quinta-feira, 21 de janeiro de 2016


AUÊ

 

 

 

(POESIA, MÚSICA

E BRASILIDADE

A SERVIÇO DO TEATRO.)

 

 

 

 


 

 

            - É um homem?

            - ?

            - É um pássaro?

            - ?

            - É um avião?

            ...

            - É TEATRO?

            - ?

            - É um “show” musical?

            - ?

            - É uma “performance”?

            - NÃO!!! É a BARCA DOS CORAÇÕES PARTIDOS, fazendo um “AUÊ”!!!

 


 




 

 

            Não sei que nome atribuir a uma das melhores coisas que, até hoje, já vi acontecer num palco. Simples, como o título: “AUÊ”, em cartaz na Arena do Espaço SESC (Copacabana), até o dia 31 de janeiro (2016) – (VER SERVIÇO).

 

            São sete rapazes, atores/cantores/músicos, de invejável talento, os quais, durante 80 minutos, conseguem tirar qualquer um da inércia - de movimentos e pensamentos -, atraindo-nos, como ímãs, para aquela arena. Cada um dos espectadores, sem querer, se sente no meio deles, numa celebração, antes de tudo, da vida, da graça de viver, do prazer do contato com o outro, do desejo de criar um universo mais harmonioso, de alegria, de paz, de amor, de fraternidade... Uma celebração do amor, cantado, em versos e melodias, em todas as suas implicações e momentos: de prazer, de dor, de sofrimento, de gozo...

 

 


 

 

            O ESPETÁCULO, com todas maiúsculas – receba ele a classificação que cada um quiser lhe atribuir – é dirigido por DUDA MAIA, que, no ano passado, se destacou, no cenário teatral carioca, com excelentes trabalhos de direção de movimento. Ela rege um seleto grupo, formado por gente que atuou em dois marcantes espetáculos recentes: “Gonzagão – A Lenda” e “Ópera do Malandro”, mesclando TEATRO, música, dança e “performance”, com 21 canções autorais do grupo.

 

            De acordo com o “release” do ESPETÁCULO, enviado pela assessoria de imprensa (Factoria Comunicação – Pedro Neves),no dicionário, ‘AUÊ significa farra, tumulto, confusão ou barulho causado por uma algazarra”. Certamente, depois deste ESPETÁCULO, os dicionários terão de agregar outro significado ao vocábulo. Como? Eu não sei. Ainda bem que não sou filólogo, porque há muita coisa para cujas definições não encontramos palavras.

 

 


 

 

 

 
SINOPSE:
 
Em cena, a companhia BARCA DOS CORAÇÕES PARTIDOS, nascida durante as montagens de “Gonzagão – A Lenda” e “Ópera do Malandro”, apresenta 21 canções autorais e inéditas, em um ESPETÁCULO, que reúne TEATRO, dança, “performance” e, é claro, música.
 
Criada, em processo coletivo, com a diretora, DUDA MAIA, a encenação utiliza as letras como dramaturgia e os sete atores/cantores ainda são responsáveis por tocar todos os instrumentos, ao vivo, nesta verdadeira “farra teatral”.
 
A idealização do projeto é fruto da parceria do grupo com a Sarau Agência, da produtora Andréa Alves, também responsável pela produção dos dois espetáculos anteriormente citados, ambos dirigidos por João Falcão.
 
O repertório faz jus ao nome da companhia e traz uma leva de canções, cujo tema principal é o amor e todas as suas dores e delícias.  As músicas foram compostas pelos atores da BARCA DOS CORAÇÕES PARTIDOS (ADRÉN ALVES, ALFREDO DEL-PENHO, BETO LEMOS, EDUARDO RIOS, FÁBIO ENRIQUEZ, RENATO LUCIANO E RICCA BARROS) e alguns colaboradores, como o cantor e compositor Moyseis Marques, que protagonizou “Ópera do Malandro”, com eles; Laila Garin, atriz de “Gonzagão – A Lenda”; Bena Lobo e Geraldo Júnior.
 
