NA COXIA, COM...
... AMANDA ACOSTA.
(Amanda Acosta - Foto: João Caldas.)
A entrevistada de hoje é uma das mais completas atrizes
do TEATRO BRASILEIRO, além de ser uma figura humana rara, nos dias de
hoje; extremamente educada, simpática, gentil, generosa, empática, amiga dos
seus amigos e mais uma penca de outras qualidades.
Embora ela resida em São Paulo e eu, no Rio, estamos,
sempre que possível, mantendo um bom contato, com o auxílio da tecnologia, e,
quando nos encontramos, presencialmente, aqui ou lá, é uma alegria só, porque é
muito bom ser amigo de AMANDA ACOSTA, além de um grande privilégio, e
conversar com ela, não só sobre TEATRO, como também acerca das coisas da
vida, fora do palco. Infelizmente, são bem raros esses momentos, pelos mais de
400km que nos separam e pelos ritmos de nossas vidas e seus rumos diferentes,
mas eu os aproveito até a última gota.
AMANDA iniciou-se, na vida artística, muito cedo, criança
ainda, via música, mas é como atriz, ou melhor “cantriz”, que ela
é mais conhecida, tornando-se uma das mais requisitadas pelos diretores e
produtores de TEATRO MUSICAL.
Uma pequena digressão, para falar do vocábulo “cantriz”,
empregado no parágrafo anterior, termo de que gosto muito e acho bastante significativo, motivo pelo qual dele faço
uso com bastante frequência: trata-se de um “neologismo” (criação
nova no vocabulário de uma língua), que define as “atrizes que cantam
ou as cantoras que atuam”. Não se tem certeza de quem o cunhou, porém
sua origem é atribuída ao grupo “As Frenéticas”, que se
autointitulavam “cantrizes”, desde a década de 70, muito
embora seja empregado por poucas pessoas, fora do meio artístico, do universo
teatral, e, só nas duas últimas décadas, venha aparecendo com maior frequência.
O
TEATRO MUSICAL exige, do ator ou atriz, que, além de representar, cante
muito bem, de preferência, e dance, da mesma forma, embora haja quem “engane
direitinho” nesses dois quesitos. AMANDA domina os três “fazeres”
com maestria, destacando-se na interpretação e no canto.
Ela consegue construir suas personagens com incrível
perfeição e canta divinamente, com uma afinação absolutamente correta,
atingindo notas altíssimas, de uma forma cristalina, nas suas emissões vocais.
Ainda que suas primeiras experiências artísticas tenham
sido no campo da música, como já disse, há quem não saiba acerca de seu
passado como cantora, entretanto, quando o assunto é TEATRO MUSICAL, não
há, entre os que apreciam o gênero, quem não a
conheça, e seu nome é uma unanimidade, como sinônimo de “grande
atriz de musicais”.
Por conta do TEATRO MUSICAL, AMANDA já
recebeu dezenas de indicações aos mais importantes prêmios de TEATRO e
conquistou, merecidamente, muitos deles, principalmente nos últimos anos, por
conta de seus três mais recentes trabalhos (“Bibi – Uma Vida Em Musical”,
“Carmen, A Pequena Grande Notável” e “As Cangaceiras,
Guerreiras do Sertão”). Ela é um “talismã”. Qualquer
espetáculo que traga seu nome na ficha técnica está fadado ao sucesso. E
por conta de quê? De um talento gigantesco, que não sei como cabe numa pessoa
de estatura baixa e compleição física tão frágil e delicada.
Haverá, nesta entrevista, uma pergunta ou outra que, na
íntegra ou sofrendo algumas adaptações, já foram feitas em entrevistas
anteriores, a outros entrevistados, mas são necessárias.
É
com muita honra e orgulho que vamos “bater um papo” com a queridíssima AMANDA
ACOSTA.
(Amanda Acosta - Foto: João Caldas.)
1) O TEATRO ME REPRESENTA:
AMANDA, já começo por lhe pedir desculpas, se o nível das perguntas não
estiver à sua altura, mas eu não tenho formação em jornalismo. Minha “praia”,
como você sabe, é o TEATRO, e é como crítico, jurado de prêmios e, antes
de tudo, fã, absolutamente consciente, do seu trabalho, e amigo, que me
proponho a lhe fazer alguns questionamentos, sobre a sua carreira, começando por querer saber desde
quando você foi “mordida pelo bichinho das artes” e se, desde criança, tinha alguma pretensão de se tornar uma profissional, e bem sucedida, na
música.
AMANDA ACOSTA: Um
prazer esta troca de experiências de arte, de vida! Costumo dizer que minha
profissão me escolheu antes de que eu a tivesse escolhido. O quintal de casa
era meu palco. Cantava, dançava, criava histórias. Sempre que meus primos,
primas, tias e tios iam em casa, eu fazia uma apresentação para eles. A minha
primeira apresentação para o público foi com quatro anos e meio.
(Foto: Leekyung Kim.)
2) OTMR:
Fale, sucintamente, da carreira de cantora, especificamente. Trace a trajetória
da AMANDA, unicamente como cantora, até as primeiras experiências no TEATRO.
AA:
Minha primeira apresentação foi no Raul Gil, cantando, ao vivo, “Ursinho
Pimpão” do “Balão Mágico”. Eu tinha quatro anos e meio.
Errei a segunda parte da música e comecei a chorar. O perfeccionismo vem desde
o útero maternos! (RISOS.) Depois dessa apresentação, não parei mais.
Participei de outros programas de calouros da época, dublando “On My On”,
da Nikka Costa. Depois, o grupo “Amanda e as Netinhas”,
formado por mim, minhas duas irmãs e minhas duas primas. Netinhas vem do
nosso sobrenome, Neto. Fazíamos “show”, em São Paulo, na
capital e no interior. No “show”, dublávamos algumas músicas,
como “On My Own”, da Nikka Costa, “Sweet
Nothin’s”, da Brenda Lee, “Datemi un Martello”,
da Rita Pavone... E, também, cantávamos, ao vivo, algumas músicas
que foram compostas para o grupo. Era a família, viajando, para cima e para
baixo, na Kombi do meu pai, para fazer os “shows”. Gravamos duas
músicas inéditas e gravei o tema de um programa infantil, na rádio USP, “Quintal
Encantado”, que era apresentado por José Damião. Depois,
entrei no grupo “Do Ré Mi”, no qual fiquei um ano, com um disco
gravado. Eu era muito fã do “Trem da Alegria”, e meu sonho era
fazer parte do grupo. Abriram testes, para escolher o novo integrante e eu fiz.
A princípio, não entrei. Depois de um ano, eles me chamaram e realizei meu
sonho. Entrei para o grupo, que eu amava, e com o qual me identificava! A
música, o TEATRO e a dança sempre estiveram presentes na minha
trajetória. Eles se misturam.
(Amanda Acosta - aos 9 anos, no "Xou da Xuxa").
Foto: Origem desconhecida.)
3) OTMR:
Um dia, você foi, novamente, mordida por um “bichinho”. Dessa vez,
especificamente, o do TEATRO. Quando aconteceu isso? Quando descobriu
que, também, gostava de representar e sabia fazê-lo; e muito bem?
AA: Foi
uma coisa natural. Sempre representava, cantando, dançando, proseando. Nos “shows”
do “Trem...”, sempre havia cenas entre as músicas. A primeira
peça que fiz foi o musical “O Mágico de Oz”, no Teatro Casa
Grande, no Rio, com direção de Francis Mayer, em 1993. Eu
tinha quinze anos. Lembro-me dos ensaios, das apresentações. O elenco era
incrível: Dhu Moraes, Bruno Garcia, Charles
Pavarenti e Vinícius Mane. Foi maravilhoso conviver,
aprender com todos esses atores, que tanto admiro e respeito, com o Francis,
com o diretor musical. Amava fazer o espetáculo. Voltei para São Paulo e fiz a
primeira peça, na minha cidade, aos dezoito anos, “No Reino das Águas
Claras”, com direção de Milton Neves, produção de Cíntia
Abravanel. Eu interpretava a Narizinho.
(Estreia como atriz de TEATRO, aos 15 anos de idade
- Foto: Marcos Viana - gentilmente cedida por Francis Mayer.)
4) OTMR:
Você fez muito TEATRO amador, antes de se profissionalizar? Fale-nos um
pouco sobre essa experiência, caso ela tenha acontecido na sua vida.
AA:
Frequentei muito o “Sarau dos Charles”, antes de fazer minha
primeira peça em São Paulo. Apresentei um esquete de “Gota D’Água”,
nesse sarau e em outros lugares. E fiz uma peça de rua.
(Foto: Divulgação.)
5) OTMR:
Como cantora, você teve alguma formação acadêmica? Estudou canto? E, como
atriz, por onde passou como “aluna”?
AA:
Não. Minha formação vem da prática e do encontro com professores de canto, que
tive até agora. Fiz aula de canto lírico e popular, com professores
maravilhosos. Com o TEATRO, o mesmo caminho. Para mim, cada espetáculo é
um curso de TEATRO. Aprendo com todos. Temos aulas a cada ensaio. Fiz
alguns cursos de TEATRO: um ano de Tablado (RJ); Curso
de Teatro Pathernon (SP); Núcleo Experimental de Artes Cênicas do
Teatro do SESI (SP); Formação de Atores do CPC-UMES,
coordenado por Denoy de Oliveira (SP). E mais algumas oficinas.
(Foto: Divulgação.)
6) OTMR:
Como a família da “AMANDINHA” se comportava, diante da vontade da menina
em ser artista? Como cantora? Como atriz?
AA: Sou
muito grata aos meus pais, por terem tido a sensibilidade e a escuta da
necessidade da minha alma. Sempre me apoiaram e me ajudaram a trilhar o meu
caminho. Respeitaram a minha vontade. Nada foi imposto por eles, e eles nunca
me tiraram da realidade. Sou da zona leste, Itaquera, e nunca deixei de brincar
com meus amigos, descalça, na rua, por estar no grupo mais famoso do Brasil.
Devo isso a eles, os valores reais da vida.
(No "Trem da Alegria" - Divulgação.)
7) OTMR:
Gostaria de que nos falasse um pouco de sua experiência na TV, desde a primeira
até a última participação. E por que não “frequenta” mais a telinha?
AA:
Minha primeira apresentação, como já disse, foi no programa do Raul Gil,
aos quatro anos e meio. Depois, foram os comerciais, apresentações em todos os
programas de TV, com os grupos de que fiz parte. A primeira novela, aos quatorze
anos: “O Mapa da Mina”, (Rede Globo/1993), de Cassiano
Gabus Mendes. Personagem: Eva. Direção: Paulo
Ubiratan. “Ô Coitado” (SBT/2000). Personagem: Tábata.
Direção: Rodrigo Campos. Projeto: “Senta, Que Lá Vem
Comédia”, em 2005 (Teleteatro produzido e veiculado pela TV
Cultura), nas peças “Caiu o Ministério” (2005). Texto: França Jr. Personagem: Beatriz. Direção: Emilio Di Biasi; “O
Primo da Califórnia”. Texto: Joaquim Manoel de Macedo.
Personagem: Beatriz. Direção: Silnei Ciqueira. E “Defeito
De Família”. Texto: França Jr.. Personagem: Josefina.
Direção: John Hebert. Fui, também, apresentadora do programa “Clipearte
TV Cultura”, de agosto de 2005 a agosto de 2006, com direção de Maurício
Valim. Apresentadora do programa
“Imagem Do Som Tv Cultura”, em 2006. Participei do programa
“Direções”, III episódio: “Unidos do
Livramento”, de Renata Pallottini, baseado na obra de Machado
de Assis, com direção de Maucir Campanholi, na TV Cultura,
em 2009. Trabalhei como apresentadora e cantora no programa “Inglês
com Música”, também na TV Cultura. Novela “Chiquititas”,
no SBT (2013). Personagem: Letícia. Direção
geral: Reynaldo Boury.
8) OTMR: Você também já teve sua passagem pela telona. O cinema a fascina tanto quanto o TEATRO e por que não atua mais em filmes?
