“ÂNIMA”
ou
(“ÂNIMA”
ANIMA O ÂNIMO.)
ou
(SOMA DE MUITOS ACERTOS.)
“Não se deve mexer em time
que está ganhando.”, diz o dito popular. E parece que a afirmação é bem
verdadeira. Desde o ano passado até os dias atuais, um espetáculo vem
alcançando muito sucesso, inclusive merecedor de premiações – e
deveria ter recebido muitos mais, a meu juízo –, reunindo três nomes que
ora voltam a trabalhar juntos: LÚCIA HELENA GALVÃO, a dramaturga; LUIZ ANTÔNIO ROCHA, o diretor; e BETH ZALCMAN, atriz. O espetáculo em questão é “Helena
Blavatsky, A Voz do Silêncio”. Os três estão de volta, desta vez com “ÂNIMA”, outro solo, no qual a autora,
motivada por uma frase da filósofa, música e escritora argentina Delia
Steinberg Guzmán, homenageia seis mulheres que foram muito importantes
para a Humanidade: Simone Weil, Joana D’arc, Helena
Blavatsky, Harriet Tubman, Marguerite Porete e Hipátia
De Alexandria. As seis têm em comum a coragem de lutar por seus ideais
e jamais traí-los, nem que, para isso, tivessem que pagar com a própria vida.
Da mesma forma como, genialmente, se comportou na direção de “Helena
Blavastsky, A Voz do Silêncio”, LUIZ
ANTÔNIO dirige o espetáculo, no qual BETH
também esbanja o mesmo talento já nosso velho conhecido. A referida frase
motivadora da peça:
“Desde sempre, e para sempre,
toda mulher tem parentesco com a primeira estrela brilhante que levou luz ao
azul profundo do céu.”
(Delia Steinberg Guzmán)
SINOPSE:
“ÂNIMA” é uma
história sobre mulheres que mudaram o curso da história da humanidade, contada
por uma tecelã.
A personagem entrelaça os fios da vida,
em busca de sua ancestralidade feminina, dando voz a seis mulheres idealistas e
pensadoras: Simone Weil, Joana d'Arc, Helena Blavatsky,
Harriet Tubman, Marguerite Porete e Hipátia
de Alexandria.
Cada fio conta uma história, que,
escrito nas estrelas, ecoa através dos séculos.
LÚCIA HELENA
GALVÃO é uma filósofa, professora, escritora, poetisa e conferencista. Como
voluntária, há 35 anos, ministra aulas e profere palestras na organização Nova
Acrópole do Brasil sobre diversos temas relacionados à Filosofia.
Sua principal característica, o que a faz contar com um enorme números de
alunos, leitores e seguidores, é o fato de trazer uma área tão “confusa
e hermética”, como são os temas filosóficos, para um nível prático e aplicável,
estabelecendo conexões entre conhecimentos antigos e a atualidade. Ela trabalha
a filosofia num patamar menos complicado, em “língua de gente”, como
dizia o grande inventor de palavras João Guimarães Rosa. Este é o terceiro texto para TEATRO de uma escritora que resolveu contar os feitos de
grandes mulheres da História
pelo olhar de uma tecelã, a personagem de BETH
ZALCMAN. Um pouco de cada heroína, na ordem em que são apresentadas ao
público:
Lúcia Helena Galvão.
(Foto: Internet.)
1) Simone Weil foi uma escritora, mística e filósofa francesa, que se tornou operária da montadora de automóveis Renault, apenas para escrever sobre o cotidiano dentro das fábricas, para que seus escritos fossem mais realistas, os mais próximos possíveis da realidade daquelas pessoas oprimidas e exploradas pelos patrões. Lutou na Guerra Civil Espanhola, ao lado dos republicanos, e na Resistência Francesa, em Londres. Acometida de tuberculose, não teria admitido se alimentar, além da ração diária permitida aos soldados, nos campos de batalha, ou aos civis, pelos tíquetes de racionamento. Com a progressiva deterioração de seu estado de saúde, em estado de desnutrição, faleceu poucos dias depois de seu internamento hospitalar. Simone Weil era dotada de uma capacidade ímpar de ver, simbolicamente, a vida e aprofundar-se em seus segredos mais íntimos.
2) Joana D’Arc foi uma
camponesa que liderou tropas francesas durante a Guerra dos Cem Anos. Conquistou
significativas vitórias para a França, quebrando um ciclo de
derrotas daquele país. Capturada pelos ingleses, foi julgada e condenada por
bruxaria, sendo morta na fogueira, aos 19 anos de idade. Em 24 de
maio de 1430, Joana teria sido presa por
franceses aliados aos ingleses. A partir daí, teria sido julgada e condenada.