As composições, todas belíssimas e alegres, em letra e música, foram produzidas nas muitas excursões da trupe, por todo o Brasil, e “apresentadas” em ônibus, vans e camarins.
 
Quando começaram a pensar no próximo espetáculo, foi percebido o rico material autoral que tinham em mãos. Em um processo, que durou cerca de seis meses, o grupo selecionou algumas músicas, compôs outras e contou com o retorno de DUDA MAIA, diretora de movimento de ‘Gonzagão’, que, agora, assume a direção geral deste ESPETÁCULO.
 
Seguindo o conceito principal do trabalho, os atores promovem uma verdadeira celebração musical – ou um “AUÊ”, como preferir – no palco. Ao longo dos números, a diversidade musical e rítmica das canções fica explícita nos excelentes arranjos, assinados por ALFREDO DEL-PENHO e BETO LEMOS. Desfilam samba de roda, baião, rock, valsa, ijexá, maracatu e coco.
 

 

 

 


Da esquerda para a direita: (em pé) Beto Lemos, Eduardo Rios,

Ricca Barros e Alfredo Del-Penho;

(agachados) Renato Luciano, Fábio Enriquez e Adrén Alves.

 

 

 

“As canções são altamente teatrais e a companhia já tem uma ligação muito forte, uma identidade. O desafio foi potencializar este encontro e integrar os instrumentos ao que acontece em cena. Brincamos, ao falar que eles ‘vestem’ os instrumentos. Não é, simplesmente, pegar o instrumento e tocar; não, é um ‘show’. A ideia é que tudo aconteça de forma natural, integrada à cena”, explica DUDA, que ressalta o intenso trabalho corporal (“não se deve confundir com força ou vigor”) do grupo. “A musicalidade da peça é uma grande homenagem à cultura musical brasileira. Os ritmos dialogam com dança e teatro o tempo todo”, resume a diretora.

 

 

            Não há muito o que dizer sobre este trabalho, porque faltam palavras precisas para descrevê-lo. O que vale, mesmo, é assistir a ele, entregar-se, de corpo e alma, e se deixar levar por uma “horda ordeira”, com perdão do trocadilho, e viajar na proposta do grupo.

 

 

 


 

 


            Levei meu tradicional caderninho, para as anotações, entretanto, desde a primeira cena, entrei em transe e... E quem diz que consegui anotar alguma coisa? Não conseguia desviar o olhar daquela arena e daqueles grandes artistas.

 

Sobre o que vi, e do que me lembro (reassistirei esta semana), farei algumas considerações:

 

            1) Trata-se de um ESPETÁCULO feito para ser apresentado numa arena, a fim de que melhor seja trocada uma energia com o público. Num palco italiano, certamente, perderá muito em qualidade e comunicação com a plateia.

 

            2) Não há, praticamente, cenário, elemento totalmente dispensável, a não ser um tapete vermelho, muito felpudo, que circunda a arena e sobre o qual ficam dispostos os instrumentos musicais utilizados em cena. A direção de arte é de KIKA LOPES, incluindo aí os figurinos, que são lindos, práticos, confeccionados com tecidos leves e bastante maleáveis, gerando um movimento leve, num balé onírico. Uma verdadeira incógnita os trajes, que servem para vestir seres humanos, não importa se são homens ou não. Com eles, a masculinidade dos sete atores também cede espaço a uma deliciosa brincadeira, uma androgenia visual. Grande trabalho da KIKA!

 

            3) O número de abertura, “A BARCA DOS CORAÇÕES PARTIDOS” (“Queira Dionísio nos valer / Antes de Narciso se afogar / Clamem as sereias pra cantar / Que Yemanjá virá nos proteger / Que auê que a Barca faz no coração...”) já é suficiente para sacudir a plateia, sendo altamente impactante. Uma invocação e uma convocação. Uma apresentação. É o sinal de que muito mais coisas boas estão por vir.