AA: Fascina,
e muito! São linguagens diferentes; o que importa é a história ser bem contada.
No TEATRO, os atores podem fortalecer ou enfraquecer a história; no
cinema, o diretor e o editor podem fortalecer ou enfraquecer a história. São
linguagens diferentes. Quero contar boas histórias em qualquer meio de comunicação.
Desejo muito fazer mais cinema e TV. Mas não há nada como estar no palco, com
todas as conexões com o público, em potência máxima, no aqui e agora. No TEATRO,
acontece uma alquimia energética, por ser de carne e osso.
9) OTMR:
O Brasil não tem uma tradição de produzir filmes musicais. São raros os que
existem, e muitos de qualidade duvidosa. Você acha que não há mercado para esse
nicho, por aqui, ou seria outra a causa disso?
AA:
Acho que são vários os fatores que dificultam a produção de filmes musicais. O
primeiro é a falta de investimento no cinema. E a falta de bons roteiros do
gênero. Acho que, se houvesse incentivo financeiro, para a criação de filmes
musicais, iriam surgir belos roteiros, dentro da nossa linguagem de filme
musical, sem querer imitar os filmes americanos. Talentos não faltam, no nosso
país, para realizar belos filmes musicais!
10) OTMR:
São três mídias totalmente diferentes, em termos de tecnologia e trabalho de
interpretação, para o ator – o TEATRO, o cinema e a televisão -, todos
sabemos. Parece-me que você se sente mais confortável pisando as tábuas do que
num “set” de filmagem ou num estúdio. Estou certo nessa minha
ilação? Em caso de resposta afirmativa, por que essa preferência?
AA:
O TEATRO me chama. Posso dizer que ele está no controle da minha vida. E
eu estou a serviço dele. Mas me sinto à vontade em outras mídias. São
linguagens diferentes. Cada uma traz um aprendizado e uma forma diferente de
estar com o público. Mas sempre estamos com e para o público. No TEATRO,
temos a resposta imediata da plateia, é contato de primeiro grau. Contamos a
mesma história todos os dias, e todos os dias são diferentes. E, no último dia
de espetáculo, a gente ainda está descobrindo novos artifícios da personagem,
para dar mais emoção para alguma fala ou gesto, que chegue ainda mais na alma
do espectador. O TEATRO é vivo.
11) OTMR:
Se, sob tortura e ameaça de morte (Momento descontração. RISOS meus.),
você tivesse de optar por seguir, na vida artística, pelo caminho da música ou
do TEATRO, por qual alternativa dessa bifurcação da estrada você
continuaria a caminhada? (Acho que já sei qual será a resposta.) Por
quê?
AA:
Ah! Difícil... Mas eu digo: o TEATRO, porque, nele, posso ter a música,
o canto e tudo.
12) OTMR:
A carreira artística, iniciada muito precocemente, aos 4 anos e meio de
idade, prejudicou, de alguma forma, a sua infância e a sua atividade
escolar? Como conciliava as agendas? A propósito, já na idade de se tornar
universitária, chegou a ingressar numa faculdade e a se formar em outra
profissão, via ensino superior?
AA:
As escolas onde estudei sempre compreenderam a minha realidade e me apoiaram como
puderam. Quando perdia uma prova, podia fazê-la em outro dia. Sempre copiava as
matérias que perdia. Era um esforço a mais, claro, mas deu tudo certo. E havia
a preocupação dos produtores do grupo com os nossos estudos. Não ingressei em
nenhuma faculdade. Minha faculdade está na prática, no aprofundamento dos
estudos de cada prática.
(Fazendo comercial.)
13) OTMR:
Não me lembro do programa nem se era transmitido para o Rio de Janeiro: “Clipearte”.
Já sabendo quando você o apresentou, em 2005/2006, e em que emissora, TV
Cultura, gostaria de saber qual era o formato desse programa?
AA:
Ele tinha a direção de Maurício Valim. Eu apresentava clipes de
cantoras/cantores e bandas brasileiras, valorizando os nossos grandes artistas!
(Transição. Fotos: autores desconhecidos.)
14) OTMR:
Ainda na TV – esse eu vi várias vezes e ainda vejo, de vez em quando, programas
bem antigos, que são reapresentados –, de 2010 a 2012, você dividiu a
telinha com a professora Marisa Leite de Barros, apresentando um
programa muito interessante, que se propunha, de modo agradável e, até mesmo,
bastante lúdico, a ensinar inglês, por meio da música. A professora se fixava
numa canção, de interesse dos jovens, numa pequena plateia, e utilizava a sua
letra para ensinar o idioma. Você interagia com o público e fazia o que mais me
interessava, no programa, que era cantar aquela canção escolhida para a aula.
Fale um pouco sobre essa experiência.
AA:
Sou completamente apaixonada pelo programa e por todos os profissionais
incríveis que fizeram o “Inglês com Música” ser este primor de
programa! Muito amor e dedicação de TODOS! Marisa Leite de Barros
é a minha mulher colosso! Gênia! Foi ela quem inventou o “Inglês com
Música”, há mais de quarenta anos. Como era bom estar com a plateia
cheia de alunos e professores, aprendendo e se divertindo, assim como os
telespectadores em suas casas. Quantas mensagens lindas recebemos do público.
Era uma grande diversão e desafiador. A banda sempre com músicos de excelência.
Nós ensaiávamos um dia, durante duas horas, e, às vezes, no dia da gravação, e
fazíamos ao vivo, sempre, gravando duas vezes a mesma música. A qualidade do
som, da execução, de tudo sempre perfeito. Assisto a alguns programas de vez em
quando e fico sempre encantada, de boca aberta com a qualidade do som, da
imagem, do roteiro, da direção, da edição, da capitação de imagem e som, a
sintonia absurda de amor e cumplicidade entre mim e Marisa;
figurino, cabelo, maquiagem... com TUDO! O que me emociona é ver, nos
vídeos, os alunos e os professores cantando e dançando a música do dia. Numa
alegria e numa entrega linda de sentir!
(Divulgação - TV Cultura.)
(Divulgação - TV Cultura.)
(Divulgação - TV Cultura.)
15) OTMR:
Infelizmente, não tive a oportunidade de assistir a um “show”
musical que você fez, chamado “Alô, Alô, Theatro Musical Brazileiro”,
em 2017, no qual jogava em várias posições, demonstrando grande
versatilidade: dividia o roteiro e a direção com o querido Kleber
Montanheiro, atuava e, ainda, dividia a produção. Praticamente, 50%
você e 50% o Kleber, que, também assinava o figurino e a
iluminação. O espetáculo, pelo que apurei, traçava uma “viagem”,
começando em 1890 e chegando a 2016, contando a evolução do TEATRO
MUSICAL BRASILEIRO. Como era a estrutura desse “show” e como
foi a receptividade do público? Você pretende, em algum momento, reeditá-lo ou
fazer outro “show” musical diferente?
AA: O
espetáculo traz pérolas do nosso cancioneiro, tais como “O Mugunzá” (1892),
de F. Carvalho; “Corta-Jaca” (1904), de Chiquinha
Gonzaga; “No Rancho Fundo” (1930), de Ary
Barroso e Lamartine Babo; “Basta Um Dia”, de Chico
Buarque (1975) e outras dez músicas inesquecíveis, que evocam
nossa história, até os dias atuais. O “show” é entremeado de
breves relatos e curiosidades, que envolvem o período das composições,
evidenciando o contexto em que foram criadas. “Alô, Alô Theatro Musical Brazileiro”
resgata, assim, nossa história teatral e musical, década a década. O “show”
nasceu da necessidade de contar e cantar a nossa história teatral, musical,
social, enaltecendo, assim, alguns dos grandes e geniais compositores, atores,
cantores, dramaturgos de ontem e de hoje, tão originais, genuínos e tão
brasileiros. Uma das nossas maiores riquezas, que não pode ser apagada com o
tempo e nem ignorada pela maioria dos jovens brasileiros. Vejo este “show-espetáculo”
cumprindo uma função social, e este é o grande objetivo. Quando conhecemos
nossa história, nosso passado, construímos uma ponte com o presente, entendendo,
assim, de onde viemos, que caminhos foram escolhidos para chegar a esta
realidade que vivemos. A vida em sociedade fala através da arte, e a arte é o
espelho. Um país sem cultura é um país sem identidade! A receptividade do
público foi maravilhosa, linda de sentir! Público de todas as idades. Pretendo
fazer muito mais apresentações, quero levar o “show” para o maior
número de pessoas possível. Fiz duas temporadas curtas.
(Foto: Leekyung Kim.)
16) OTMR:
Como você sabe, eu vou a São Paulo, algumas vezes por ano, especialmente, para
assistir a TEATRO, mas, infelizmente, não me perdoo por não ter conseguido
assistir a dois grandes musicais de que você participou. Eu sabia que eram
poucas as oportunidades de que viessem para o Rio, mas, mesmo assim, por
motivos vários, todos, obviamente, alheios à minha vontade, não deu para vê-los.
Um é “Vingança” e o outro, “As Cangaceiras, Guerreiras do Brasil”.
Queiram os Deuses do TEATRO que eu ainda possa assistir a eles um dia! A
pergunta é com relação a “Vingança”, espetáculo no qual
interpretava a personagem Maria Rosa: Antes de topar fazer parte
do projeto, você já tinha alguma intimidade com o universo “dor de cotovelo”,
do Lupicínio Rodrigues, ou teve de mergulhar numa pesquisa, para
brilhar, na peça, como disseram todos os que a ela assistiram?
AA:
Sou apaixonada por “Vingança”, como por todos os que trabalharam
nessa obra impecável, escrita por Anna Toledo, como todos que
tiveram a oportunidade de assistir. É uma trama incrível, com as músicas do Lupicínio
se encaixando, como uma luva. Eu já conhecia Lupicínio, era louca
pela música “Volta”. Ele é um dos grandes gênios da nossa música.
Consegue uma simplicidade nas suas canções, mas com uma melodia tão
rebuscada... Coisa de mestre! Quando Anna Toledo foi em casa e me
contou a história e me mostrou a canção “Maria Rosa”, foi paixão
instantânea. Assim, mergulhei na vida e na obra de Lupicínio. Não fiz a
primeira temporada, pois estava gravando “Chiquititas”, mas
entrei na segunda e permaneci no espetáculo até o fim. Esse espetáculo, como
tantos outros, deveria ficar em cartaz por muitos anos.
17) OTMR: Você já atuou, também, em espetáculos infantojuvenis (Prefiro o termo a “infantis”.), como “No Reinos das Águas Claras”, em 1998, como Narizinho, e “O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá” (2003/2005). Não me esqueci de “Carmen...”; de propósito, deixei-o para mais adiante. Serão várias perguntas numa só: Você gosta de atuar para o público infantojuvenil? Pretende voltar à experiência? Você e o Fusko levam muito o Vicente ao Teatro? Ele gosta? E o que você acha, de uma forma geral, em termos de qualidade, das produções voltadas para os pequenos? Já adianto que, no Rio, infelizmente, com raras exceções, é um desastre: salvam-se muito poucas.
AA: Faço
TEATRO para seres humanos. Não importa a forma, o gênero; o que importa
é a história ser bem contada, cuidada em todos os detalhes, tudo sendo criado
para acessar a alma do outro. Eu gosto de atuar para o público. Gosto de contar
boas histórias. E o TEATRO infantil tem que ter a linguagem, os códigos
da faixa etária com que o espetáculo busca se comunicar. Esta é a única
diferença entre TEATRO adulto e infantil. Fazer TEATRO para
criança é muito sério. Tem que haver o reconhecimento da criança naquela
história. E, se a gente estiver blefando, não estiver inteiro, com a verdade na
relação com eles, eles se desconectam, perdem o interesse e vão fazer tudo,
menos prestar atenção na história. O adulto sente o mesmo, mas disfarça. Quando
o Vicente era menor, a gente ia muito ao Teatro com ele,
mas, agora, está desinteressado; ele está com 12 anos, difícil ter peças que se
comuniquem com essa idade, e, nesta idade, há muitas transformações
acontecendo. Mas ele vai assistir a todas as peças que eu faço e ama, inclusive
sabe a maioria das músicas dos musicais que fiz. Há muitas produções incríveis
feitas para crianças, mas muitas não alcançam o grande público, por não terem
apoio financeiro. E há muitas que têm o capital, mas que estão interessadas no
capital, não em fazer a diferença na vida das crianças e dos pais, contando uma
história com a amor e dedicação. Cíntia Abravanel é um exemplo
deste amor, dedicação e seriedade nas produções dos espetáculos infantis. Uma
das maiores formadoras de público do nossa país. Produções impecáveis, sempre
partindo da história e do valor daquela história para as crianças, professores,
pais. Sou muito grata por ter começado a minha trajetória no TEATRO em
São Paulo, fazendo a Narizinho, no espetáculo “No Reino das
Águas Claras”, produção da Cíntia.
(Foto: João Caldas.)
18) OTMR:
Você, eu sei, quando não está em cartaz, o que é muito raro, graças a Deus,
prestigia bastante os trabalhos dos colegas. Aliás, você é uma grande colega –
opinião unânime da classe! Tem preferência por algum gênero, e, dos espetáculos
a que assistiu, nos últimos tempos, qual(is) o(s) a marcou(aram) mais?
AA:
A minha preferência é o TEATRO que toca a alma, que faz eu esquecer que
estou no Teatro, que me faz sair diferente, do Teatro, que me
expande como ser humano. Vou citar apenas três dos muitos espetáculos que já me
arrebataram: “Elizabeth Costello”, com a divina Lavínia
Pannunzio, adaptado e dirigido por Leonardo Ventura; “A
Cor Púrpura”, com um elenco divino: Letícia Soares, Sérgio
Menezes, Lilian Valeska, Flavia Santana, Jorge
Maia, Alan Rocha, Ester Freitas, Analu
Pimenta, Suzana Santana, Claudia Noemi, Erika
Affonso, Caio Giovani, Renato Caetano, Thór
Jr, Gabriel Vicente, Leandro Vieira e Nadjane
Rocha, com direção geral de Tadeu Aguiar, texto adaptado
por Artur Xexéu, direção musical de Tony Lucchesi e
coreografia de Sueli Guerra; “Love, Love, Love”, também
com um elenco divino: Augusto Madeira, Débora Falabella,
Mateus Monteiro, Alexandre Cioletti e Yara de
Novaes, tendo, como diretor artístico, Eric Lenate.
19) OTMR:
Que eu me lembre, dos vários musicais de que você participou, três foram
grandes sucesso na Broadway: “Grease, O Musical”, “Godspel”
e “My Fair Lady”. Evidentemente, há muitas diferenças entre a
montagem de um musical nacional e a de uma franquia estrangeira. Assisti aos
três, no Brasil, mas não tive a oportunidade de ver todos na “Meca dos
Musicais”. Lá, só assisti a “Godspel”, e a versão “falabbeliana”
era bem livre e diferente. Por acaso, assisti a uma versão, meio fraca, de “Grease...”,
em Toronto, Canadá. Não sei se o que vi aqui, estava exatamente obedecendo aos
padrões dos originais. Certamente, o “Grease...”, do Canadá, não deveria
ser como o da Broadway. Você se sente mais à vontade quando participa de uma
montagem original ou de uma “recriação” “engessada”?
AA:
Claro que o melhor é criar algo original, mas tudo depende do processo, quando
montamos uma recriação. Depende se a história é boa, se os produtores, o
diretor, os atores, todos da criação acreditam nessa história. Se recriar um
espetáculo, pensando no sucesso que foi na Broadway, no comercial, aí será
triste demais. Quando há uma recriação, tem que haver algumas adaptações. Tem
que ter a nossa alma. Por exemplo, há piadas que os americanos contam que não têm
a mínima graça pra gente, porque eles têm uma cultura, uma relação diferente da
nossa, e isso seria com qualquer obra de qualquer país.
20) OTMR:
Eu assisti a um espetáculo, que adorei, em São Paulo, o qual ficou, por muito
tempo, em cartaz, em várias temporadas: “Caros Ouvintes”. Trouxe-me
muitas lembranças da minha infância, porque se passava na “época de ouro do
rádio brasileiro”. Você, em algum momento, fez parte do elenco, porém,
infelizmente, quando assisti à peça, AMANDA ACOSTA ainda (ou já) não
fazia parte dele. Acho um texto atemporal, embora pareça bastante datado,
e penso que seria sucesso, hoje, no Rio de Janeiro, se aqui fosse remontada.
Qual a sua opinião sobre isso e como se sentiu participando do espetáculo?
AA:
Esse espetáculo é atemporal, fala das readequações por que passamos, de tempos
em tempos; nesse caso, dos profissionais das rádios novelas, trazendo todo o
contexto social que o país estava atravessando. Fala da nossa história, dos
nossos artistas, o conflito de cada pessoa, diante de uma transformação externa,
revelando as crises e as soluções que cada um encontra, para lidar com essas
mudanças. É o que estamos vivendo hoje, com a internet. Eu sou apaixonada por
esse espetáculo, amava fazer, uma verdadeira aula. Otávio Martins
acertou em cheio na dramaturgia e na direção.
21) OTMR:
Em algum lugar, li esta declaração sua: “Estar no palco é uma ‘viagem’ e
não consigo viver sem!”. Amplie, um pouco, em palavras, esse
sentimento.
AA:
Acho que a frase já diz tudo! 😉
“ESTAR NO PALCO É UMA 'VIAGEM' E NÃO CONSIGO VIVER SEM ELE"
(Amanda Acosta.)
22) OTMR: Não é preciso ficar repetindo que você esbanja talento, mas, depois de tantos espetáculos a que assisti com AMANDA ACOSTA, normalmente protagonizando, fiquei impressionado, há pouco tempo, quando vi, via “streaming”, a um dos seus muitos trabalhos, chamado “Maternagem”, adaptação de uma peça, “Maternidades”, escrita pelo André Fusko, seu marido, que você já havia feito, em 2010, no Teatro (De verdade. RISOS meus.), espetáculo em que você interpreta quatro mulheres de idades diferentes, com 17, 35, 50 e 60 anos, com uma maestria, uma entrega, com perfeitas transformações, exigidas pelo passar cronológico. Fiquei, deveras, encantado, um lugar-comum, quando me proponho a analisar um trabalho seu. A pergunta é sobre a sua opinião acerca desse tipo de experiência ao qual nos obrigou essa pandemia. Embora não considerando isso TEATRO (É a minha opinião.), acho muito interessante, e importante, essa iniciativa, essa “invenção”, e acho, até mesmo, que, passado o pesadelo que estamos vivendo, ela poderia continuar, concomitantemente, com os espetáculos presenciais, como forma de atender, ainda que não com tanta “realidade”, a um público que não tem acesso ao TEATRO, por falta de condições financeiras ou distâncias.
AA:
Acho muito válido e é mais um canal potente de comunicação com o público, e uma
forma de divulgar o TEATRO, mantê-lo vivo, nestes tempos; mas não é
TEATRO. E acho que isso tem que ser lembrado para o público, após cada
espetáculo. É mais um canal de comunicação que temos, mas nunca substituirá o TEATRO.
23) OTMR:
Temos a felicidade de ter um querido amigo comum, Tadeu Aguiar,
com quem você já fez alguns dos seus maiores espetáculos, incluindo aquele que
considero, até o presente momento, sua (da AMANDA) “OBRA-PRIMA”,
que é “Bibi – Uma Vida em Musical”. Com o Tadeu, você fez,
atuando ou sendo dirigida por ele, grandes musicais, como “My Fair Lady”,
“Esta É A Nossa Canção”, “Baby – O Musical”, “4
Faces do Amor”, além da já citada e icônica “Bibi...”.
Todos musicais. Como surgiu a parceria entre vocês e a que você atribui tanto
sucesso nessas produções?
AA:
Conheci o Tadeuzinho em uma apresentação que Bibi Ferreira
fez no Teatro Renaissance, que Jorge Takla dirigiu.
Foi paixão à primeira vista. Fizemos “My Fair Lady” juntos, e
amava estar com ele no palco, na coxia e na vida. Inclusive, Tadeu
foi a pessoa que mais me apoiou para ter um filho. Todo dia, antes de entramos
na cena da corrida dos cavalos, Tadeuzinho fazia, com as mãos, o
formato da barriga de grávida, pra mim. Depois de “My Fair Lady”,
ele me convidou para fazer “Esta é a Nossa Canção”. Quando o Vicente
completou sete meses, fui para o Rio com ele e minha mãe. Tadeu e
Eduardo Bakr me deram toda a estrutura de que precisava, para
estar com meu filho e no palco. Sou, eternamente, grata por esse acolhimento.
Um exemplo a ser seguido. E eles fizeram o mesmo com outras mães atrizes. E a
parceria seguiu e segue pra toda a vida. O sucesso das produções se deve à
paixão, envolvimento, cuidado com todos os detalhes de cada espetáculo, ao
profissionalismo e amor pelo ofício.
24) OTMR:
Decididamente, 2018, no TEATRO, foi o ano de AMANDA ACOSTA,
por sua impecável interpretação de DONA Bibi Ferreira, o que lhe
rendeu um incontável número de indicações a prêmios e a conquista de vários,
como melhor atriz. Sua relação com essa dama do TEATRO BRASILEIRO já
vinha de algum tempo. De 2007, pelo menos, quando você interpretou,
magnificamente bem, a personagem Elisa Doolitle, de “My
Fair Lady”, que já havia sido interpretada por DONA Bibi,
numa montagem brasileira, em 1962. É possível traduzir, em palavras, a
emoção de representar a vida dessa “deusa dos palcos”, ainda em
vida, quando a peça esteve em cartaz? Você já a conhecia, pessoalmente, antes
de ela, já no final da vida, muito alquebrada, ter ido assistir ao espetáculo?
Como foi esse encontro?
AA: Muito difícil traduzir em palavras. Só sei agradecer à vida, por ter me proporcionado essa vivência, esses encontros. Presente dos Deuses do Teatro, um imenso desafio de um aprendizado gigantesco. Conheci Bibi no Teatro Renaissance. Jorge Takla dirigiu o “My Fair Lady” e queria nos apresentar a ela. Ele disse que queria que Bibi me "passasse o bastão" nesse encontro. Depois daquele dia, Bibi foi assistir a “My Fair Lady” e “Esta é a Nossa Canção” (Você pode imaginar a emoção!). Tive a honra de homenageá-la duas vezes: uma no aniversário dela, no programa da Xuxa, cantando “Wouldn't It Be Loverly?”, e “I Could Have Dance All Night”, no prêmio APTR. As duas músicas de “My Fair Lady”, que cantei na versão em português. Depois, assisti a quatro apresentações dela e sempre ia ao camarim e era recebida por ela com muito carinho e atenção.
25) OTMR:
Você considera “Bibi...” um divisor de águas na sua vida de
atriz, de musicais ou não, ou já havia acontecido outro antes?
AA: Na vida, sempre temos, e teremos, muitos divisores de águas. Sinto que todos os divisores de águas que vivi até agora me levaram a “Bibi...”.
26) OTMR:
Eu falei, lá em cima, quando o assunto era TEATRO Infantojuvenil, que
deixaria “Carmen...” para depois. Explico: é porque, embora a
peça seja “vendida” como “infantil”, percebi, muito
emocionado, quando tive a grande alegria e prazer de ver aquela maravilha, em
São Paulo (O Rio precisa de “Carmen...” também. Com a palavra o Sr.
Antônio Fagundes, que se encantou pelo musical e resolveu produzi-lo!),
que se trata de um espetáculo para a família; muito mais para pais e avós do
que para crianças. As crianças se encantam com as músicas, tanto colorido e
movimentos em cena. Acho que o espetáculo, de certa forma traz um pouco do
registro do TEATRO de Revista?
Você concorda comigo?
AA:
Sim, foi criado com a linguagem de TEATRO de Revista, e é para a família
inteira, como o espetáculo infantil deve ser. Kleber Montanheiro
é um grande conhecedor do gênero, de talentos mil. Ele quis, exatamente, isso,
comunicação com pais e filhos. E a linguagem do TEATRO de Revista
funciona muito com as crianças, pois são quadros, sempre com mudanças
dinâmicas, sempre uma surpresa. E o espetáculo era feito com muito amor,
verdade e seriedade por TODOS. As crianças não tiravam o olho do palco e
riam, interagiam. Saíam imitando a Carmen. Eu recebo vídeos e
mensagens dos pais emocionadíssimos, falando do espetáculo e da paixão dos
filhos pela Carmen, depois de terem assistido ao espetáculo.
Senhoras e senhores emocionadíssimos... Essa é a função do TEATRO!
27) OTMR:
Há bastante tempo, você vem emendando um espetáculo no outro, às vezes, até,
fazendo dois, simultaneamente. Onde você consegue tempo e energia para dar
conta do recado? Nem falo do talento,
porque este, como já disse, e é unanimidade, transborda em você.
AA: Amor pelo meu oficio. Tendo escuta com as necessidades do meu corpo (físico, mental e espiritual), para saber o que preciso fazer, do que cuidar, a fim de ter energia, para estar plena, inteira, quando abre a cortina.
(Talento precoce. Foto: autor desconhecido.)
28) OTMR:
Você ainda faz audições ou já atingiu um patamar que já lhe confere o direito
de ser convidada, requisitada, pelos diretores e produtores?
AA:
Recebo convites, mas, às vezes, faço teste, o que é normal na nossa profissão.
29) OTMR:
Durante minha curta passagem pelos palcos, vivenciei ou presenciei algumas “mancadas”
e “saias justas” em cena. Sem citar nomes ou dar detalhes que possam
comprometer algum colega, você poderia nos contar uma situação, ou mais, em
cena, que lhe tenha criado constrangimento ou gerado boas gargalhadas na coxia?
Aproveito para lhe dizer, embora não tenha sido uma situação nada engraçada -
muito pelo contrário - que eu estava na primeira fila da plateia do Teatro
João Caetano, no Rio de Janeiro, naquela noite em que você, de uma
forma inexplicável, teve o joelho lesionado, em cena, e não conseguiu continuar
a sessão, tendo sido substituída, após uma pequena pausa e as explicações do Tadeu
Aguiar, diretor da peça, pela Ana Baird, uma guerreira,
porque não é fácil substituir AMANDA ACOSTA. Ainda mais numa situação
como aquela. Foi em “Baby – O Musical”.
AA:
Esse dia foi triste, mas a união faz acontecer. Um dos casos foi quando fiz
xixi nas calças, ao ver a peruca verde do meu amigo de cena ficar na metade da
cabeça, mostrando a metade da careca. Havia uma cena em que ele se mexia muito
e a peruca foi para traz e a luz fez refletir o verde da peruca na careca.
Nossa! Quase não consegui dar o texto, de tanto que eu ria, e não consegui
segurar o xixi.
(Foto: Brasilio Wille)
30) OTMR:
Em tanto tempo de carreira, quantas vezes já foi visitada pelo “fantasma”
do “deu branco”? Como sair do
problema?
AA: Foram algumas vezes, mas a mais apavorante foi em “My Fair Lady”, quando esqueci a letra de uma música que cantava para o personagem do Frederico Silveira, em uma cena. Eu fiquei repetindo o refrão, praticamente, em toda a música. Só via a maestrina, Vânia Pajares, regendo e olhando para mim, sem saber o que estava acontecendo, e o Fred com os dois olhos arregalados e me acompanhando na coreografia. Desesperador. E o público não percebeu nada!
(Foto: Divulgação/Produção.)
(Foto: Divulgação/Produção.)
31) OTMR:
Com a total e devida isenção, como você analisa a qualidade e a situação do TEATRO
MUSICAL BRASILEIRO, em comparação com o que se faz em outros países,
mormente Estados Unidos e Inglaterra?
AA:
Precisamos fomentar novos talentos da dramaturgia, da música, para criarem
musicais dentro da nossa linguagem e realidade. Há muita produção original, mas
que não tem o aporte financeiro para a realização e para as temporadas. Não
podemos montar um musical, pensando em ficar dois meses em cartaz. Temos que
pensar em ficar em cartaz o maior tempo possível, com uma estrutura pensada
para rodar o Brasil. Temos que criar dentro da nossa realidade, que é diferente
da Inglaterra e dos Estados Unidos.
("BIBI..." - Foto: Carlos Costa / Guga Melgar.)
32) OTMR:
Apesar dos Teatros lotados (Sou testemunha.), principalmente em
São Paulo, ainda se fala muito em “preconceito”, de uma forma geral, com
relação aos musicais. Você acha que existe, de verdade, rejeição, quanto ao
gênero?
AA: Na minha opinião, há
o “show musical” e o TEATRO MUSICAL. Acho que precisamos
começar a diferenciar um do outro. Há musicais em que o foco está na beleza dos
cenários, na música bem cantada e executada, nas belas coreografias, bem
dançadas, nos figurinos, que enchem os olhos, nos quais a história fica quase
como pano de fundo, sem trazer uma reflexão. Este é o “show musical”.
No TEATRO MUSICAL, a história está à frente, e tudo vem para
potencializar a história. Aí é arrebatador!
("BIBI..." - Foto: Carlos Costa / Guga Melgar.)
("BIBI..." - Foto: Carlos Costa / Guga Melgar.)
33) OTMR:
Penso que você também – posso estar errado - fica incomodada, quando dizem que “incorporou”
tal personagem, como se o TEATRO fosse um centro espírita. Mas a verdade
é que eu “vi” DONA Bibi em cena, da mesma forma como “enxerguei”
a Carmen, no palco. Sei que tal perfeição, que não é mimética,
mas que acaba nos convencendo de que estamos diante das duas, é fruto de muito
trabalho de observação e estudo. Como é que você pode traduzir, sinteticamente,
para nós, o seu processo de construção dessas duas grandes personagens?