Sua “ficha
prisional” incluiu acusações de heresia e bruxaria, o que só
aconteceu com mais força por ser mulher, em posição de destaque. Foi canonizada
pela mesma Santa Madre Igreja Católica que a assassinou na fogueira. Joana
foi uma inesquecível guerreira e idealista.
3) Helena (Petrovna) Blavastky, mais
conhecida como Helena Blavatsky ou Madame Blavatsky, foi uma ativa
escritora russa, responsável pela sistematização da moderna Teosofia
e cofundadora da Sociedade Teosófica. Segundo várias testemunhas, logo se
mostrou dotada de poderes psíquicos ou sobrenaturais, e a tradição existente
sobre ela diz que era capaz de materializar flores, levitar pequenos objetos e
de produzir outros prodígios. De personalidade complexa,
dinâmica e independente, desde pequena, Blavatsky mostrou possuir um caráter
forte e dons psíquicos incomuns. Imediatamente após um casamento frustrado,
deixou o esposo e partiu, em um longo período de viagens, por todo o mundo, em
busca de conhecimento filosófico, espiritual e esotérico, e, nesse intervalo,
alegou ter passado por inúmeras experiências fantásticas, entrado em contato
com vários mestres de sabedoria, tendo recebido deles, na condição de discípula,
um treinamento especial, para desenvolver seus poderes paranormais de
forma controlada, a fim de que pudesse servi-los como instrumento para a
instrução do mundo ocidental. A partir de 1873, iniciou sua carreira pública
nos Estados Unidos e, em pouco tempo, se tornou uma
figura tão celebrada quanto polêmica. Helena Blavatsky foi duramente condenada
por seus contemporâneos, por sua ousadia e originalidade.
4)
Harriet Tubman foi
uma abolicionista e ativista norte-americana. Nascida escravizada, foi espancada e
açoitada por seus vários senhores durante a infância. Ainda jovem, sofreu uma
lesão craniana traumática, quando um senhor de escravo jogou um pesado peso de
metal num escravo fugitivo, mas acabou acertando-a. A lesão causou-lhe
tonturas, dores e períodos de sonolência excessiva, que
ocorreram ao longo de sua vida. Depois do ferimento, começou a ter visões
estranhas e sonhos vívidos, os quais atribuiu a premonições de Deus.
Estas experiências, combinadas com sua educação metodista, levaram-na a se
tornar uma religiosa devota. Tubman escapou de seus algozes e, subsequentemente, fez 19
missões para resgatar centenas de pessoas escravizadas, incluindo familiares e
amigos, usando uma rede de ativistas anti-escravatura e abrigos. Durante
a Guerra Civil Americana, ela serviu como batedora armada e espiã
para o exército da União. Em seus últimos anos, Tubman tornou-se uma
ativista pela causa do voto feminino.
5) Marguerite Porete foi uma “beguina” (As beguinas viviam em beguinários, que eram grupos
autossuficientes de casas individuais, frequentemente cercadas e congregadas ao
lado de uma igreja, em ambientes urbanos. Elas atendiam pobres e enfermos, em
hospitais e asilos para pacientes de hanseníase ou em suas próprias
enfermarias.) do século
XIII, nascida no condado de Hainaut, entre os atuais território
da Bélgica
e Holanda. Como beguina, fez o serviço em comunidade
com outras mulheres, que viviam do seu próprio trabalho. As beguinas
superavam os limites impostos pelo clero, cultivando uma mística própria de
encontro com o divino. Sobre ela, as informações
são escassas. Não há muita notícia sobre a sua vida, a não ser pelos autos do
processo inquisitório que a levou à morte, em 1310, condenada como “herética
recidiva, relapsa e impenitente”. Foi a grande pensadora e mística do
século XII, que nos legou a reconhecida obra “Espelho das Almas Simples e
Aniquiladas que Permanecem Somente na Vontade e no Desejo do Amor”, a
qual lhe rendeu uma condenação à morte, na fogueira.
6) Hipátia de Alexandria, ou Hipácia
de Alexandria, foi uma filósofa
neoplatônica do Egito Romano. Foi a primeira mulher documentada como tendo sido
matemática. Como chefe da escola platônica, em Alexandria, também
lecionou filosofia e astronomia. De
acordo com uma única fonte contemporânea, Hipátia foi assassinada por uma
multidão de cristãos, depois de ter sido acusada de exacerbar um conflito entre
duas figuras proeminentes em Alexandria: o governador Orestes e o bispo
de Alexandria, Cirilo. Defendia liberdade
de religião e de pensamento. Acreditava que o Universo era regido por
leis matemáticas. Tais ideias suscitaram a ira de fundamentalistas cristãos, os
quais, em plena decadência do Império Romano, lutavam por
conquistar a hegemonia cultural. Hipátia foi uma culta
investigadora, vítima do fanatismo de seu tempo.
Por que o
título da peça? “Anima” é uma
palavra latina, originalmente usada para descrever ideias como respiração,
alma, espírito ou força vital. Jung começou a usar o termo, no
início dos anos 20, para descrever o lado feminino interno dos homens. Literalmente,
sua tradução, em português, seria “alma”; a “alma feminina”. ÂNIMA’ é uma
peça que fala da alma feminina.
O que a
dramaturga deseja, com seu brilhante texto, é tornar conhecidos os pensamentos, a
coragem e as lutas dessas seis mulheres, representando tantas outras que também
deram sua vida pela liberdade de pensar e existir, com autenticidade, de todos
os seres humanos. Esse é o fio condutor de “ÂNIMA”. “No monólogo, uma
tecelã, interpretada por Beth Zalcman, entrelaça fios em busca da
sua ancestralidade feminina, por meio das vozes destas grandes idealistas e
pensadoras da humanidade. Cada fio revela histórias e conquistas dessas
mulheres. Esses fios estão presentes na iluminação e na cenografia, sobre as
quais falarei mais adiante. No fundo, o
espetáculo quer retratar o poder
transformador das mulheres, cada vez mais importante no mundo atual. A
coragem e a resistência daquelas seis mulheres ainda estão, felizmente,
presentes em tantas outras do nosso dia a dia, famosas ou não. Segundo a
autora, “Este é um belo ‘arsenal’ de habilidades femininas. Embora não
pretendamos esgotar todo o potencial feminino com essa breve reflexão, queremos
destacar o poder transformador que as mulheres trazem consigo. Elas preenchem
muitos dos ‘vazios’ que tanto afligem a humanidade, e é fundamental reconhecer
e valorizar suas contribuições”.
Dirige o solo LUIZ
ANTÔNIO ROCHA, que atua em todos os segmentos artístico-culturais, criando
e produzindo projetos para todos os perfis de público. São quase 40
anos dedicados à produção de qualidade com temáticas relevantes. No TEATRO,
assinou a direção de grandes espetáculos, como “Uma Loira Na Lua”, “Frida
Kahlo, A Deusa Tehuana”; “Brimas”; “Zilda Arns, A Dona Dos Lírios”,
escrita por ele; “Paulo Freire, O Andarilho Da Utopia”; “Helena Blavatsky, A Voz Do
silêncio”, em cartaz até hoje; e “O Profeta”. Quando há uma grande
afinidade entre diretor e elenco, qualquer trabalho flui melhor e o resultado
final, via de regra, é bom. Graças à enorme cumplicidade entre LUIZ ANTÔNIO ROCHA e BETH ZALCMAN, iniciada em “Brimas”
e solidificada em “Helena Blavatsky, A Voz Do silêncio”, estamos diante de um
grande espetáculo teatral. Ele é cirúrgico nas suas ideias de decodificação do
texto e, de forma bastante inventiva, valendo-se da equipe de criação à sua
volta, assina a direção de um dos melhores espetáculos em cartaz no Rio
de Janeiro, no momento.
Luiz Antônio Rocha.
(Foto: Internet.)
Com relação a essa equipe,
destaca-se o nome de RICARDO FUJII, responsável
por um projeto de luz digno dos maiores elogios. Quando escrevi sobre
o espetáculo “Helena Blavatsky, A Voz Do silêncio”, no qual RICARDO também assinava o desenho
de luz, fiz referência a uma iluminação com a qual a atriz contracenava.
Agora, não é diferente; e em maior grau. No bom sentido, o artista abusou no
emprego de raio laser e conseguiu construir traços e feixes de luz que se
incorporam à cenografia; são, também, elementos cênicos, no final, de uma
beleza rara. Em duas cenas, em que as personagens acabam incineradas numa
fogueira, FUJII preparou, para o
público, uma agradável surpresa.
Já que falei em cenografia,
a direção optou por um palco nu, deixando à vista do público até as coxias. É o
espaço de criação para a atriz. E o público pode imaginar o que bem entender,
já que, como diz, e repete, BETH ZALCMAN,
“o
TEATRO é um oceano de possibilidades”, que comporta, inclusive, numa
das cenas, a entrada de um drone, que leva uma carta até a atriz, para o grande
espanto da plateia. Há, entretanto, para “rechear” um pouco o amplo espaço e
cobrir a “nudez” desse palco, a entrada de uma cadeira, um microfone num
pedestal, um cabide de pé e três espelhos, para serem utilizados, como apoio à
interpretação, em alguns trechos da peça. Quando, num dos parágrafos acima, falei
na presença dos “fios” em cena, estava querendo me referir aos múltiplos e
coloridos feixes de luz, produzidos pela ação do laser, projetado sobre minúsculas
esferas de vidro – obra de um gênio – e os fios vermelhos que revestem a já
citada cadeira, um dos traços marcantes da obra da artista plástica THANARA SCHORNADIE.
É também criação de THANARA o instigante figurino vestido pela atriz. É uma curiosa peça, de difícil descrição, em tecido cru, ao que parece, que vai sendo modificada, ao longo da encenação, por acréscimo de partes e detalhes, acessórios, estes caracterizando cada uma das mulheres interpretadas.
E o que dizer
sobre BETH ZALCMAN? Além de uma fabulosa atriz, também é autora. Apesar
de estar mais em atividade no cinema e na televisão, BETH é, na minha
maneira de analisar o trabalho de quem representa, uma atriz de TEATRO, com 40 anos de carreira artística. Ela nos
brinda, e encanta, com seis interpretações impecáveis. A cada uma das personagens,
imprime uma identidade singular, contudo mantém, em todas, uma característica
que admiro deveras: o falar pausado, com muitas variações de tonalidade. BETH saboreia e valoriza cada vocábulo.
E quem ganha com isso é o espectador.
FICHA TÉCNICA:
Idealização:
Beth Zalcman e Luiz Antônio Rocha
Argumento e
Texto Original: Lúcia Helena Galvão
Encenação:
Luiz Antônio Rocha
Interpretação:
Beth Zalcman
Cenografia:
Luiz Antônio Rocha e Toninho Lôbo
Confecção da
Cadeira: Thanara Schornadie e Mailson Alves Carvalho / @chokoartes
Figurino:
Thanara Shornadie
Projeto de Luz:
Ricardo Fujii
Trilha Sonora
e Preparação Vocal: Breno Pezurno
Sonoplastia:
Anderson de Almeida / Take Final
Preparação
Corporal: Miriam Weitzman
Assessoria
de Imprensa: Mario Camelo (Prisma Colab)
Fotos:
Marcelo Estevão – Modus Focus e Jow Coutinho
Mídias Sociais:
Felipe Pirillo / Inspira Teatro
Visagismo:
Neandro
Técnico de
Luz: Gabriel Oliveira
Operador de
Luz: Paulo Roberto
Técnico e
Operador de Som: Luan Araújo
Diretor de Palco:
Lincoln Batistela
Direção de
Produção: Luiz Antônio Rocha
Produção Executiva:
Zilene Vieira
Parceria:
Nova Acrópole
Realização:
Espaço Cênico, Mímica em Trânsito e Teatro em Conserva
SERVIÇO:
Temporada:
De 31 de maio a 30 de junho de 2024.
Local:
Teatro Fashion Mall.
Endereço: Estrada
da Gávea, nº 899, São Conrado – Rio de Janeiro (São Conrado Fashion Mall).
Dias e
Horários: 6ª feira e sábado, às 20h; domingo, às 19h.
Valor dos Ingressos:
R$ 120 (inteira), R$ 60 (meia-entrada) e R$ 70 (Vivo Valoriza).
Vendas Antecipadas: https://bileto.sympla.com.br/event/92852/d/250164/s/1707505
Informações:
(21) 99857-8677.
Lotação: 430
lugares.
Duração: 60
minutos.
Classificação
Etária: 12 anos.
Gênero: Monólogo.
“ÂNIMA” é um espetáculo muito oportuno, visto que pretende retratar o poder
transformador das mulheres, tão em foco no momento. A peça quer “contribuir
para a compreensão da condição feminina em seus diferentes aspectos culturais,
inclusive determinando as imagens do feminino no mundo contemporâneo”. E
o consegue. “ÂNIMA” é o feminino em sua máxima expressão. Cabe, agora, a mim,
atriz, girar a roda do tear e dar vida a elas!”, enfatiza BETH ZALCMAN. Não tenha dúvidas quanto
a isso, BETH! O espetáculo sai de
cartaz no próximo final de semana, mas seria ótimo se voltasse em outra
temporada. Já assisti a ele duas vezes e recomendo-o muito!
FOTOS: MARCELO
ESTEVÃO (MODUS FOCUS)
e
JOW COUTINHO.
GALERIA PARTICULAR
(Fotos: Ana Cláudia Matos
e
João Pedro Bartholo.)
VAMOS AO TEATRO!
OCUPEMOS TODAS AS SALAS DE ESPETÁCULO DO BRASIL!
A ARTE EDUCA E CONSTRÓI, SEMPRE; E SALVA!
RESISTAMOS SEMPRE MAIS!
COMPARTILHEM ESTA CRÍTICA, PARA QUE, JUNTOS, POSSAMOS DIVULGAR O QUE HÁ DE MELHOR NO TEATRO BRASILEIRO!
Bartholo muitíssimo obrigado. Muito emocionado com sua crítica.
ResponderExcluir