 

 

 


 

 

            4) Embora não esteja presente, no programa da peça (excelente, por sinal, com todas as letras das 21 canções) o nome  de quem é responsável pelas coreografias, as quais exigem bastante esforço físico e concentração do grupo, não creio que pairem dúvidas sobre isso: são de DUDA MAIA, responsável por tudo o que se relaciona a movimento de corpo, no ESPETÁCULO, à exceção de uma coreografia aérea, executada, lindamente, por FÁBIO ENRIQUEZ. Esta é assinada por LEONARDO SENNA. As coreografias são um achado.

 

            5) É ótima a iluminação, de RENATO MACHADO, com destaque para umas projeções de arabescos, voltadas para o chão da arena, da mesma forma como funciona muito bem, e não poderia ser de outra forma, o “design” de som, a cargo de GABRIEL D’ÂNGELO.

 

 

 


Mosaico, com destaque para a iluminação.

No quadro inferior, à direita, detalhe de Rick De La Torre, na bateria.

 

 

            6) Alguns dos atores já sabiam tocar instrumentos musicais; outros não. E o que se vê é um grupo de multi-instrumentistas, revezando-se em vários instrumentos, fruto de um aprendizado disciplinado, durante o processo, a partir de muito empenho e determinação. O resultado é brilhante. Tocam e cantam com a alma, mais do que com as mãos e a garganta. Não restam dúvidas de que o grande mago dos instrumentos, o mais eclético de todos, é BETO LEMOS, que já havia se destacado bastante em “Gonzagão” e que, aqui, assina a direção musical, ao lado de outro grande músico, e também tripulante da BARCA, ALFREDO DEL-PENHO.

 

            7) A porção TEATRO está representada, neste ESPETÁCULO, não por uma dramaturgia, propriamente dita, embora possam ser identificados traços dela, nas letras das canções, mas pelo aspecto dramático como são interpretadas, com emoção, humor, lirismo, de acordo com o teor de cada letra.

 

            8) Em grupo ou em solos, todos têm a oportunidade de mostrar seus talentos. O surpreendente é que, quando a gente acha que o ESPETÁCULO atingiu seu clímax, percebe que aquele momento não passa de um anticlímax, ou falso clímax, porque algo mais surpreendente e impactante surge em seguida.

 

            9) EDUARDO RIOS, um furacão em forma humana, protagoniza um dos melhores momentos do ESPETÁCULO, ao interpretar, de forma impecável, “DOIDEIRA DE AMOR – CORDEL”. EDUARDO, arrancando demorados, e merecidos, aplausos da plateia, que se emociona e se diverte com o teor dos versos desse cordel. Pura cultura de raiz brasileira!

 

 

 


Eduardo Rios.

 

 

            10) FÁBIO ENRIQUEZ é outro que brilha, fazendo evoluções num tecido pendente, interpretando a canção “DOM DE UM AMOR SÓ”, cuja letra fala da incapacidade de expressar seu sentimento de amor a uma “dulcineia” perdida. Isso é feito, acompanhado pelos companheiros de cena, todos deitados na arena, formando uma espécie de mandala (LINDO!), executando seus instrumentos musicais. Obra-prima!

 

 

 


 

 


 


 

            11) RICCA BARROS, solando, com uma parcimoniosa participação, em segundo plano, dos demais elementos, encanta, ao interpretar “PRECEITO”, à capela.

 

            12) Novidade, para quem não o conhecia – não para mim, que o conheço e admiro faz tempo – ADRÉN ALVES surpreende os desprevenidos, passeando, com sua voz, que vai dos timbres mais agudos aos mais graves, sem o menor esforço e com muita perfeição.

 

            13) Citei, nominalmente, quatro dos sete intérpretes, mas é impossível - e seria uma injustiça - destacar qualquer um dos integrantes do elenco, pois todos esbanjam talento, assim como não se pode ampliar o foco para  nenhuma das 21 canções, pois todas, sem exceção, são de uma qualidade impressionante, independentemente do ritmo e das letras. O lirismo, em “VERSIM DE AMOR”, é inebriante. O tom erótico, de “REMÉDIO” excita. Em “SAUDADE”, a definição para um sentimento “indefinível” é emprenhada de metáforas lindas. “VIDA DOIDA”, composição que conta com a parceria de Laila Garin, representa um dos momentos de maior descontração do espetáculo. Enfim, todas as canções são sensacionais!

 

            14) Embora não faça parte do grupo, RICK DE LA TORRE, com seu trabalho, na bateria, é indispensável no espetáculo. É o quarto dos Três Mosqueteiros. É o oitavo elemento do grupo. Certamente, é dos melhores profissionais, em seu instrumento, e participa em todas as canções, praticamente.   

 

 

 


 

 

 

            Estamos diante de um ESPETÁCULO, digno de representar o Brasil em qualquer festival no exterior, produto final de uma linda e profunda pesquisa, que enobrece a ARTE BRASILEIRA. Num momento político em que o país se vê imerso, num lamaçal que parece não ter mais fim, “AUÊ” chega como um sinal de esperança, provocando e resgatando o orgulho de ser brasileiro.

 

            Gente, é uma experiência deliciosa, uma das melhores coisas que vi, nos últimos tempos! Poesia e brasilidade.

 

IM-PER-DÍ-VEL l!!!

 

 

 


Ricca Barros (baixo) e Adrén Alves (percussão).

 

 

 
FICHA TÉCNICA:
 
“AUÊ” - Um espetáculo da BARCA DOS CORAÇÕES PARTIDOS
 
Criação: A Barca dos Corações Partidos e Duda Maia
Direção: Duda Maia
Direção Musical e Arranjos: Alfredo Del-Penho e Beto Lemos
 
Elenco:
Adrén Alves (percussão, sax soprano e vocais)
Alfredo Del-Penho (violão, guitarra, baixo, cavaquinho, flauta, percussão e vocais)
Beto Lemos (guitarra, violão, rabeca, sanfona e percussão)
Eduardo Rios (sanfona, sax tenor e vocais)
Fábio Enriquez (trompete, percussão e vocais)
Renato Luciano (violão, trombone e vocais)
Ricca Barros (baixo, sax alto e vocais)
Músico convidado: Rick de La Torre (bateria)

Iluminação: Renato Machado
Direção de Arte: Kika Lopes
Design de Som: Gabriel D’Ângelo
Coreografia Aérea: Leonardo Senna
Visagismo: Uirandê de Holanda
Direção de Produção: Andréa Alves
Diretor Assistente: Eduardo Rios
Coordenação de Produção: Leila Maria Moreno
Produção Executiva: Monna Carneiro
Assistente de Iluminação: Rodrigo Maciel
Assistente de Direção de Arte: Rocio Moure
Preparação dos Instrumentos de Sopro: Gilson Santos
Fotografia: Silvana Marques
Programação Visual: Beto Martins e Gabriela Rocha
Assessoria de Imprensa: Factoria Comunicação
 

 

 


 

 

 
SERVIÇO:
 
Temporada: De 7 a 31 de janeiro de 2016.
Dias e Horários: De 3ª feira a sábado, às 20h30min; aos domingos, às 19h.
Local: Espaço Sesc (Arena).
Endereço: Rua Domingos Ferreira, 160 – Copacabana.
Tel: 2547-0156.
Ingressos: R$5,00 (associados do Sesc), R$10,00 (meia-entrada), R$20,00 (inteira).
Duração: 80 minutos.
Classificação etária: Livre.
Bilheteria: De 3ª feira a domingo, das 15h às 21h.
Vendas antecipadas no local.
 

 

 


 

 

 

(FOTOS: SILVANA MARQUES.)

2 comentários:

  1. Há muitos anos não vejo um espetáculo tão simples (palco) e tão complexo (melodias, harmonias, letras, cenas e interpretações), de quase não conseguir piscar os olhos para não perder nenhum segundo. Este é para ganhar prêmios.

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