Aproveito para emendar outra pergunta, que pode, até, não ter nada a ver com as
duas: Qual personagem, até hoje, lhe deu mais trabalho para ficar pronta?
AA:
Mergulho na vida e na obra da personagem, estudo tudo que está disponível, e
tento me aproximar da energia dela, através deste conhecimento, e despertar essa
energia em mim. Estudo o físico, o andar, a voz, o psicológico... Enfim, cada
detalhe da pessoa e a incorporo em mim. Tudo é uma informação importante. No
caso de “Bibi...”, durante a temporada, algumas pessoas que
trabalharam com ela me contavam histórias sobre ela e eu sempre ouvia algo que
trazia um traço da personalidade dela. Isso, para mim, era como pequenos
tesouros, que eu incorporava nos próximos espetáculos. Da mesma forma, foi com Carmen.
Busco, em mim, as emoções que vêm delas e, assim, sou eu através delas. Porque
senão vira apenas imitação. Tenho que sentir o corpo delas em mim, com a minha
alma. Acho que a maior dificuldade foi com Bibi. Mas todas têm as
suas dificuldades. Evoluo como ser humano, como artista, através delas. Olha as
professoras que eu tive! Eu me sinto privilegiada! Mas é uma dedicação tamanha.
Desafiador.
("BIBI..." - Foto: Carlos Costa / Guga Melgar.)
("BIBI... - Foto: Carlos Costa / Guga Melgar.)
34) OTMR:
Duas perguntas numa só: De qual musical, em que não atuou, gostaria de ter
feito parte do elenco, representando qual personagem, e qual o musical, ainda
não montado no Brasil, em que gostaria de ver seu nome na ficha técnica?
AA:
Posso citar “Suassuna - O Auto do Reino do Sol”, representando
qualquer personagem. O espetáculo é uma das obras-primas do TEATRO MUSICAL BRASILEIRO.
Há algumas histórias que quero viver no TEATRO MUSICAL, mas o que mais
desejo é que algumas peças, como “Bibi...” e “Carmen...”,
fiquem mais tempo em cartaz, rodando o Brasil. (Uma intromissão minha: “Vingança”
e “As Cangaceiras, Guerreiras do Brasil”, também.)
("BIBI..." - Foto: Carlos Costa / Guga Melgar.)
("BIBI..." - Foto: Carlos Costa / Guga Melgar.)
35) OTMR:
Para diminuir e aliviar, um pouco a minha frustração, por não ter tido a
oportunidade de assistir ao espetáculo, em São Paulo, gostaria de que você nos
falasse um pouco sobre “As Cangaceiras, Guerreiras do Sertão”,
texto do querido Newton Moreno, direção de outro querido, Sergio
Módena, contando com uma ficha técnica de primeiríssima
qualidade, na qual, no elenco e nos artistas de criação, eu tenho vários
amigos, como, Marco França, Rebeca Jamir, Milton
Filho, Pedro Arrais, Carol Costa, Rodrigo
Velloni e Fernanda Maia, por exemplo. Sei que sua
personagem era Serena, uma mulher corajosa, apesar do nome. A
partir daí, dessa mínima informação, posso imaginar você no palco. Creio ter
sido a sua última passagem pelas tábuas, salvo engano, até a chegada da
pandemia. Confere? O que o espetáculo representa para você e que nível de
satisfação lhe rendeu?
AA: “As
Cangaceiras...” iria reestrear em abril, mas, devido à pandemia, foi
cancelada a temporada. “As Cangaceiras, Guerreiras do Sertão” é
uma obra-prima do TEATRO MUSICAL BRASILEIRO. Newton Moreno
é um dos gênios da nossa dramaturgia! Essa peça é o grito de libertação das
mulheres nordestinas, das mulheres brasileiras. Mostra que a força de uma
mulher desperta a força de muitas, que, quando uma abre o caminho, muitas podem
passar; a união leva à vitória. “Quem comanda pra si comanda pra todas.”.
“Só vive quem da luta não desiste e aprende a dizer não.”.
(Amanda Acosta, DONA Bibi Ferreira e Tadeu Aguiar.)
36) OTMR:
Para terminar, já que estamos vivendo uma “pandemia”, como está
sua rotina, durante estes quase oito meses de confinamento, de isolamento
social, e quais os projetos que foram interrompidos e os que virão por aí, “pós-tsunami”?
AA:
Tenho cuidado da minha casa interna e da minha casa externa. Cuidando do meu
filho e fazendo alguns estudos e pontuais apresentações. O que tem pela frente
é “As Cangaceiras...”, “Carmen...” e “Bibi...”.
Vamos torcer para que todas essas histórias encontrem o público muito em breve
nos teatros! VIVA O TEATRO BRASILEIRO! VIVA TODOS OS FAZEDORES DE
ARTE DO NOSSO PAÍS, TODOS OS TRABALHADORES DA ARTE DO NOSSO BRASIL!
Cuidemos das nossas florestas, de todos os seres vivos que habitam o nosso
planeta, das nossas águas, do nosso ar, da nossa gente! Isso é muito sério,
pois, se não tivermos um ar bom, para respirar; comida sem veneno, para comer;
e água boa, para beber, não teremos nada. Você pode ser bem sucedido na sua
vida, mas vai viver em hospitais e entupido de medicamentos, por não ter as
condições básicas para viver. Se não cuidarmos, agora, da nossa “mãe-terra”,
sofreremos muito. Já estamos sentindo os efeitos dessa desconexão.
(Recordando "O Trem da Alegria".
Programa "Encontro com Fátima Bernardes".
Divulgação- TV Globo.)
E VAMOS AO TEATRO (QUANDO HOUVER SEGURANÇA.)!!!
OCUPEMOS TODAS AS SALAS DE ESPETÁCULO DO BRASIL (QUANDO HOUVER SEGURANÇA.)!!!
A ARTE EDUCA E CONSTRÓI!!!
RESISTAMOS!!!
COMPARTILHEM ESTE TEXTO,
PARA QUE, JUNTOS, POSSAMOS DIVULGAR
O QUE HÁ DE MELHOR NO
TEATRO BRASILEIRO!!!
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