sexta-feira, 3 de julho de 2015


JOÃO CABRAL

 

(POESIA E TEATRO:
UM CASAMENTO PERFEITO.)

 

 


 

                        Para comemorar dez anos de bons serviços prestados ao TEATRO BRASILEIRO, a COMPANHIA DE TEATRO ÍNTIMO traz, ao público, um olhar sobre a obra de um dos mais importantes escritores da língua portuguesa, JOÃO CABRAL DE MELO NETO, através de seus poemas.

            Sempre pesquisando outras linguagens, como o cinema, a literatura e, especificamente, a poesia, o grupo busca a intimidade em cena, através da emoção, da comunicação direta e do estímulo a todos os sentidos da plateia.  Já foram foco de seus excelentes trabalhos, individual ou coletivamente, nomes como Adélia Prado, Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, João Cabral de Melo Neto, Manoel de Barros, Manuel Bandeira, Mário Quintana e Vinícius de Morais; ou seja, a nata da poesia brasileira.  

 


 

Agora, é a vez de um solo de JOÃO CABRAL DE MELO NETO, primeiro brasileiro a ganhar o Prêmio Camões, concedido pelos governos de Brasil e Portugal.  Também foi diplomata e viveu em diversos países, mas sua obra nunca deixou de refletir a realidade brasileira e, em particular, a nordestina.  Além disso, sua vivência na Espanha, especialmente na Andaluzia, deixou marcas profundas em sua vida e em sua poesia.

Além da característica da Companhia, de procurar, sempre, uma maior aproximação entre palco e plateia, outro detalhe que marca o trabalho dos “íntimos” é o fato de os atores se expressarem em outras áreas, além da interpretação, como cenografia, iluminação, figurinos e produção, o que é ótimo, pois dá, ao grupo, um toque de “amadores”, não no sentido pejorativo como o termo costuma ser utilizado, mas, sim, na acepção de “aqueles que amam o que fazem” e, por isso mesmo, àquilo se dedicam, de corpo e alma.

 


(Da esquerda para a direita): Raphael Viana, Caetano O’Maihlan, Rafael Sieg e Gaby Haviaras.

 


 O elenco.

 

Em cena, os atores RAPHAEL VIANNA, GABY HAVIARAS, CAETANO O’MAIHLAN e RAFAEL SIEG, que também assina a ótima iluminação do espetáculo, sob a direção de RENATO FARIAS, levam o público a um breve mergulho na obra e na alma de JOÃO CABRAL, aproximando autor, atores e espectadores, em mais uma experiência teatral “íntima”, cujo principal objetivo é proporcionar um raro momento de comunhão entre os que fazem e os que assistem.

JOÃO CABRAL DE MELO NETO (Recife, 1920 – Rio de Janeiro, 1999) era de família pernambucana abastada.  Passou a infância entre Recife e os engenhos de cana, até se mudar para o Rio de Janeiro, no início dos anos 40, quando lançou, também, seu primeiro livro, “A Pedra do Sono” (1942).  Logo depois, ingressou na carreira diplomática, tendo ocupado cargos na Espanha, Portugal e África.  

Sua brilhante carreira literária lhe valeu uma cadeira na Academia Brasileira de Letras, em 1968, além de inúmeros prêmios nacionais e internacionais, como o Prêmio Luís de Camões, Prêmio Olavo Bilac, concedido pela ABL, e o Prêmio Jabuti, pelo conjunto de sua obra.

 


Caetano e “O Cão sem Plumas”.

 


Quatro num só.

 


Produzindo...  Criando...  Perpetuando...

 

Entre seus livros mais importantes, estão “O Cão sem Plumas” (1950), “Quaderna” (1960), “A Educação pela Pedra” (1966), “Morte e Vida Severina e Outros Poemas em Voz Alta” (1966) e “Sevilha Andando” (1989).

O nome do poeta está, sempre, associado à sua obra maior, “Morte e Vida Severina”, não só por sua beleza ímpar, mas, principalmente, por ter ganhado uma perfeita versão para o TEATRO.  Não é à toa que o livro em que o poema, de grandes proporções, está inserido se chama “Morte e Vida Severina e Outros Poemas em Voz Alta.  Sim, a poesia, que, regra geral, deve ser lida em silêncio, quando leva a assinatura de JOÃO CABRAL, se presta, e muito, a leituras em voz alta, muito em função da sonoridade de seus versos.

Então, por que não levar o poeta para o palco? 

Mas de que forma?  No formato de um recital, de um sarau?  É claro que não!  Estamos falando de JOÃO CABRAL, cuja obra se reveste de um tom dramático, ou dramatúrgico, que bem poderia render uma peça de TEATRO.  Pois foi o que, de forma magistral, fez RENATO FARIAS, selecionando poemas da vastíssima obra “cabraliana”, criando um excelente roteiro e assumindo a direção do espetáculo.

O resultado desse experimento pode ser visto, até o dia 13 de julho, de sábado a 2ª feira, às 20h, na Sede das Cias, e é, com certeza, um dos mais belos espetáculos da atual temporada.

 


Pernambuco: a cana.

 


O cemitério dos “severinos”?

