quarta-feira, 1 de novembro de 2023

 “GUASU”

ou

(UMA BELA FICÇÃO

INSPIRADA NA REALIDADE.)

 

 






         Nem sempre consigo escrever sobre uma peça teatral que me agradou tão logo tenha assistido a ela – condição “sine qua non”, para eu me decidir a fazer meus comentários críticos – por falta de tempo, entretanto, se me agradou, de verdade, procuro escrever sobre ela, até mesmo se a temporada já tiver sido encerrada ou em sua fase final, como é o caso de “GUASU”, um musical autoral, brasileiro, ao qual assisti na semana passada e que está em sua última semana em cartaz (VER SERVIÇO.) O espetáculo foi idealizado e escrito por BRUCE DE ARAÚJO, que também faz parte do elenco, e é dirigido por VILMA MELO.

 




 SINOPSE:

“GUASU” é um musical que conta a história de cinco soldados brasileiros, durante a “Guerra do Paraguai”, especificamente na “Retirada da Laguna”, os quais, depois de um ataque, se perdem da tropa e têm que, juntos, voltar ao Brasil pela fronteira do Mato Grosso do Sul.

Em consequência disso, eles passam a viver suas próprias aventuras, ao fugir daquela cruel realidade, no desejo de retornar, por conta própria, à sua pátria.

Dentre os desdobramentos, neste caminho de volta, surgem situações como uma inédita igualdade de condições entre três etnias que formaram o Brasil e estavam unidas por um mesmo objetivo naquele cenário, trazendo a dúvida sobre como se davam os conflitos raciais e culturais naquele contexto.

E ainda sobra espaço para um romance “gay” entre dois soldados, com a intenção de evidenciar pessoas LGBTQIAPN+ como agentes da história do Brasil.



 


         Sou um grande admirador de musicais e me sinto, de uma forma especial, bastante tocado, quando me vejo diante de uma montagem autoral, de um brasileiro, o que, em nosso país ainda está em fase de “engatinhar”, porém já apresentando bons frutos. “GUASU” é um deles, certamente. Considero uma ótima ideia, de BRUCE DE ARAÚJO, o apoio num episódio real, estudado nos bancos escolares, para criar uma obra de ficção com um excelente texto – e aqui considero também as canções, cujas letras ajudam a contar a história – produzida de forma simples, sem "pirotecnias", mas muito bem cuidada.




         O idealizador do projeto e autor do texto, BRUCE DE ARAÚJO, disse que sua motivação para escrever a peça veio de seu interesse em conhecer, mais profundamente, o episódio da “Guerra do Paraguai”, o que o levou à leitura do livro “A Retirada da Laguna”, do Visconde de Taunay, no qual, realmente, há o registro de casos de soldados se perdendo, além de deserções. A partir da realidade, o dramaturgo passou a exercitar a criatividade e a imaginação: “E se cinco soldados brasileiros tivessem se perdido da tropa e tivessem que voltar sozinhos até o Brasil?”. Percebeu ele que, “quando a gente estuda o tema, normalmente só os generais e Imperadores são mencionados. Senti necessidade de saber quem eram aqueles soldados, o que eles pensavam, sonhavam, temiam. Quais eram as esperanças daqueles brasileiros?”. E partiu para voos imaginativos e criativos, até ser construída toda a narrativa, na qual inseriu ingredientes que considerou importantes, como: 1) uma inédita igualdade de condições naquele cenário, trazendo a dúvida sobre como se davam os conflitos raciais e culturais num contexto em que as três etnias que formaram o Brasil estavam unidas por um mesmo objetivo; 2) um romance “gay” entre dois soldados, com a intenção de evidenciar pessoas LGBTQIAPN+ como agentes da história do Brasil; 3) e uma grávida que tenta se manter viva, em meio a tantos conflitos brutais, dentre outras situações.



       

         Aqui, reservo-me o direito de dizer, com relação ao “ingrediente” número 2, que ele bem que poderia ter ficado de fora desta “receita”. Poderia não haver a abordagem do tema, nesta obra, uma vez que a julgo totalmente desnecessária, não agregando, a meu juízo, o menor valor à trama e à justa causa LGBTQIAPN+. O envolvimento homoafetivo entre os dois soldados é abordado de forma bem suave e poética, sem qualquer apelação, entretanto penso que, se retirado do corpo da peça, não causaria a menor diferença, a não ser encurtar o tempo de duração do espetáculo. Assim mesmo não seria algo considerável, já que a cena é bem curta e, penso eu, tão superficial, que não causa nenhum impacto ou interesse maior, talvez nem para a comunidade afeta a ela. Quero, porém, deixar bem claro que sua presença, na dramaturgia, se nada acrescenta, a meu ver, também não a desabona nem um pouco; é apenas “uma gordura”, na minha opinião.




         Com relação ao título da peça, “GUASU” (lê-se “guaçu”) este foi escolhido por um motivo especial, conforme explicação, extraída do “release” da peça, que recebi de BRUNO MORAIS (Marrom Glacê – Assessoria de Imprensa): “A peça é um manifesto pacifista não panfletário. O nome ‘Guerra do Paraguai’ é só aqui, no Brasil. Na Argentina e no Uruguai, é chamada de ‘Guerra da Tríplice Aliança’. E, no Paraguai, que ficou em ruínas, diante de uma guerra longa e sanguinária, eles chamam de ‘A Grande Guerra’. ‘Guasu’ significa ‘grande’. “Guerra Guasu’, assim eles a chamam. Daí a escolha.”, pontua BRUCE.




         Como se trata de um musical, a peça é pontuada por muitas belas canções. Com relação a estas, quase todas as letras foram escritas por BRUCE, o qual também, segundo pude apurar, compôs a “base bruta” das melodias, as quais receberam um “tratamento final” de FRED DEMARCA, que também atua no espetáculo, e MUATO, os quais assinam a correta direção musical da montagem. Um solo da personagem vivida por LUÍSA VIANNA tem letra dela e de BRUCE e melodia de FRED. Na trilha sonora, toda original, há uma saudável mistura de vários ritmos e tendências musicais, tais como rap, trap, samba, sertão, ladainha, “funk”, atabaque e violão”. A parte musical serve para “transcender os estados emocionais dos personagens, os sonhos, os anseios, as questões dos soldados”, algumas; “outras trazem mais poesia e brasilidade à história; e também abrem janelas sobre a guerra, através de relatos das batalhas mais importantes”.





O elenco atua com total equilíbrio. Percebi que todos se atiram a seus personagens com total entrega. Fazem parte dele, em ordem alfabética: BRUCE DE ARAÚJO, FRED DEMARCAHIGOR CAMPAGNAROLUCAS SAMPAIOLUÍSA VIANNAMATHEUS DIASTOM KARABACHIAN e YUMO APURINÃ. Pelo fato de o Mezanino do SESC Copacabana ser bastante pequeno, fazendo com que o público fique bem perto dos atores, num ambiente bem intimista, e, mais ainda, porque fiquei acomodado na primeira fila, como gosto, pude notar detalhes na interpretação do grupo. Isso me possibilitou identificar melhor um excelente trabalho, que se destaca dos demais, de quatro atores: BRUCE, HIGOR, LUÍSA e YUMO, este de etnia indígena. As atuações de HIGHOR e LUÍSA, que formam um casal paraguaio, na trama, foram as que mais me encantaram.




No decorrer da narrativa, os atores executam coreografias desenhadas por RODRIGO NUNES, com um toque genuíno de brasilidade, já que os números de dança reportam à cultura de raiz dos terreiros de candomblé, catimbó, jurema e jongo, “onde o popular e o ancestral servem como fonte para a criação”.




A cenografia da peça, criada por CACHALOTE MATTOS, engloba um linóleo que imita terra, forrando e delimitando todo o espeço cênico, sobre o qual há muitas pétalas vermelhas espalhadas; árvores estilizadas, secas, feitas com armações de ferro; e peças de um acampamento; tudo bem de acordo com a proposta do texto.




FERNANDA GARCIA e PRISCILA PIRES criaram os figurinos da peça, um dos grandes destaques do espetáculo, para mim. São peças bem rudimentares, em cores frias, confeccionadas em tecidos rústicos, de diversas texturas, trabalhadas na aparência de velhas e surradas.




Tão fantástica quanto o figurino é a iluminação, a cargo de ANDERSON RATTO. Não saberia descrevê-la em detalhes, porém consigo dizer que é um dos melhores desenhos de luz que vi, neste ano. Para criar um clima de suspense, de densidade, RATTO não usou uma luz exuberante, preferindo trabalhar mais com sombras e matizes deslumbrantes.




Quão belo e competente é o trabalho de direção de VILMA MELO! O tema da peça é delicado e requer muita atenção, de quem o dirige, para que não tome algum rumo indesejável. VILMA, com sua grande experiência, como atriz e em direções anteriores, sempre com total acerto, e enorme dose de sensibilidade, soube extrair o melhor rendimento possível de cada um do seu elenco e fez com que a história fosse contada de forma a que o público não perdesse o interesse por ela em nem um minuto. O espetáculo é dinâmico, na medida certa. Na noite em que assisti ao musical, VILMA estava presente, na plateia, e, vez por outra, meu olhar a procurava e eu via uma pessoa totalmente “dentro da encenação”, vibrando, como uma oitava pessoa em cena. A diretora, como todos da plateia, saboreava, palavra a palavra, gesto a gesto, tudo o que o excelente elenco tinha para nos mostrar, sob o comando dela.

   

 


      




 FICHA TÉCNICA:

Texto e Letras: Bruce de Araujo

Direção: Vilma Melo

Assistência de Direção: Fernanda Dias

 

Elenco (em ordem alfabética): Bruce Araújo, Fred Demarca, Higor Campagnaro, Lucas Sampaio, Luísa Vianna, Matheus Dias, Tom Karabachian e Yumo Apurinã

 

Direção Musical: Fred Demarca e Muato

Cenário: Cachalote Mattos

Figurino: Fernanda Garcia e Priscila Pires

Iluminação: Anderson Ratto

Coreografia: Rodrigo Nunes

Preparação Vocal: Guilherme Borges

Arte Gráfica: Giulia Santos

Vídeo e Projeção: Caco Chagas

Assessoria de Imprensa: Marrom Glacê Comunicação

Fotos: Renato Mangolin

Direção de Produção: Bruce de Araujo

Assistência de Produção: Pedro Barroso

Realização: HBAW; Ayráújo Produções

Supervisão de Produção: Kawaida Cultural - Aliny Ulbricht e Raíssa Imani

 

 


 


 

 SERVIÇO:

Temporada: De 12 de outubro a 05 de novembro de 2023.

Local: Sesc Copacabana (Mezanino).

Endereço: Rua Domingos Ferreira, nº 160 - Copacabana - Rio de Janeiro.

Informações: (21)2547-0156.

Dias e Horários: De quinta-feira a domingo, às 20h30min.

Valor do Ingresso: R$7,50 (associado do Sesc), R$15,00 (meia-entrada) e R$30,00 (inteira).

Horário de Funcionamento da Bilheteria – De terça a sexta-feira, das 9h às 20h; sábados, domingos e feriados, das 14h às 20h.

Classificação Indicativa: 14 anos.

Duração: 90 minutos.

Gênero: Musical

 

 

        



         Conseguir uma pauta, em algum espaço pronto a receber uma peça de TEATRO, hoje, no Rio de Janeiro, está se tornando um gigantesco desafio para os produtores e os artistas, em geral. Sobra gente querendo mostrar seu trabalho, sua ARTE, e faltam espaços para atender à alta demanda.  Se a produção de “GUASU” só conseguiu o acanhado espaço do Mezanino do SESC Copacabana, menos mal, pois, pelo menos, o espetáculo pode ser mostrado a um pequeno número de espectadores, entretanto, por sua qualidade, o espetáculo merecia um espaço maios nobre, como, por exemplo, a Arena do mesmo SESC Copacabana, ou outro semelhante.




         Quem me lê tem mais quatro oportunidades para conferir as minhas palavras.



 

 


FOTOS: RENATO MANGOLIN

 


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