quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018

BOCA
DE
OURO


(DE COMO SE VALORIZAR
UM TEXTO TEATRAL.
ou
UMA RELEITURA GENIAL
DE UM TEXTO TEATRAL
DE MÉDIA PROFUNDIDADE.)





            Poucas coisas, na vida, são tão gratificantes e podem ser comparadas ao prazer de se deixar um teatro em total “estado de graça”, após ter assistido a uma OBRA-PRIMA. É uma sensação que, em mim, pelo menos, se prolonga por muito, muito, muito tempo...

            Vivenciei, no último sábado, dia 27 de janeiro (2018), essa experiência, algumas vezes já sentida, mas que foi a primeira da atual temporada teatral, no Rio de Janeiro, mais propriamente, no Teatro SESC Ginástico (VER SERVIÇO.), onde está em cartaz “BOCA DE OURO”, numa encenação primorosa e inesquecível de GABRIEL VILLELA e seu fantástico grupo de atores, criadores e técnicos. Um trabalho em equipe, que não abre nenhuma brecha para críticas negativas.

            Para um não admirador assumido, quase contumaz, da obra de NELSON RODRIGUES, como eu, sem medo dos apedrejamentos, sinto que faltavam diretores competentes, para começar a me fazer enxergar a dita e tão proclamada genialidade do consagrado dramaturgo, que não consigo assimilar, totalmente, e que só reconheço em meia dúzia de seus 17 textos para o palco. Já cruzei com um ou outro desses diretores.






            Se há o que me agrada bastante, na obra de NELSON, é a sua capacidade de ironizar cruelmente o que bem lhe aprouver e o seu vocabulário, com gírias e frases de efeito, que servem para um estudo antropológico do carioca das décadas de 40 e 50, principalmente. Acho uma delícia ouvir coisas como Carambolas!; Papagaio!; É de arder!; Acho pau!; É espeto!; É fogo na roupa!; É de morte!; Ora, que pinoia!; Será o Benedito?; Batata!; Uma teteia!; Bacana!; Estou frito!; Algum bode?; Fizeram minha caveira!; No duro!; Chispa!; O gabola era garganta pura!; Um espirro de gente.; Entrar de sola.; Sossega o periquito!; Comigo não, violão!; Desembucha, anda!; Faz fé com tua cara.; Pode dar em cima!Não me venhas com chiquê, com nove horas! Nem todas estão presentes em “BOCA...”, mas se encontram espalhadas na sua vasta obra, inclusive nos livros de outros gêneros, que não o dramático.









Outro detalhe de que gosto bastante, e que é melhor, ainda, explorado em “Beijo no Asfalto”, é a crítica à imprensa, principalmente a dita “marrom”, da qual CAVEIRINHA (CHICO CARVALHO), neste “BOCA...”, é um típico representante. A imprensa, como formadora de opinião, não tem o direito de manipular as notícias e fugir ao seu compromisso com a veracidade dos fatos e o respeito aos leitores.

Confesso que “BOCA DE OURO” nunca esteve na minha lista de “tops rodriguianos”, entretanto, GABRIEL VILLELA mexeu com os meus conceitos, fez uma releitura da obra de tal monta, que me fez ampliar a minha lista de peças, escritas pelo Anjo Pornográfico, de que passei a gostar. Até a página cinco. Estou falando, exclusivamente, do texto.

Quem toma o original de “BOCA DE OURO” para ler, como foi o meu primeiro contato com a peça, não pode imaginar o que uma cabeça privilegiada, como a de GABRIEL, pode enxergar nele e como ele consegue transformar aquelas palavras numa montagem esplendorosa e criativa.

            O espetáculo, ao qual não consegui assistir, no final do ano passado, em São Paulo, por incompatibilidade de agendas, é motivo de orgulho para quem ama o TEATRO e vê nele uma excelente forma de modificar o ser humano, quer fazendo-o mais culto, quer ampliando-lhe a capacidade crítica, quer fazendo-o mergulhar no seu interior e descobrir e libertar os seus fantasmas, quer desenvolvendo-lhe o reconhecimento de seu papel na sociedade da qual faz parte.






