“NEM TODO
FILHO VINGA”
ou
(TEATRO DENÚNCIA,
DE URGÊNCIA.)
ou
(TEATRO VERDADE.)
ou
(TODO FILHO VINGARÁ.)
(Fila para assistir ao espetáculo.)
(Fila para assistir ao espetáculo.)
Fanático que sou por TEATRO e um “plagiador”
de Milton Nascimento e Fernando Brant (Não sei quem
escreveu a letra (provavelmente, Fernando.), quando digo
que “TODO CRÍTICO DE TEATRO TEM DE IR AONDE O ARTISTA ESTÁ”, venci meus
medos, bastante plausíveis, e aceitei o convite de CAMILA MOURA, cujo
trabalho de atriz conheci num magnífico “experimento” do
meu amigo Rodrigo Portella, em agosto do ano passado, em
plena pandemia, no OI Futuro Flamengo, “Meu Filho Só Anda
Um Pouco Mais Lento”, ocasião em que, numa crítica, elogiei seu
trabalho, e fui ao “Museu da Maré”, que, como o nome já diz, está
situado no Morro do Timbau, Complexo da Maré, uma favela
(Continuo me recusando a utilizar o “politicamente correto” “comunidade”,
por não ver nada de pejorativo no vocábulo “favela”), conhecida por
ser bastante “perigosa”, para os que não são de lá; não por causa
da grande maioria de seus moradores, trabalhadores e honestos. Pesquisei
bastante, ouvi relatos de amigos da classe teatral, que foram lá, para conhecer
o “Museu da Maré” e assistir à peça “NEM TODO FILHO
VINGA”, os quais me disseram que a localização geográfica do “Museu”
era de fácil acesso e que não se sentiram, em nenhum momento, ameaçados em sua
integridade física e moral. Então, armei-me de coragem, confesso, e por que não
ir? E lá fui eu, num sábado, dia 16 de abril de 2022, com um duplo
objetivo: conhecer o “Museu”, sobre o qual tinha ouvido maravilhas, com o que concordo, e
para assistir à peça, idem.
A
temporada já era para ter sido encerrada, porém, devido ao grande
sucesso, de público e de crítica, foi prorrogada, até o dia 17 de abril.
Fui, portanto, no penúltimo dia de apresentação. Ainda bem! Caso contrário,
deixaria de ter visto um excelente espetáculo, feito por amadores,
no duplo sentido da palavra: os que não são profissionais e amam o
TEATRO. Quando esta crítica estiver sendo publicada,
infelizmente, a temporada já terá terminado, a não ser que haja uma nova
prorrogação, pelo que muito torço. Estejam atentos, DEUSES DO TEATRO! É
bom dizer que a montagem estreou antes da pandemia de COVID-19,
chegando a fazer poucas sessões, mas, como aconteceu com todas as peças em
cartaz, num determinado momento, a partir do dia 13 de março de 2020,
uma fatídica “sexta-feira, 13”, teve de ser interrompida. Nossas
vidas pararam, tudo, ao nosso redor, parecia ter sido “congelado”.
Felizmente, agora, aos poucos, “o gelo vai começando a derreter”
e parece que uma nova vida ressurge, como a Fênix. “Já começamos a
notar folhinhas verdes brotando e pequeninas flores desabrochando”, EMBORA
A PANDEMIA NÃO TENHA AINDA ACABADO. “É preciso estar atento e forte!”
(Caetano Veloso.)
(Eu e João Pedro Bartholo, antes da entrada do público.)
É
a “COMPANHIA CRIA DO BECO” a responsável pela encenação. A montagem
foi a grande ganhadora do “9° Festival de Teatro Universitário (Festu)”,
em 2019, e é baseada na obra “Pai Contra Mãe”, um dos
excelentes contos do maior escritor em língua portuguesa, de todos os
tempos, na minha modesta opinião, Joaquim Maria MACHADO DE ASSIS
(1839-1908), cuja leitura recomendo com a maior urgência. Pode
ser encontrado, o conto, na internet.
SINOPSE:
Após ter passado para a Faculdade de Direito, da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), no Fundão, bem perto de
onde mora, MAICON (JEFFERSON MELO), um jovem negro e “cria”
da Favela da Maré, passa a confrontar os ideais de justiça
do Estado Brasileiro, diante dos inúmeros eventos de injustiça
que ele e seu grupo de amigos vivem diariamente.
Ao longo do seu primeiro ano letivo, MAICON sentirá, na pele, como essas políticas de precarização abalam todas as esferas da vida, chegando ao ponto de colocá-lo contra seu melhor amigo, CARLÃO (RAMIRES RODRIGUES).
O
elenco é formado por jovens universitários, negros e moradores do Complexo
de Favelas da Maré. É, deveras, interessante salientar que o título
da peça corresponde à última, e curta, frase do conto de MACHADO,
e foi isso que rendeu uma provocação/proposta, dirigida aos membros da “COMPANHIA
CRIA DO BECO”, feita por RENATA TAVARES, estudante de Artes Cênicas,
na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UNIRIO), professora,
no projeto “Entre Lugares Maré”, e quem assina a direção
do espetáculo, cujo objetivo é “mostrar a relação da universidade
com os favelados, falar sobre o embranquecimento do autor e abordar as
realidades vividas pelos jovens da favela”.
(Elenco e Diretora.)
(Elenco.)
(Elenco e a diretora, ao centro.)
(Equipe completa de produção)
Há um duplo sentido, no emprego do
verbo “vingar”, contido no texto. Ele é empregado, no conto,
com um sentido figurado de “lograr, obter êxito; vir a existir ou a
realizar-se”. Sem a menor
intenção de dar algum tipo de “spoiler”, afirmo que ele pode ser
aplicado, na peça, aos personagens MAICON e CARLÃO,
que escolheram caminhos diferentes, quando uma bifurcação surgiu à frente dos
dois, num determinado momento de suas vidas. Cada um seguiu seu caminho. Um “vingou”;
outro não. Mas, também, de certa forma, pode-se dizer que o que “vingou”
“só foi até a página 5”.
No
corpo do texto, cuja dramaturgia é assinada por PEDRO
EMANUEL, com colaboração da CIA. CRIA DO BECO, são tratados temas que
precisam, cada vez mais, ser trazidos à luz, e a fundo, como racismo, preconceito
social, falta de acesso a serviços e oportunidades, barreiras que
são enfrentadas, todos os dias, por milhões de brasileiros menos favorecidos e,
muito particularmente, e em mais elevada proporção, pelos jovens e moradores de
periferia e favelas cariocas e de todo o país. É uma triste e injustíssima
realidade que não pode ser varrida para debaixo do tapete; ao contrário, tem de
ser corrigida e eliminada de uma sociedade que pretende ser justa e igualitária
– ou deveria -, muito embora, com muita visão do que vemos acontecer, na
vida real, isso seja quase uma utopia. Mas muita coisa pode ser mudada. E
tem que ser, com urgência! E o primeiro passo, para isso, é “abrir os
olhos das pessoas”. O TEATRO está aqui para dar a sua grande
colaboração, a fim de que isso aconteça. Nunca devemos nos esquecer de que “o
TEATRO salva”. E como!!!
O protagonista do espetáculo, JEFFERSON MELO, como MAICON,
é o “vetor” maior de um cotidiano de um jovem favelado, em sua
essência, cheio de sonhos, ou ilusões, que “insiste em existir”,
em persistir na vida, no acesso à faculdade, à cidade e ao desejo, muito justo,
de ser um membro ativo, numa sociedade preconceituosa, infelizmente, excludente
e, por muitas vezes, cruel, no tratamento aos menos favorecidos. Segundo o ator,
a peça tem, como objetivo, tocar, sem medo nem qualquer pudor, da forma
mais contundente possível, aqueles que não conseguem enxergar a favela, os que
ignoram milhares, ou milhões, de vidas humanas que nelas habitam e que só
precisam ser vistas e respeitadas. E ter voz. É para provocar um
desconforto mesmo, ainda segundo o ator. Ao mesmo tempo, afirma JEFFERSON,
“Nossa intenção também é fazer com que os nossos amigos favelados se
reconheçam nas narrativas.”. Esse aspecto também é bastante
interessante, e importante, porque, se, de um lado, faz-se necessário, com
urgência, que a sociedade de fora da favela se modifique, também é mister que os
jovens favelados se multipliquem em muitos “maicons”, que nunca
esmoreçam e, ainda que a um preço bem alto, procurem seguir os caminhos do protagonista
e lutem por seus direitos, sonhos e ideais, sem jamais esquecer seus deveres.
Não sou nenhum apreciador do chamado “TEATRO interativo”,
entretanto, “NEM TODO FILHO VINGA” não poderia ter sido feito de outra forma.
Essa interação não se dá no sentido de agredir o público, como
muito se vê por aí, e que merece todo o meu desprezo e repúdio, mas sim, muito pelo
contrário, existe para agregar. A plateia se sente acolhida pelo Grupo
e, logo nos primeiros momentos da encenação, acaba se tornando “cúmplice”
de tudo o que eles pleiteiam, torna-se sua “parceira”, e sofre,
com eles, a cada novo obstáculo ou “porrada” que um deles toma.
Sim, porque, se reclamamos das “porradas” que a vida nos dá,
muito mais razão para reclamar delas, e não as aceitar, de jeito nenhum, sob qualquer alegação, têm todos os que fazem parte do universo de MAICON e
seus companheiros de cena.
A visão que nos chega, do dia a dia de uma favela, infelizmente, é a de um lugar onde, diariamente, só existem conflitos, tiroteios e muita violência. É claro que, infelizmente, não podemos ignorar essa triste realidade, para a qual a grande maioria dos seus moradores não colabora, mas uma das propostas da peça é mostrar o outro lado desse cotidiano: o humano, ou seja, uma favela que, à sua maneira, “se diverte, faz festa, ajuda uns aos outros e vive nessa pluralidade cultural”.
Vivi, naquele final de tarde início de noite, uma das experiências mais
enriquecedoras por que já passei, em 72 anos de vida, mais de meio
século dela destinado ao TEATRO, a começar por uma visita guiada ao “Museu
da Maré”, muito bem montado, com um acervo doado pelos moradores locais, e
muito bem administrado, tendo VANESSA GREFF como sua produtora cultural.
O “Museu” é de uma riqueza, não material, porém afetiva e histórica,
incomensurável. Muito agradeço à historiadora RENATA CARNEIRO, “cria”
da Maré, que lá trabalha, pelo carinho e atenção a mim dedicados,
mesmo fora de seu horário de trabalho e de sua função.
Quase à hora do início da peça, fomos, eu e meu sobrinho-neto João
Pedro Bartholo, estudante de TEATRO, na UNIRIO, o
qual me acompanhava, com o mesmo interesse e curiosidade que haviam tomado
conta de mim, conduzidos ao local onde se daria a encenação, um enorme
galpão, com uma excelente acústica natural, sem nenhum tratamento
tecnológico. Fomos privilegiados, porque pudemos testemunhar, a menos de dois
metros à nossa frente, a organização e a prática da tradicional “rodinha”,
que acontece antes de cada sessão de TEATRO.
Antes mesmo de o espetáculo iniciar, já nos sentíamos “em
casa”, começando a perceber uma atmosfera muito especial, quando olhávamos
ao nosso redor. As pessoas iam adentrando o espaço, pegando, cada uma, sua
própria cadeira, colocando-a de modo a formar um pequeno auditório, cerca de
sessenta ou setenta pessoas, no máximo, de frente para o que se esperaria ser o
“palco”, onde havia um cenário. Ali, o elenco canta
e dança algumas canções e acontecem algumas cenas, porém, logo, vem a grande
surpresa: todos, orientados pelo elenco, têm que pegar suas cadeiras e
posicioná-las em outros lugares, formando uma arena, uma vez que o elenco
traça, no chão, de cimento, o “mapa” do local onde se dão as
outras cenas. Uma experiência para lá de interessante e instigante. Uma grande
ideia da direção do espetáculo.
A encenação é de um dinamismo poucas vezes visto por mim,
numa montagem teatral, e obriga a plateia a se voltar para várias
direções, porque, mal termina uma cena, já começa outra, em outro ponto do espaço
cênico. Que direção de movimento! Parabéns, GABRIELA LUIZ,
também responsável pela preparação corporal, que muito exige dos atores!
É tudo tão intenso, tão frenético, que não conseguem chegar a um acordo o tempo
cronológico com o psicológico. São 60 minutos que parecem ser apenas 6.
O tempo “voa” e o espectador fica “colado” à
sua cadeira, acompanhando, sem piscar, o andamento das ações e o surgimento de
novos dramas e seu crescimento constante.
Todas as ações, à exceção das iniciais, acontecem num cenário
imaginário, indicado pelos traços de giz, no chão, onde os atores desenharam
as ruas, becos e os locais nos quais os personagens atuam. As primeiras
cenas, no entanto, se passam no lugar em que o público julga ser o “palco”
no qual toda a peça deveria ser encenada. O cenário, bastante
realista, mostra o interior de uma habitação da favela, um barraco, com
detalhes de fazer inveja aos melhores diretores de arte que conheço.
Algo bem parecido vi, há pouco tempo, na encenação de “Eles Não Usam
Black-Tie”, na Favela do Vidigal, com atores
do Grupo “Nós do Morro”. Quem assina a cenografia, assim
como a arte gráfica é FLÁVIO VIDAURRE, que merece muitos
aplausos.
Para aguçar a curiosidade dos espectadores, uma “festa”,
com cantos e danças, para a comemoração da entrada de MAICON na Faculdade
de Direito da UFRJ, se dá não à vista direta do público,
mas pode ser percebida por trás de dois grandes painéis, móveis e sobre rodas,
confeccionados com um material transparente, meio opaco. Essas duas espécies de
“tapadeiras” são deslizadas para os lados, quando, propriamente,
a peça começa, com o desenrolar dos diálogos.
Os figurinos, assinados por TIAGO RIBEIRO, são bastante “reais”,
intimistas, do dia a dia de pessoas bem simples, totalmente de acordo com os personagens.
A trilha sonora, cujo responsável não aparece, na ficha
técnica, com tal rubrica, especificamente, mas acredito estar incluída no
que, lá consta como direção musical, a cargo de RENATA TAVARES e
ZARATUSTRA, inclui canções bem populares, algumas “bregas”, o
“funk” e sons de tiros, reproduzindo muito, infelizmente,
do que seja morar numa favela.
Várias cabeças pensantes, reunidas, têm tudo para a produção de bons
frutos, como é a dramaturgia da peça, a qual, como já me referi,
no início desta crítica, coube a PEDRO EMANUEL, pesquisador,
dramaturgo e roteirista, mestre pelo “Programa de
Pós-Graduação em Artes da Cena da UFRJ”, onde pesquisou estratégias de
escrita sobre narrativas periféricas. Atualmente, entre outros afazeres,
trabalha como arte-educador no “Projeto Entre Lugares Maré”,
no “Museu da Maré”, ministrando oficinas de escrita e de
dramaturgia. Seu trabalho contou com a colaboração dos membros da CIA.
CRIA DO BECO. PEDRO não mora naquele local, porém, com sua formação
e a vivência de todos os outros, “crias” da Maré, “gestou”
um texto que “vingou” e deve ter fluído de uma forma bem
fácil e simples. A trajetória de MAICON e seus companheiros, os
conflitos e os “perrengues” por que passam, todos os dias, são
apresentados de uma forma muito natural, tendo sido utilizada uma linguagem bastante
espontânea, própria dos personagens, com direito ao uso reiterado de um código
quase “secreto”, uma linguagem meio cifrada, como é a intenção de
todos os tipos de gírias e jargões, em qualquer grupo social ou
profissional, como que para a preservação de uma cultura e manutenção de uma
identidade cultural própria. Tudo soa muito natural e, por esse motivo, mesmo
quem não conhece ou domina essa linguagem particular acompanha o
desenvolvimento da trama. Linguagem mais natural e diálogos mais “eloquentes”
e diretos, ágeis, seriam impossíveis. Excelente dramaturgia! Apenas a
título de curiosidade, “gíria”, em francês, é “argot”,
que significa, de uma forma geral, a “linguagem dos marginalizados”.
Entenda-se bem: os que vivem à margem da sociedade, fora da área
de sua percepção.
Desde pequeno, ouvia minha avó e minha mãe repetirem que “quem pariu
Mateus que o embale”. Entendia o significado daquilo, embora sempre
tivesse curiosidade de saber quem era esse tal de “Mateus”. E por
que me vali disso para introduzir este parágrafo? Para dizer que, se foi RENATA
TAVARES quem “pariu Mateus”, se foi ela quem deu o pontapé
inicial, quem fez a provocação e a sugestão da peça, cabia a ela “embalar”
o tal do “Mateus”. Aceita a provocação, RENATA tomou as
rédeas da direção da montagem e o fez com a maior competência,
bom gosto e garra, no que foi correspondida, “geral”, pelo Grupo.
Todas as soluções propostas pela diretora, como as que já citei até
agora, e todas as outras, funcionam muito bem, numa arena, e podem ser
adaptadas para um Teatro com configuração de “palco italiano”.
(A rodinha.)
Com as cenas espalhadas por todo o espaço cênico, que não é pequeno, era necessário um cuidado especial com a iluminação, que exigia certos detalhes, não complicados, porém que careciam de muita atenção, para que o resultado final fosse satisfatório. E isso foi possível, graças ao trabalho de JOÃO GIOIA, um experiente iluminador, cujo trabalho já conhecia, LUCAS DA SILVA e RAIMUNDO PEDRO.
Quanto ao elenco, tenho de me esforçar bastante, a fim de não ser
repetitivo e encontrar as palavras certas, para falar de cada um. Já começo por
dizer que todos estão preparados, tecnicamente, para pisar um palco, como
profissionais. Talvez isso bastasse para falar sobre o talento
desses jovens, que não podem, de jeito algum desistir de voos mais altos e
ousados.
Do elenco, só conhecia o trabalho
de CAMILA MOURA, como já tive a oportunidade de dizer lá em cima. Não
foi à toa, ou por nada, que um dos maiores diretores de TEATRO do Brasil,
Rodrigo Portella, vendo-a atuar, convidou-a para um trabalho profissional
na montagem de um projeto, no OI Futuro Flamengo, um “experimento”
que misturava linguagens e que, para mim, foi um grande presente que recebi,
durante a pandemia. CAMILA mereceu um elogio de minha parte, por sua
atuação, ao lado de gente muito experiente, como Simone Mazzer, Felipe
Frazão, Elisa Lucinda, Maria Esmeralda Forte,
Verônica Rocha, Antônio Pitanga, Enrique Diaz,
Leandro Santanna e Gabriel Hypólito. Era um
trabalho filmado e projetado em 35 telas de TV. Ali, ela já me
impressionou bastante, mas eu estava ansioso por vê-la atuando ao vivo. E
quando isso aconteceu, em “NEM TODO FILHO VINGA”, CAMILA, que interpreta
a jovem ELLEN, prima de MAICON, não só ratificou o meu pensamento
acerca de seu potencial de atriz, como o superou.
Tão ansioso por ver o trabalho de CAMILA
eu estava para conhecer JEFFERSON MELLO e sua atuação, elogiadíssima por
todos os amigos da classe teatral que já o haviam visto, na peça. Num
caso como esse, a pessoa – eu - cria uma expectativa e só espera que ela
seja correspondida. Sim, ela o foi. E muito além do que eu esperava. Que ator “formidável”!
(Como diria Nelson Rodrigues.) Não sei de onde ele tira tanta
força dramática para emprestá-la ao seu MAICON. Numa das cenas em que o personagem
discute, seriamente, com seu melhor amigo, realizada na minha frente, a menos
de um metro de distância, fui às nuvens, totalmente encantado com sua máscara
facial, com o tom da sua voz, sua postura corporal, com a verdade estampada nos
seus olhos, sua "visceralidade". Para qualquer diretor, afirmo que é um luxo e a certeza de
um grande acerto ter JEFFERSON MELO no seu elenco. Se eu fosse
formar um agora, um papel seria destinado a ele.
MAICON consegue ascender,
socialmente, ao ingressar no curso de Direito da UFRJ,
considerado um dos mais elitistas no mundo acadêmico? De jeito nenhum! Logo nos
primeiros dias de aula, ele sofre um choque, que o leva a vivenciar uma
sensação de não pertencimento à turma, de não acolhimento por todos da
faculdade, de falta de alinhamento e identificação com seus colegas de turma e
professores, "crias" de outra realidade social, todos devidamente "vingados". Ele, numa atitude, talvez,
de autoproteção, envergonhado de sua origem,
chega a mentir, dizendo morar num bairro próximo à sua favela, mas não nela.
Ele trava uma luta interior, com ele mesmo, para se assumir como “um
estranho no ninho”. E isso o consome.
Outro que me causou a melhor impressão
foi RAMIRES RODRIGUES, que interpreta CARLÃO, o melhor amigo, de
infância, do protagonista. RAMIRES também, nas cenas em que é
mais exigido, responde à altura e constrói um personagem que assume uma
escolha, porém, quando questionado pelo amigo, por vezes, demonstra uma certa
fraqueza e ensaia um arrependimento, que não dura muito, uma vez que seu destino
parece “ter sido traçado na maternidade”. Ótimo ator!
ANDERSON OLI (WALLACE), NATÁLIA BRAMBILA (CLÁUDIA) e ZARATUSTRA (DIGÃO) são os outros três amigos que dividem com MAICON, CARLÃO e ELLEN o palco e, consequentemente, vivem a mesma realidade que os outros. O trio também não deixa a desejar. Todos fazem trabalhos dignos de muitos aplausos. Um elenco homogêneo, sem a menor sombra de dúvidas.
O clímax da narrativa se dá no momento em que CLÁUDIA
revela a MAICON, seu namorado, que está grávida, e cada um que me lê já vai
deduzindo o que pode acontecer, numa situação como essa, dentro daquela
realidade de vida. É o conflito sobre realizar ou não o aborto; é o fator falta
de dinheiro, para a prática do procedimento; é a radical opinião de ELLEN,
por sua opção religiosa; é o dilema em aceitar, ou não, a ajuda de um
traficante, para “se livrar de um problema”; é o impasse sobre se
candidatar a receber uma quantia, como recompensa, para “entregar um
traficante”, que não é “qualquer um”...
Mais do que isso julgo ser desnecessário
dizer, até mesmo para servir de incentivo, a todos os que me leem, a que
procurem, numa possibilidade de sua volta ao cartaz, assistir à peça,
mas, mesmo sabendo que não devia, não posso me furtar o desejo de acrescentar
que, ao final da encenação, cada personagem, numa belíssima
atitude, “livra-se” de seu personagem e, em
posicionamentos estratégicos, um a um, se apresenta, civilmente, como
CIDADÃOS, revelando seus verdadeiros nomes, o nome do lugar onde moram e a
idade, que, para eles, corresponde ao tempo em que conseguiram, até aquele
momento resitir e sobreviver, diante de tanta injustiça a que são submetidos no
seu dia a dia.
Dramaturgia: Pedro Emanuel, com colaboração da Cia. Cria do Beco
Encenação: Renata Tavares
Direção Musical: Renata Tavares e Zaratustra
Preparação Corporal e Direção de Movimento:
Gabriela Luiz
Cenografia e Arte Gráfica: Flávio Vidaurre
Assistente de Cenografia: Rafael Rougues
Figurino: Tiago Ribeiro
Assistente de Figurino: Lucas de Souza
Equipe de Iluminação: João Gioia, Lucas da Silva e
Raimundo Pedro
Operador de Som: Edson Martins
Elenco (por ordem alfabética): ANDERSON OLI, CAMILA
MOURA, JEFFERSON MELO, NATÁLIA BRAMBILA, RAMIRES RODRIGUES, YURI DOMINGUES
(SUB) e ZARATUSTRA
Assessoria de Imprensa: Ana Linhares e Isabel
Ludgero
Fotografia:
Thiago dos Santos
Produção: Cia.
Cria do Beco
Assistente de
Produção: Sheilla Cintra
Produção e
Produção Executiva: Vanessa Gref
“NEM TODO FILHO VINGA”, uma
excelente peça de TEATRO, não foi pensada nem produzida como uma mera
intenção de entretenimento. O espetáculo passa muito distante disso, do
outro lado da Avenida Brasil, ao longo da qual, e em suas proximidades,
está situado o Complexo de Favelas da Maré. A peça é, mais que um convite ou sugestão, uma intimação,
para que possamos enxergar a realidade daquela gente sofrida e injustiçada, que
só conhecemos pelas mídias, e iniciar uma urgente e necessária reflexão acerca
das causas do “status quo” daqueles personagens, os quais,
no fundo, no fundo, são reais, e perceber que essas causas não estão tão
distantes assim de nós, no tempo (Em que ano, mesmo, foi "extinta a
escravidão", e em que condições?) e tomarmos uma posição quanto a se
engajar na luta, ao lado deles, os mais “fracos”, e fazer de tudo
para fortalecê-los e tratá-los de igual para igual. É um dever de todo
cidadão fazer isso.
FOTOS (OFICIAIS):
THIAGO DOS SANTOS
e
GILBERTO BARTHOLO
(PARTICULARES)
GALERIA PARTICULAR:
(FOTOS: JOÃO PEDRO BARTHOLO.)
(Com João Pedro Bartholo.)
(Com João Pedro Bartholo.)
(Com Jefferson Melo.)
(Com Camila Moura.)
(O agradecimenro da diretora, RENATA TAVARES.)
E VAMOS AO TEATRO,
COM TODOS OS
CUIDADOS!!!
OCUPEMOS TODAS AS SALAS
DE ESPETÁCULO
DO BRASIL,
COM TODOS OS
CUIDADOS!!!
A ARTE EDUCA E
CONSTRÓI, SEMPRE!!!
RESISTAMOS, SEMPRE
MAIS!!!
COMPARTILHEM ESTE
TEXTO,
PARA QUE, JUNTOS,
POSSAMOS DIVULGAR
O QUE HÁ DE MELHOR NO
TEATRO BRASILEIRO!!!
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