, em Belo
Horizonte. Escreveu mais de 40
livros, alguns dos quais traduzidos para o inglês, o espanhol e o
dinamarquês. É autor do “Manifesto Por
Um Brasil Literário”, do “Movimento Por
Um Brasil Literário”, do qual participava ativamente. Por suas realizações,
BARTOLOMEU colecionou medalhas e
prêmios, incluindo um Prêmio Jabuti.
Ainda, de acordo com o “release”,
“...a
peça é uma comédia dramática, que fala, poeticamente, de um olho que vê e outro
que imagina”. O espectador também precisa ver o espetáculo com seus olhos, a grande maioria, com os dois, mas
é necessário que o enxergue, pelo
coração, até se for privado do sentido da visão.
É preciso, pois, que se estabeleça a diferença entre “ver” e “enxergar”. O “ver” está
ligado a uma atitude mais superficial, presa aos aspectos físicos, não
permitindo, geralmente, que se estabeleçam registros, como arquivos e memórias,
do que foi visualizado. É mais imediatista, ligada ao concreto, ao passo que o “enxergar” extrapola o físico, deixando
“ver” o que está oculto, abrindo
caminho para a percepção do aqui e agora e do que mais houver para ser
percebido, sentido. Abre a porta para o exercício da intuição, da inspiração,
da imaginação, do sexto sentido.
“O OLHO
DE VIDRO” É MUITO MAIS PARA SER ENXERGADO QUE VISTO.
CHARLES
ASEVEDO, desde criança, escrevia, onde encontrasse espaço, seus anseios e
registrava seus momentos de alegria e de dor, sua relação com os pais e todos
os que o cercavam, durante sua vivência na Baixada
Fluminense, de onde saiu, para abraçar, definitivamente, a vida artística,
já adulto, embora ainda mantenha contato com aquela região, por ser professor,
num dos municípios de lá, Belford Roxo.
Apaixonado pelo livro de BARTOLOMEU
e encontrando nele muitos pontos em comum com sua vida pessoal, tomou a
iniciativa do projeto e a escolha de
RENATA MIZRAHI não poderia ter sido
melhor, para costurar fragmentos literários de BARTOLOMEU com as informações que lhe foram passadas por CHARLES.
É impressionante como um outro olhar, de fora, foi capaz de captar, com
tanta singularidade, os detalhes de ambos os relatos e amalgamar tudo num texto que, apesar de tanta densidade,
também é alegre e transita pelo espaço entre o drama e a comédia.
Provocando o riso, em função de fatos tão insólitos, a autora nos “impõe”,
sem querer (ou querendo) várias reflexões, que mexem com o íntimo de cada um.
Não há como não se emocionar e sair do Teatro ileso, sem estar mexido, por algumas,
ou muitas, coisas ditas em cena. Feridas, que consideramos cicatrizadas, podem
gotejar sangue ou, mesmo, fazê-lo jorrar, em jatos.
RENATA - não me canso de dizer -
é uma das melhores representantes da nova geração de dramaturgos
brasileiros, vencedora de tantos prêmios, que, se relacionados aqui, ocupariam boa
parte deste texto. Tem uma
característica toda especial de escrever seus diálogos, difícil de ser
descrita, porém, fácil de ser detectada por quem conhece bem sua obra, como eu.
Se já não fosse ao Teatro do Centro Cultural
Correios, naquele dia, sabendo que ela era a autora do texto, certamente, afirmaria, ao final do espetáculo, na certeza de acertar: este texto é da RENATA, da mesma forma como reconhecemos os traços de um pintor.
O trabalho de direção é muito bom e merece destaque, porque manter um único ator
em cena, fazendo um monólogo, em que
realidade e ficção se misturam, não é tarefa das mais fáceis para um diretor. São excelentes as marcações
das cenas e a linha de interpretação sugerida ao ator. Há um jogo lúdico, no palco, que faz com que o espetáculo se
torne bastante dinâmico. É um monólogo,
mas não é monótono; muito pelo
contrário.
Fiquei extremamente encantado com a
atuação do ator CHARLES AZEVEDO, que se emociona bastante em determinados trechos
do espetáculo, talvez quando estes tocam nas suas feridas mais profundas. O seu
relacionamento conturbado com o pai vai fundo nos nossos corações e nos torna
aliados do menino e, posteriormente, do rapaz. Hoje, as coisas são diferentes,
entre os dois. A sua admiração pela mãe e a identificação com ela são
comoventes.
CHARLES
tem uma considerável presença de palco, não por suas avantajadas proporções físicas,
que, às vezes, muito pelo contrário, fazem-no parecer tão frágil, mas por sua técnica
de representação, pela grande concentração de amor pelo que faz, por uma dose
excessiva de emoção e verdade naquilo que diz. Faz transições impressionantes
entre situações de grande tensão e tristeza e outras, que remontam a momentos
de prazer, que pareciam contidos e, agora, com toda a coragem, são revelados a
um público, tornado-o seu cúmplice, público este que o aceita em toda a sua
plenitude.
O espetáculo conta com uma simples, porém,
excelente cenografia, da premiada AURORA DOS CAMPOS. Nada mais seria
necessário, em cena, do que uma enorme lousa, ao fundo, que o ator utiliza, em
cena, uma mesa e uma cadeira, como se para compor uma sala de aula ou um auditório,
para uma conferência, ainda que o trabalho de CHARLES se aproxime mais de uma conversa, bem intimista, durante a
qual se despe de seus medos e pudores e abre o coração para quem nele quiser
penetrar. E todos o querem.
Ajuda muito a valorizar cada cena a luz, de TOMÁS RIBAS, que também acompanha a linha da simplicidade, que o
espetáculo requer, de grande sensibilidade e requinte.
Simplicidade
é a tônica deste espetáculo, um dos motivos para seu sucesso. Há, também,
nestes comentários, espaço para falar do figurino,
que deve te sido uma escolha entre o ator
e a direção, uma vez que nem consta
na ficha técnica: uma calça e uma camisa
de malha preta. Para que mais?
MACELLO
H colabora com uma trilha sonora
totalmente adequada ao espetáculo.
Eu
recomendo muito este monólogo, do qual ninguém consegue sair da mesma
maneira como entrou. Seus valores de vida serão, no mínimo, questionados por
você. Se vão sofrer modificações, ficará a seu critério. Para mim, valeu muito!!!
E
acredite, CHARLES ASEVEDO: NÃO HÁ COMO
SER MAIS INTEIRO QUE VOCÊ!!!
FICHA TÉCNICA:
Texto: Renata Mizrahi – Livremente inspirado no
livro “O Olho de Vidro do Meu Avô”, de Bartolomeu Campos de Queirós, e nos
relatos de Charles Asevedo
Fragmentos: Bartlomeu
Campos de Queirós
Criação Artística
(Direção): Vera Holtz, Guilherme
Leme Garcia e Flávia Pucci
Idealizador e Ator: Charles Asevedo
Iluminação: Tomás Ribas
Cenário: Aurora dos Campos
Trilha Sonora: Marcello H
Preparação Vocal: Natália
Fiche e Edi Montechi
Programação Visual e
Fotos de Arte: Thiago Ristow
Fotos de Cena: Alis Mídia
Assessoria de Imprensa: Minas de Ideias (Carlos Gilberto e Fábio
Amaral)
Coordenador Técnico: César
Bournier
Operação de Luz:
Jaqueline Winter e Lucas Viola
Assistente de Produção:
Igor Miranda
Direção de Produção: Valéria Alves
Produção: Sevla Produções
SERVIÇO:
Temporada: De 16 de março a 30 de abril de 2017.
Local: Teatro Centro Cultural Correios.
Endereço:
Rua Visconde de Itaboraí, 20 – Centro – RJ.
Telefone:
(21) 2253-1580.
Horários: De 5ª feira a domingo, às 19h.
Valor do Ingresso: R$20,00 (inteira); R$10,00 (meia entrada)
Horário de Funcionamento da Bilheteria: De 4ª feira a domingo, das 15h às 19h.
Duração: 60 min.
Classificação Etária: 12 anos.
Gênero: Comédia Dramática.
Capacidade: 200 lugares.
(FOTOS: ALIS MÍDIA.)
(Foto particular, feita por Valéria Alves -
Eu, Analu Prestes, Charles Asevedo e Elda Priami.
Nenhum comentário:
Postar um comentário