ÓPERA
DO
MALANDRO
(NEM MELHOR, NEM PIOR; APENAS
UMA MONTAGEM DIFERENTE.)
PARTE 2
Comentários que podem ser feitos sobre o espetáculo:
1) Com relação ao texto, é mais uma das geniais criações
de uma mente privilegiada: CHICO BUARQUE
DE HOLANDA.
2) JOÃO FALCÃO, mais uma vez, acertou na direção e adaptação. Sem se preocupar com as montagens anteriores,
vestiu o texto com os trajes que ele julgou que poderiam lhe cair bem. E caíram, segundo o meu pensamento. Não que seja original, em TEATRO, homens fazendo papéis
femininos, entretanto, nesta ÓPERA,
esse detalhe se reveste de uma originalidade enorme, acrescido do fato de que
os mesmos atores que interpretam as prostitutas se revezam em personagens
totalmente opostos, masculinos, os capangas do chefe contrabandista. Não me agradou muito o “gancho”, nesta
adaptação, para que a personagem GENI
possa fazer o seu aplaudidíssimo solo.
Fica meio “solto”, sem sentido, o texto que anuncia a interpretação da
canção, a qual leva o mesmo nome da personagem.
Seria isso um senão, de pouca relevância no contexto geral. Também me incomodou, um pouco, uma constante
passagem, de uma coxia a outra, de uns praticáveis sobre rodas, cujo propósito
não consegui atingir, detalhe que também
não compromete o conjunto da obra.
2) BETO LEMOS faz um bom trabalho na direção musical e nos arranjos. Por estarmos acostumados a ouvir, por quase
40 anos, os arranjos originais das canções da peça, que se tornaram sucessos, e
o são até hoje, na primeira vez em que assisti ao espetáculo, não gostei muito
de alguns arranjos, que me pareceram descaracterizar um pouco as canções,
entretanto, ao ouvi-los, na segunda vez em que vi a peça, passei a admirá-los
também.
3) RODRIGO MARQUES merece aplausos pelas coreografias do espetáculo.
Em poucas vezes, um espectador mais assíduo de musicais pode identificar
alguns clichês nos passos coreografados, porém, no geral, seu trabalho é muito
bom e algumas das coreografias são até um pouco sofisticadas, o que valoriza,
também, o trabalho dos atotres/cantores/dançarinos.
4) ANDRÉA ALVES é uma referência na parte de direção de produção e idealização. Seu nome está ligado a vários sucessos dos
últimos anos, com destaque para a premiadíssima Gonzagão, a Lenda, também dirigida por JOÃO FALCÃO e de onde saiu boa parte (acho que a maioria) do elenco
desta ÓPERA. Parabéns!
5) AURORA DOS CAMPOS, sempre ela, idealizou um ótimo cenário, composto de plataformas de
madeira, montadas em vários níveis, sobre uma estrutura de tubos metálicos,
formando andaimes, por onde os atores circulam, com grande agilidade, compondo
ótimas imagens. Além dos praticáveis
móveis, já citados, ainda ocupam o espaço cênico, em algumas cenas, longos
bancos de madeira e alguns móveis que caracterizam o “escritório” de DURAN, além de uma simples grade, para
identificar as cenas de MAX na
cadeia. Cenário simples e interessante.
6) KIKA LOPES foi muito feliz na criação dos figurinos, em tons bem quentes e puxados, sem exagero, para o
aspecto caricatural e “torto” de todos os personagens. (A propósito, ali, não se salva ninguém. “Caráter” é verbete que não consta no léxico
de nenhum dos personagens.) Um detalhe
que não pode deixar de ser mencionado é a praticidade, certamente intencional,
na confecção dos figurinos, o que facilita a vida dos atores. É impressionante o pouco tempo de que dispõem
para a transformação de prostitutas em capangas, e vice-versa.
7) CESAR DE RAMIRES assina um bela iluminação, com cores bem fortes e quentes, valorizando bastante as
cenas. Em algumas delas, a iluminação se
destaca bastante, como no solo de GENI
e na iluminação voltada para todas as cenas que acontecem nas plataformas do
fundo do palco. Linda plasticidade!
8) MARIA TERESA MADEIRA é a responsável pela peparação e arranjos vocais. Muito bom o resultado do seu trabalho.
9) CLAYTON MARQUES é o assistente
de direção e pesquisa. Trabalho
minucioso.
10) FERNANDO FORTES tem a grande responsabilidade de responder pelo desenho de som, elemento fundamental em
musicais. No Theatro Municipal, percebi algumas falhas, mas, no Theatro Net Rio, o verdadeiro espaço
para o qual o espetáculo foi estruturado e idealizado, tudo fnciona muito bem,
com relação ao som. Bem ajustados e
equalizados os volumes dos instrumentos e o das vozes dos atores/cantores.
11) UIRANDÊ DE HOLANDA merece um aplauso destacado pelo brilhante trabalho
de visagismo.
12) Quanto ao elenco, pode-se dizer
que todos, sem exceção, parecem ter
sido talhados para os papéis, de acordo com a visão do diretor. Cabem, aqui, algumas menções, por ordem
alfabética:
a) ADRÉN ALVES (VITÓRIA) – Já em Gonzagão,
o ator já se destacava; não pelos cabelos exageradamente alaranjados, mas por
seu completo domínio de corpo, expressividade, carisma e uma voz marcante, que
atinge as mais altas notas, inclusive em falsete, e, em frações de segundo,
desce a notas graves, com uma facilidade de causar espanto. Repete a dose na ÓPERA. Excelente trabalho!
Adrén Alves.
Vitória fazendo “comprinhas” com Geni.
b) ALFREDO DEL PENHO (INSPETOR CHAVES / TIGRÃO) – Veterano em
musicais, ainda que jovem, creio que, nesta ÓPERA, ele, por puro mérito, conseguiu o seu melhor papel e o
defende de forma brilhante, como também já fazia em Gonzagão. Sou um grande
admirador do seu trabalho.
O
Malandro e o Chefe de Polícia, “fazendo troca-troca”.
c) BRUCE DE ARAÚJO (JOHNNY WALKER / SHIRLEY PAQUETE) – Não destoa do
grupo e também se sai muito bem em cena.
d) DAVI
GUILHERMME (BIG BEN / MIMI BIBELÔ) – A trajetória deste jovem ator, em
musicais, desde O Despertar da Primavera,
é belíssima. Sempre se supera, a cada
nova produção, e, aqui, mais uma vez, é destaque. Penso, porém, que deveria se distanciar um
pouco, no que se refere à voz do personagem masculimno que interpreta na ÓPERA, da que fazia para o pernonagem
no seu último trabalho, Todos os
Musicais de Chico Buarque em 90 Minutos.
e) EDUARDO
LANDIM (GENI) – Uma atração à parte neste espetáculo. O/A personagem carrega, em si, um carisma
muito grande e já ganha a simpatia do público logo em sua primeira aparição. Assim acontecia com os dois consagrados
atores das duas versões anteriores, Emiliano
Queirós e Sandro Christopher,
respectivamente na primeira e na segunda.
Pois não é que o jovem ator, que tanto se destacava em Clandestinos, também da lavra de JOÃO FALCÃO, não fica atrás?! EDUARDO
faz uma GENI irretocável, tanto na
interpretação quanto no seu grande momento, quando canta, sob o total silêncio
e atenção da plateia, a sua emblemática GENI,
plateia esta que o aplaude, freneticamente, ao final de seu número. Não sei se pelo nervosismo, achei-o bastante
contido, parado, no Municipal, na hora em que canta. Cheguei a ouvir, posteriormente, que era
orientação do diretor, o que, depois, foi desmentido pelo próprio ator. No Net
Rio, porém, está bastante à vontadse em cena, solto, quase parado no lugar,
mas expressando o sentimento contido na letra da canção por meio de uma
gesticulação muito expressiva. EDUARDO, felizmente, recebeu um papel à
altura do seu talento e o defende com unhas e dentes. O resultado é o melhor possível.
Eduardo Landim.
Geni entre os homens...
Que felicidade!!!
f) EDUARDO
RIOS (GENERAL ELETRIC / DORINHA TUBÃO) – Bom o trabalho do ator, que conta,
a seu favor, com sua compleição física, tanto na interpretação, bem caricatural
- como a de todas as outras “meninas” - da sua prosituta, como no desengonçado
capanga de MAX.
g) FÁBIO
ENRIQUEZ (TERESINHA) - FABINHO é
um dos melhores atores da sua geração e já o demonstrou em vários trabalhos,
nos palcos e na TV. Sua TERESINHA, curiosamente, ou, por outra,
por força de sua talentosa interpretação, é feminina, delicada, sem ser uma
“mulher”. Complicado? Talvez eu não consiga mesmo explicar. É uma “mulher”, muito bem caracterizada, mas
não é caricatural; ao contrário, é de uma naturalidade, de uma perfeição
incríveis. Acho que encontrei a
definição: é “enganosamente feminina”.
Ficou melhor assim? Adoro o seu trabalho
na ÓPERA.
Fábio Enriques / Teresinha.
Fábio ou Teresinha?
h) LARISSA
LUZ (JOÃO ALEGRE) – A única presença feminina em cena, interpretando um
homem, sem a preocupação de se mostrar homem.
Sai-se bem no que lhe cabe fazer.
Larissa Luz / João Alegre.
Larissa.
i) LÉO
BAHIA (LÚCIA) – Fico muito à vontade para comentar o trabalho do LÉO, porque vi seu talento desabrocahar
no grande fenômeno The Book of Mormon,
a que assisti umas seis ou sete vezes, e, desde lá, tive a certeza de que, ali,
existia um grande talento, um grande ator, um grande artista, que, sem a menor
sombra de dúvidas, por sua tão pouca idade, ainda vai estrelar grandes
musicais, para o nosso deleite. LÉO compôs uma LÚCIA muito fora dos padrões de beleza estética, longe de ser uma
concorrente para a sensual e sedutora TERESINHA. Mas não se acovarda, na luta pelo seu homem,
de quem chega a esperar um filho. Para
fazer justiça, o visagista também tem seu mérito nessa caracterização, por
aproveitar o “physique du rôle” do ator.
Mais um sucesso no currículo do LÉO.
Léo Bahia / Lúcia
j) MOYSEIS
MARQUES (MAX OVERSEAS / O MALANDRO) – Até onde sei, este é o seu primeiro
trabalho como ator, que, até esta ÓPERA,
quando foi descoberto por JOÃO FALCÃO,
vivia de música. Apropriei-me de alguns
dados bibliográficos, extraídos de seu “site”: Começou a fazer da música
profissão em 1998. Em 2001, começou a
tocar em bares na Lapa. De lá para cá,
são 15 anos de carreira, 6 anos dando aulas de música brasileira para cantores,
na Califórnia, 3 bandas fundadas (Forró na Contramão, Casuarina e Tempero
Carioca), 3 cds gravados ("Moyseis Marques", 2007, "Fases do
Coração, 2009 e "Pra Desengomar, 2012), duas indicações para o Prêmio da
Música Brasileira e inúmeras parcerias com vários compositores de sucesso. Mas como fica o MOYSEIS ator? Fica muito bem
na fita. Quem o vê em cena, na pele de MAX, há de pensar que ele já carrega
muitos trabalhos de ator nas costas, em função de sua excelente
interpretação. Virei fã.
Moyseis Marques. O Malandro pede passagem.
k) RAFAEL CAVALCANTI
(DÓRIS PELANCA) – Também me agradou a construção da personagem decadente,
mas dependente do sexo para sobreviver.
Boa a atuação do RAFAEL.
l) RENATO
LUCIANO (BARRABÁS / FICHINHA) – Que delícia é ver esse rapaz em cena! Dos coadjuvantes, é o que mais me
agradou. Gosto do seu BARRABÁS, mas é como FICHINHA que ele provoca gargalhadas na
plateia. Sua aparição, logo no início da
peça, já faz o espectador pensar que valeu a pena ter ido ao teatro. Gosto muito de suas máscaras cômicas, da voz,
com sotaque nordestivo, dada à personagem.
E a sua história, contada pela própria a MAX, quando vai ao cafetão pedir emprego, uma figura bizarra, é de
fazer rolar de rir. Não tenho a menor
dúvida de que o ator terá um futuro brilhante pela frente, explorando sua veia
cômica. Parece-me que nasceu para a
comédia.
Renato Luciano.
m) RICCA
BARROS (DURAN) – É o mais velho do elenco, o que tem mais experiência em
musicais e, por conta de seu talento e de sua voz singular, grave e possante, é
muito requisitado para bons papéis em espetáculos do gênero musical, como o que
representa na ÓPERA. É muito “rica” (não pude resistir ao
trocadilho, embora “infame”) a construção do seu personagem. O ator consegue passar, com total domínio, o
lado cafajeste e explorador de seu personagem, ao mesmo tempo que consegue não
ser odiado pelo público. É uma espécie
de anti-herói, um herói sem nenhum caráter.
Um Macunaíma da Lapa? Ótima a
atuação do RICCA.
Ricca Barros.
n) THOMÁS
AQUINO (PHILLIP MORRIS / JUSSARA PÉ-DE-ANJO) – Também cumpre, com
desembaraço e competência a função de representar dois personagens tão
díspares.
13) A banda, muito atuante neste musical, é
formada por BETO LEMOS (rabeca, viola, bandolim e guitarra), DANIEL SILVA (violoncelo e baixo elétrico); RICK
DE LA TORRE (bateria e percussão);
ROBERTO KAUFFMANN (teclado e acordeão);
FREDERICO CAVALIERI (clarinete e clarone); DUDU OLIVEIRA (flauta, sax soprano e pandeiro).
Todos são ótimos músicos, com destaque para BETO LEMOS, que já me impressionara bastante, quando o vi à frente
dos músicos que atruavam em Gonzagão.
14) Seria terrivelmente enfadonho - mais do que já
possa estar sendo – falar das dezenas de outros nomes que fazem parte da longa
ficha técnica do espetáculo. Sim,
porque, para apresentar um trabalho da qualidade desta ÓPERA, muitos profissionais têm de estar envolvidos num grande
trabalho de equipe. Aplausos para todos!
Em 1961, o saudoso carnavalesco FERNANDO PAMPLONA, cenógrafo, que,
antes de tudo, era um homem de / do TEATRO
e das artes, em geral, referindo-se às inovações que implantara no desfile da
Escola de Samba Acadêmicos do Salgueiro, cunhou uma frase, que se tornou
célebre: “NEM MELHOR, NEM PIOR; APENAS
UMA ESCOLA DIFERENTE”. Faço minhas
as palavras de PAMPLONA, ao
classificar esta ÓPERA DO MALANDRO,
versão JOÃO FALCÃO:
NEM MELHOR, NEM PIOR; APENAS
UMA MONTAGEM DIFERENTE.
Na pré-estreia – Theatro Municipal do Rio de Janeiro
Com Alfredo Del Penho.
Com Davi Guilhermme.
Com Eduardo Landim.
Com Fábio Enriques.
Com Léo Bahia.
Com Ricca Barros.
Foto histórica. Generosidade total. Criador (CHICO BUARQUE DE HOLANDA) e
criaturas (ELENCO) reverenciando-se mutuamente.
(FOTOS: SILVANA
MARQUES – programação visual; LEO AVERSA
– cena; e MARISA SÁ – pessoais.)
Amo Chico, amo a Ópera, amei seu trabalho de pesquisa e o cuidado em destacar todos em seus respectivos trabalhos.
ResponderExcluirValeu mesmo!!!!!