            GABRIEL VILLELA é um dos meus preferidos diretores de TEATRO brasileiro, um gênio, um homem dotado de uma criatividade, de uma sensibilidade e um senso de bom gosto, que não podem ser enxergados dentro de um poço sem fundo. A imagem metafórica se explica pelo fato de seu talento não ter limites; nem ele os reconhece e está, sempre, nos surpreendendo, positivamente, a cada trabalho criado. Quando eu penso que não será capaz de se superar, lá vem GABRIEL com uma nova montagem, mais arrebatadora, mais inquietante que as anteriores. E assim segue a vida: GABRIEL VILLELA nos dando motivos para nos ufanarmos, com relação ao nosso TEATRO.

            Ele tira, da manga, cartas que jamais imaginaríamos ver sobre a mesa. Suas ideias são extremamente ricas e totalmente ligadas aos textos que ele encena. Busca elementos ligados ao universo contido nos roteiros e, a partir daí, uma enxurrada de excelentes resoluções começam a surgir, resultando em montagens que são verdadeiras obras-primas, como “Os Gigantes da Montanha”, com o Grupo Galpão, além de “Romeu e Julieta”, este bem mais antigo; “Um Réquiem Para Antônio”; “A Tempestade”; “Peer Gynt” e “Rainhas do Orenoco”, para citar apenas seus mais recentes trabalhos. Guardo mínimos detalhes de cada uma dessas montagens, todas geniais.    









            Para este “BOCA...”, ambientado no subúrbio carioca de Madureira, GABRIEL, também cenógrafo da peça, pensou numa gafieira, que se alterna com a redação de um jornal ou o interior das residências de alguns personagens, com muitas mesas ao fundo do palco, puxando para um semicírculo, adaptação para o formato de palco italiano, já feita, anteriormente, em apresentações nas cidades de Campinas e Ribeirão Preto. Para a estreia nacional, no aprazível e bem emblemático Tucarena, em São Paulo, onde fez uma brilhante carreira, cumprindo uma extensa temporada de quatro meses, ele dispunha as referidas mesas ao redor da arena.

            Seu currículo é riquíssimo, incluindo um sem-número de prêmios – todos muito merecidos – e tantas indicações a outros. Incluído no corpo do detalhadíssimo “release” de “BOCA...”, enviado por STELLA PONTES (JSPONTES COMUNICAÇÃO), “Tornou-se um dos mais renomados diretores teatrais com reconhecimento internacional, sendo convidado a participar de Festivais nos EUA, Europa e América Latina. Com o Grupo Galpão (Romeu e Julieta), GABRIEL VILLELA foi convidado para uma temporada no Globe Theatre, em Londres, conquistando a crítica e o exigente público londrino. O espetáculo voltou a Londres, em 2012, para participar da Olimpíada Cultural, evento paralelo aos Jogos Olímpicos de 2012, em Londres”.












SINOPSE:

BOCA DE OURO (MALVINO SALVADOR) é um lendário bicheiro carioca, figura temida e megalomaníaca, que tem esse apelido, porque trocou todos os dentes sadios por uma dentadura de ouro.




Quando BOCA é assassinado, seu passado é vasculhado pelo repórter CAVEIRINHA (CHICO CARVALHO), que vai até a casa da ex-amante GUIGUI (LAVÍNIA PANNUNZIO), em busca de alguma revelação bombástica, que pudesse ser associada à morte do marginal, podendo render frutos concretos (maior venda do jornal). Queria saber de algum crime marcante, cometido pelo marginal. 

Lá, ouve a versão, ou melhor, as versões da ex-amante, que desanca o bicheiro ou o põe num pedestal de honra, de acordo com seu “estado emocional”.

Em primeiro lugar, logo de cara, ainda sem saber que BOCA estava morto, GUIGUI descreve-o como um cruel e vingativo sanguinário, um facínora, um cafajeste, que assassinou o marido de uma mulher, a qual ele ambicionava ter com amante, para se livrar dele e poder saciar seu desejo sexual. O tal marido era LELECO (CLÁUDIO FONTANA) e a mulher, CELESTE (MEL LISBOA). O suposto motivo teria sido uma ofensa do pobre infeliz homem, quando este fez, a BOCA, menção de sua origem, qual seja o fato de o poderoso bicheiro ter sido parido na pia de um imundo banheiro de uma rudimentar gafieira, o que o enlouquecia, a ponto de executar, sem dó nem piedade, de forma crudelíssima, quem o lembrasse de seu nascimento ou falasse mal de sua “santa” mãezinha.




Ao saber de seu assassinato, porém, GUIGUI se arrepende do que revelara ao repórter e muda o foco, passando a exaltar BOCA, como uma figura amorosa e um benfeitor. Reconhece-o como um matador, sim, mas “justo, nunca sem ter motivos para seus crimes hediondos”. Não perde tempo para fazer comentários críticos, negativos, ao atual marido, de quem BOCA a havia tomado e para o qual retornara, “por causa dos filhos”, após ter sido abandonada pelo bicheiro, trocada por uma nova “presa”. Nesta versão, GUIGUI acusa CELESTE, “uma esposa infiel”, amante de BOCA, de ter assassinado LELECO.  




Já no que seria o terceiro ato da peça, após o marido de GUIGUI, AGENOR (LEONARDO VENTURA), ofendido, ter feito as malas, para abandonar o “lar”, aquela volta a espinafrar (baixou NELSON RODRIGUES) o bicheiro, pois temia ser abandonada pelo marido. Ela põe em relevo a onipotência cruel do morto, acusando-o, inclusive, de feminicida.




É interessante ressaltar que, nas três versões relatadas por GUIGUI, o casal CELESTE e LELECO assume relevante importância, nos fatos, como “pivôs”, sempre relacionados, diretamente, ao assassinato de BOCA DE OURO.




Seria esta uma obra aberta?









            O original, escrito em 1959 foi representado, pela primeira vez, em 1960, tendo sido um grande fracasso, atribuído, principalmente, ao fato de o papel-título ter sido interpretado pelo grande diretor e ator Ziembinski, que, com seu marcante sotaque polonês, não conseguiu convencer ninguém, como um típico malandro de Madureira. Na versão do autor, a peça é dividida em três atos, condensados, nesta montagem, num só, com 110 minutos de duração, sendo que o tempo cronológico “não bate” com o psicológico; temos a impressão de que não dura nem uma hora, pois não sentimos o tempo passar e, subconscientemente, torcemos para que não passe mesmo. Comigo, foi assim e creio que com toda a plateia. Ainda sobre o tempo, este não é linear, na narrativa, com idas e vindas, em forma de “flashbacks”.

            Sábato Magaldi, um dos maiores nomes da crítica teatral brasileira e grande conhecedor da obra de NELSON RODRIGUES, estudou-a, profundamente - todas as suas peças -, e as catalogou em quatro categorias, de acordo com suas características temáticas: Peças Psicológicas; Peças Míticas; Tragédias Cariocas I, na qual “BOCA DE OURO” está incluída; e Tragédias Cariocas II.








            É interessante destacar, na estrutura do texto, que apenas dois fatos existem, de concreto, na peça, e que somente um, na primeira cena, é verdadeiramente explicitado, considerado real. Nesta, ocorre a ida do bicheiro a um dentista, para exigir, no lugar dos dentes perfeitos, uma dentadura de ouro. Digo “exigir”, porque o odontólogo não concordava com aquela aberração, tendo-se rendido, porém a executá-la, mediante uma polpuda quantia. O outro fato é a sua morte, sendo que o primeiro é o único realmente factual; o segundo fica por conta da imaginação e interpretação de cada espectador, já que as três diferentes versões são narradas pelo olhar de uma terceira pessoa, GUIGUI, que se deixa levar pela emoção e seus desvarios.

            Sobre o personagem, magnificamente interpretado por MALVINO SALVADOR, deve ser dito que era seu desejo ser enterrado num caixão também de ouro, como prova maior de sua onipotência e seu comportamento esdrúxulo, e havia uma crença, passada de boca a boca, de que, para a confecção do ataúde, BOCA utilizava as alianças, derretido o seu ouro, de todas as mulheres que passavam por sua alcova, por seu covil.

BOCA DE OURO, uma figura popular e lendária, temida e megalomaníaca, também era conhecido pela alcunha de Drácula de Madureira. GABRIEL VILLELA se valeu do apelido do protagonista, para fazer com que os personagens “assassinos” utilizem sangue cenográfico, nos pescoços de suas vítimas, lançando olhares de deboche para o público, bem anárquicos, fingindo morder-lhes essa parte do corpo, numa atitude quase antropofágica.

Sobre a fixação de BOCA, pela dentadura de ouro, ouso fazer uma analogia metafórica com um possível pensamento do “herói”. Os dentes naturais têm uma vida útil determinada; não são eternos. Já os de ouro são para sempre. Temos notícia, em outras tramas, de que personagens fazem pacto de sangue com forças do mal, para que estas lhes garantam vida eterna. Não poderia haver uma associação entre aquilo e isto? Além de ser uma forma de expor seu poderio, também não poderia haver uma relação de força, para ter o corpo fechado? Será que flutuei demais? Quem topar pode vir comigo, viajando neste balão.









Penso ser importante, para aguçar a curiosidade de quem está lendo este texto e pretende assistir à peça (Espero.), transcrever um trecho do já citado “release”, que me foi enviado: “Dentro das iconografias do subúrbio carioca, GABRIEL se utiliza da simbologia do candomblé e das mascaradas astecas, no espetáculo. A casa de CELESTE e LELECO traz muitas representações de orixás sincretizados. A figura de Iansã (GUILHERME BUENO) aparece, toda vez que uma cena de morte acontece - ela faz a contrarregragem das mortes. O Brasil retratado na cena: a política, as narrativas contraditórias, a libido, a festa da gafieira, o jogo do bicho, a fé e a música. Retratos de uma época que nos mostram que o Brasil pouco mudou, e que o dramaturgo, nascido em Pernambuco, em 1912, e radicado no Rio de Janeiro, nunca foi tão atual”.

NELSON RODRIGUES era um grande observador do comportamento humano, de onde extraía material para as suas peças. “BOCA DE OURO”, por exemplo, surgiu da fusão de duas ideias. A primeira inspiração foi um chofer de ônibus, da linha 115 – Laranjeiras / Estrada de Ferro, que gostava de exibir seus 27 dentes, todos de ouro maciço. O dramaturgo costumava pegar aquele coletivo, diariamente, para ir almoçar na casa da mãe. A segunda veio da fama de um personagem, muito contraditório, do submundo carioca, o bicheiro Arlindo Pimenta, que dominava a região da Leopoldina, morto em 1954, em combate com a polícia (Alguma relação com os dias de hoje?).

BOCA era um exemplo do típico malandro carioca, com muita ginga e poder de sedução, totalmente amoral e irresponsável, inconsequente e violento, além de outros atributos negativos, para cuja representação seria necessário um bom ator, que não permitisse que o personagem caísse na categoria do caricatural. A direção foi buscar, em MALVINO SALVADOR, esse profissional, ator talhado para o papel. Outros, de igual talento, poderiam, certamente, ocupar-lhe o posto, entretanto MALVINO entendeu, na íntegra, a proposta anárquica e carnavalesca de GABREIL VILLELA e compôs um personagem capaz de extrair risos, reações de raiva e, até mesmo, paradoxalmente, de piedade, por parte do espectador, tudo na dose certa. Ponto mais que positivo na peça.








Ah! Já ia me esquecendo que, morto o homem poderoso, findo seu reinado, desaparecido o seu significado, roubam-lhe a dentadura, atitude que pode ser decodificada como uma libertação ou uma vingança, vista por mais de um ângulo. 

Creio ser desnecessário falar mais de GABRIEL VILLELA, como diretor, nesta obra, e penso que já está na hora de celebrar seus méritos como cenógrafo e figurinista, na peça.

A cenografia já foi citada, no início destes comentários. Devem ser acrescentados os detalhes de uma poltrona, colocada no centro do palco, sobre um pequeno praticável circular, de madeira, giratório, servindo de cadeira do dentista e, ao mesmo tempo, de uma espécie de trono para um “rei”, além dos detalhes de objetos de decoração, tanto os que estão sobre as mesinhas como outros, muito necessários aos demais ambientes. Uma escada de abrir também é bem utilizada e apropriada em cena.

Os figurinos, todos bem estilizados, fogem, completamente, aos padrões de “normalidade” e ganham as cores, as formas e bordados, estes uma das marcas registradas dos trabalhos de GABRIEL, tudo executado com muito bom gosto e esmero, estendendo-se esses elogios aos acabamentos. São fantasias; não são roupas do dia a dia. Um detalhe: o figurino do BOCA vai se tornando mais sofisticado, mais rico, mais imponente, mais acrescido de elementos dourados e decorativos, à medida que a trama vai se desenvolvendo.

Uma montagem de GABRIEL VILLELA não precisa, do ponto de vista da plasticidade, de muita luz, para se destacar, entretanto WAGNER FREIRE, um dos melhores profissionais do ramo, criou uma iluminação, ao mesmo tempo, lúdica, onírica e funcional, privilegiando detalhes e criando belas imagens, com seu excelente desenho de luz.  






“BOCA DE OURO”, além do excelente protagonismo de MALVINO SALVADOR, conta com uma coadjuvacão de luxo, todos os atores com um excelente rendimento, com destaque para quatro, que são MEL LISBOA (CELESTE), LAVÍNIA PANNUNZIO (GUIGUI), CLAUDIO FONTANA (LELECO) e CHICO CARVALHO (CAVEIRINHA e MARIA LUÍSA). Os demais colegas de cena, também merecedores de aplausos, são LEONARDO VENTURA, CACÁ TOLEDO, GUILHERME BUENO, MARIANA ELISABETSKY e JONATAN HAROLD.












MEL vive seu melhor momento num palco, chamando a atenção para o fato de que a vi brilhar, mais de uma vez, nos últimos anos, principalmente em “Peer Gynt”. De todos os personagens da peça, orientados a impor, na sua interpretação, uma roupagem intencionalmente melodramática, exagerada, caricata mesmo, ela parece ser a que melhor explora essa orientação, o que provoca boas gargalhadas, no público, tornando, por vezes, mais leves certas situações que não se prestariam a isso. Uma brilhante atuação.









LAVÍNIA faz um belo trabalho, que lhe exige mudar o tom da voz e as máscaras faciais, de acordo com as versões, para a morte de BOCA, que vai revelando. Consegue, dependendo da necessidade e do que exige a cena, demonstrar detalhes de cinismo, pitadas do grotesco, tons do farsesco, nuances do burlesco, seguindo, bem de perto, o tom de interpretação de MEL, no que diz respeito à valorização do melodramático, sem poder fugir, intencionalmente – repito -, ao caricato. A falsidade é a tônica maior da personagem.






FONTANA compõe um excelente LELECO, mistura de “macho” e “covarde”, mais para este do que para aquele. No fundo, é um fraco, submisso e, principalmente, de caráter bastante duvidoso. O ator consegue chegar a isso com uma ótima atuação.









CHICO é, para mim, a cereja do bolo, um dos nossos melhores atores, tão pouco conhecido do público carioca, infelizmente, por atuar mais em São Paulo, mas ocupante de um lugar de destaque nas minhas preferências, pelo seu incomensurável potencial criativo. Em “BOCA...” ele faz dois personagens, totalmente opostos, em tudo, e desmonta um, para montar o outro, com uma agilidade, facilidade e uma total entrega... Seu CAVEIRINHA é sagaz, malandro, perspicaz, um perfeito representante do repórter rodruiguiano, encontrado em outras obras do autor, como já foi dito. Quando se traveste em MARIA LUÍSA, fica completamente irreconhecível, pândego. Sua postura corporal, de uma mulher (quase) fina e a voz, que imita a da jornalista Marília Gabriela, são dois pontos de destaque na interpretação da personagem. Confesso, publicamente, despudoradamente, a minha paixão pelo trabalho desse ator, já incorporada, em mim, desde outros trabalhos, como a sua incrível participação em “A Tempestade” e seu protagonista, em “Peer Gynt”.









Quero atribuir um destaque ao trabalho de MARIANA ELISABETSKY, que, muito bem acompanhada pelo piano de JONATAN HAROLD, discretamente, porém de forma marcante, atua como uma espécie de “lady crooner” da gafieira, com excelentes inserções, utilizando sua belíssima voz delicada, suave e afinada, interpretando 14 canções, que fazem parte da perfeita e eclética trilha sonora, de BABAYA, cuja relação aqui segue: “Cidade Maravilhosa” (André Filho), Vingança” (Lupicínio Rodrigues), “Ave Maria do Morro” (Herivelto Martins), “Lencinho Branco” (J. C. Filiberto e C. G. Peãzola, versão de Maugeri Neto), “A Noite do Meu Bem” (Dolores Duran), “Na Cadência do Samba” (Ataulfo Alves), “Ne Me Quittes Pas” (Jacques Brel), “Última Estrofe” (Orlando Silva), “Eu Dei” (Ary Barroso), “O Ouro e a Madeira” (Ederaldo Gentil), “Hino ao Amor” (Edith Piaf e M. Monnot), “Não Deixe o Samba Morrer” (Édson Conceição e Aloísio Silva), “Bang Bang - My Baby Shot Me Down” eDe Frente Pro Crime” (João Bosco). A maioria das canções remete a décadas passadas e algumas são do repertório da cantora Dalva de Oliveira, que tinha uma maneira ímpar de interpretar suas canções, aqui meio que imitada, creio que intencionalmente, por ELISABETSKY, o que é muito bom.









            Eu dou um passo para a frente e volto dois, para falar da direção de GABRIEL VILLELA, já que, ao me lembrar de um detalhe ou outro importante, do trabalho, não posso deixar de falar deles.

            Adoro, na peça, algumas soluções surgidas da criatividade do diretor, outra marca de seus trabalhos, como a utilização, alternada, dos espaços cênicos; a participação, como “voyeurs”, dos atores que não estão atuando, diretamente, nas cenas; a genial ideia de pôr dedais de metal, em todos os dedos dos atores, para a produção de sons que imitassem o bater nas teclas de uma máquina de escrever; a utilização de copos e taças, para fazer as vezes de telefone, como aqueles modelos antigos; a substituição de punhais e facas por grandes varas de bambu; a proposta, para todo o elenco, de uma interpretação melodramática, puxando para o caricato. Quanto ao último aspecto, só havia me limitado ao trabalho de duas atrizes.






            Um detalhe, na ficha técnica, me chamou a atenção: Espacialização Vocal e Antropologia da Voz, a cargo de FRANCESCA DELLA MONICA. Não a conheço, mas FRANCESCA deve ser, acredito, piamente, uma excelente profissional naquilo que faz, uma vez que, se não encontrei defeitos na montagem, seu trabalho também contribuiu para o quilate do espetáculo, entretanto devo ter faltado à aula em que ensinaram o que sejam Espacialização Vocal e Antropologia da Voz. É claro que só pode ser algo ligado a uma das principais ferramentas de trabalho do ator, que é a voz, entretanto gostaria de que alguém me explicasse o que sejam, exatamente, esses dois elementos, em que consiste tal trabalho, que a minha ignorância me impede de saber, sem eu precisar da ajuda do Tio Google (Preguiça...).














FICHA TÉCNICA:

Texto: Nelson Rodrigues
Direção, Cenografia e Figurinos: Gabriel Villela

Elenco: Malvino Salvador (Boca de Ouro), Mel Lisboa (Celeste), Cláudio Fontana (Leleco), Lavínia Pannunzio (Guigui), Leonardo Ventura (Agenor), Chico Carvalho (Caveirinha e Maria Luísa), Cacá Toledo, Guilherme Bueno, Mariana Elisabetsky e Jonatan Harold (ao piano).

Iluminação: Wagner Freire
Direção Musical e Preparação Vocal: Babaya
Espacialização Vocal e Antropologia da Voz: Francesca Della Monica
Diretores Assistentes: Ivan Andrade e Daniel Mazzarolo
Fotos: João Caldas
Produção Executiva: Luiz Alex Tasso
Direção de Produção: Cláudio Fontana
Realização: SESC Rio
Assessoria de Imprensa: JSPontes Comunicação – João Pontes e Stella Stephany
















SERVIÇO:

Temporada: de 19 de janeiro a 25 de fevereiro (com parada no período de carnaval, entre os dias 9 e 18 de fevereiro)
Local: Teatro SESC Ginástico
Endereço: Avenida Graça Aranha, 187 - Centro - Rio de Janeiro  
Telefone: (21) 2279-4027
Dias e Horários: Às 6ªs feiras e sábados, às 19h; domingo, às 18h
Valor dos Ingressos: R$30,00 (inteira), R$15,00 (meia entrada) e R$7,50 (associados SESC
Horário de Funcionamento da Bilheteria: De 3ª feira a domingo, das 13h às 20h
Capacidade: 513 lugares
Duração: 110 minutos
Classificação Etária: 14 anos
Gênero: Tragicomédia











            Já me estendi bastante nas minhas observações, restando-me, apenas, a alegria de saber que estamos no primeiro mês do ano e, já, de cara, nos deparamos com uma produção teatral da melhor qualidade, certamente, candidata a muitos prêmios e que espero que isso seja um prenúncio de um excelente ano teatral de 2018.

            Parabéns a todos os envolvidos no projeto e, em especial, à genialidade de GABRIEL VILLELA!

            E VAMOS AO TEATRO!!!

            OCUPEMOS TODAS AS SALAS DE ESPETÁCULO DO BRASIL!!!

            DIVULGUEMOS O TEATRO BRASILEIRO!!!



 








(FOTOS: JOÃO CALDAS.)























































































































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