 

Como, a partir de um determinado momento em sua vida, JOÃO CABRAL exerceu a função de diplomata, com muitas idas e vindas, achei muito interessante a ideia da direção de fazer uso, durante todo o espetáculo de malas, carregadas pelos quatro atores do elenco, dentro das quais há um pouco de seu Pernambuco (pedaços de cana-de-açúcar) e outras memórias e lembranças materializadas.

Basicamente, o diretor optou por fixar as ações em dois lugares, que marcaram, sobremaneira, a vida do poeta: Pernambuco e a Andaluzia; mais propriamente, o Sertão do Nordeste e Sevilha, este momento, sem dúvida, o mais encantador do espetáculo. 

São dois espaços, aparentemente, opostos em características físicas e culturais, mas que apresentam, na obra e no universo do poeta, semelhanças muito abrangentes.  O próprio JOÃO CABRAL, sobre isso, escreveu, utilizando a terceira pessoa, contrariando a função emotiva, em primeira pessoa, uma das características da poesia:

“Só duas coisas conseguiram / (des)feri-lo até a poesia: / o Pernambuco, de onde veio, / e o aonde foi, a Andaluzia. / Um o vacinou do falar rico / e deu-lhe a outra, fêmea e viva, / desafio demente: em verso / dar a ver Sertão e Sevilha.”

Um dos pontos altos deste espetáculo é o poema “Tecendo a Manhã”, dos mais conhecidos do repertório de JOÃO CABRAL e muito pouco entendido, pelo público em geral, se bem que poesia é muito mais para se sentir do que para se compreender.  No espetáculo, entretanto, os atores dizem o texto de uma forma tal, utilizando corretas pausas e inflexões, que é impossível não entender a mensagem nele contida e, menos ainda, deixar de se encantar com a cena.

Outro momento que causa grande emoção é relativo ao poema “Bailarina Andaluza”, dentro da sequência que aborda o período de JOÃO CABRAL, por treze anos, na Espanha, principalmente em Sevilha.  Enquanto CAETANO O’MAIHLAN dedilha, ora suave, ora agressivamente, as cordas de uma guitarra flamenca e RAFAEL SIEG marca o ritmo e os compassos num “cajón”, GABY HAVIARAS e RAPHAEL VIANA se encarregam de nos brindar com uma belíssima exibição de dança flamenca, na qual o toque de sensualidade alcançado pelo casal forma uma imagem difícil de desaparecer da nossa retina.  Um cena lindíssima, de fazer embaçar a visão.

 


As fotos dispensam legendas.



 


 


 

Muito oportuna é a utilização do trecho de um “cante a palo seco”, interpretado por DIEGO ZARCÓN.

O elenco, além do talento individual dos atores, demonstra uma total sintonia no trabalho de pesquisa e no resultado desta.  São quatro excelentes profissionais!

Simples, práticos e muito bonitos são os figurinos, de THIAGO MENDONÇA, assim como são perfeitamente adequados à proposta do espetáculo o cenário, de MELISSA PARO, e a iluminação, de RAFAEL SIEG.

Repito que “JOÃO CABRAL” é um dos mais belos espetáculos de TEATRO do semestre que, recentemente, se encerrou e ao qual tive o prazer de assistir, na primeira temporada, no Espaço SESC, e, agora, na segunda, na Sede das Cias, onde acho que a montagem ficou ainda melhor, em função das dimensões do espaço.  Ficou mais “íntimo”.

“JOÃO CABRAL” é um poema em forma de TEATRO!

As informações sobre o espetáculo e a Companhia de Teatro Íntimo me foram passadas pela excelente assessoria de imprensa; leia-se: ROBERTA RANGEL.

 

 

 


Poesia na veia.

 

 

 

 

 
FICHA TÉCNICA:
 
Texto: Poemas de João Cabral de Melo Neto
Roteiro e Direção: Renato Farias
 
Elenco (por ordem alfabética): Caetano O’Maihlan, Gaby Haviaras, Rafael Sieg e Raphael Viana.
 
Cenografia: Melissa Paro
Direção de Arte e Figurino: Thiago Mendonça
Iluminação: Rafael Sieg
Fotografia: Carol Beiriz
Desenho Gráfico: Tarcísio Lara Puiati
Produção: Gaby Haviaras
Flamenco: Eliane Carvalho
Intérprete “Cante A Palo Seco”: Diego Zarcón
Consultoria “Cajón”: Alejandro Alejo
Consultoria Guitarra Flamenca: Luciano Câmara
Liutaio da Guitarra: Edu Viola
Visagismo: Ezequiel Blanc
Assistência de Produção: Ana Clara Cobra e Guto Vilaverde
Assessoria de Imprensa: Roberta Rangel
Realização: Pela Noite Produções Artísticas e Companhia de Teatro Íntimo
 

         

                   

 


“JOÃO CABRAL” em quatro tempos.

 

 

 

 
SERVIÇO:
 
Local: Sede das Cias – Rua Manuel Carneiro, 12 – Lapa – Escadaria Selarón
Tel.: (21) 2137–1271
Temporada: Até 13 de julho
Dias e Horários: De sábado a segunda-feira, às 20h
Dura­ção: 60min
Clas­si­fi­ca­ção: LIVRE
Lota­ção: 60 lugares
Ingres­sos: R$30,00 (inteira) e R$15,00 (meia entrada, para estu­dan­tes, meno­res de 21 anos e mai­o­res de 65)
 

 

 

 

 

(FOTOS: CAROL BEIRIZ.)

Um comentário: