terça-feira, 29 de outubro de 2024

 

“SENHOR DIRETOR”

ou

(PELAS MÃOS DE

UMA “SENHORA” ATRIZ.) 


 

         Há pouquíssimos dias, fiz uma postagem, numa rede social, com uma reclamação que reputo importantíssima. É com relação ao fato de as produções teatrais e as assessorias de imprensa, NÃO TODAS, EVIDENTEMENTE, MAS MUITAS DELAS, não divulgarem o tempo de duração das montagens, um direito do espectador, para que este possa se organizar e viabilizar sua ida ao Teatro, a fim de assistir ao espetáculo divulgado. Sobre a tal postagem, em tom de brincadeira, um autor/produtor fez o comentário de que uma peça dele, em cartaz, no momento, só dura 50 minutos, a que respondi, dizendo que a questão não é o tempo de duração do espetáculo, e sim a divulgação desse tempo, e acrescentei, também a título de brincadeira com o querido amigo, que prefiro assistir a uma boa peça com apenas 50 minutos de duração a sofrer um suplício, tendo que aturar certas produções “sem limites”, de má ou extrema má qualidade, com a duração de até três horas; ou mais. E ratifico aqui o que disse.




         E por que inicio esta crítica com o parágrafo acima? Simplesmente porque me senti impelido a fazê-lo, depois do prazer e o privilégio de ter assistido, no último sábado (26/10/2024) a um monólogo que dura, exatamente, 50 minutos e que merece os maiores aplausos e elogios da crítica especializada e do público em geral: “SENHOR DIRETOR”, em cartaz no simpático Espaço ABU, em Copacabana, e que ainda cumprirá mais duas semanas da curta temporada, até o dia 10 de novembro próximo.



A peça, como já disse, é “SENHOR DIRETOR”, com texto original de LYGIA FAGUNDES TELLES, numa corretíssima adaptação de um conto homônimo da consagrada escritora, extraído do livro “Seminário dos Ratos”, de 1977, feita por SILVIA MONTE, para ser brilhantemente interpretado por ANALU PRESTES. A montagem também tem idealização e direção de SILVIA.


Analu Prestes e Silvia Monte.



LYGIA FAGUNDES TELLES tem uma importância capital na minha vida, por conta de seu incomensurável talento de escritora e por um encontro fortuito que tivemos, daquelas coisas que me parecem mais difíceis de acontecer do que ganhar, sozinho, uma Mega-Sena; e a “da virada”. Mas me reservo o direito de omitir esse meu encontro inesquecível com DONA LYGIA, porém não me nego a contá-lo, em detalhes, a quem por ele se interessar e entrar em contato comigo.  


 

 

SINOPSE:

ANALU PRESTES vive a personagem Maria Emília, uma professora aposentada paulista, a qual passeia pelas ruas de São Paulo, no dia de seu aniversário de 62 anos, e se choca, ao avistar a capa de uma revista, na banca de jornal, com um casal seminu, corpos molhados, enlaçado, estopim para a sua indignação com o caos em que ela vê a sociedade mergulhada.

Decide, então, escrever uma carta, de indignação, ao diretor do “Jornal da Tarde”, para expor sua revolta e, à medida que, mentalmente, elabora a carta, tem seu pensamento disperso entre recordações e impressões sobre os acontecimentos à sua volta, que vêm desde de sua remota infância aos dias mais próximos.

 


 



         Aquela é uma carta que, certamente, não passa de objeto de um desejo, uma vontade, uma intenção, mas que ficará apenas abstrata, na cabeça da pretensa missivista, por um motivo muito simples: apesar de lhe sobrar “indignação” (Será mesmo?), falta-lhe coragem para concretizá-la, transformar em letras e palavras toda aquela revolta reprimida, de uma mulher oprimida por sua formação, que a faz chegar virgem, aos 62 anos, sem nunca ter se relacionado com homem algum, por conta de ter sido vítima de uma educação altamente repressora. No fundo, porém, não é difícil, ao leitor do conto ou ao espectador da peça, perceber que, ao demonstrar toda a sua insurreição moral, a personagem está se desnudando de seus desejos trancafiados dentro de si. Seria genuína aquela aversão ao excesso de exposição erótica na mídia”, segundo Maria Emília? Por que será que lhe causa tanta repulsa e asco todo aquele apelo a tudo o que é sensual, que a leva a ser, ao mesmo tempo que incisiva e repetitiva, uma criatura sempre atraída por tudo o que traz à tona a sensualidade, na qual ela sempre enxerga o que quer, ou seja, algo com um alto teor erótico? Falos, por exemplo.




A intenção de sua carta, que só é desenvolvida em sua mente, com total expansão de sua cólera ao profano, ao imoral, e nunca escrita de verdade, é denunciar e censurar o comportamento mundano de uma sociedade que vai apodrecendo aos poucos, do ponto de vista moral, segundo ela - é sempre bom repetir -  deixando-se levar por propagandas apelativas, lascivas, as quais induzem a população a uma errada liberação sexual, ao mesmo tempo que exige, do "destinatário", providências, para se acabar com aquela “pouca vergonha”, aquela “falta de Deus no coração”, trazendo as pessoas, de volta, ao caminho “certo”, como se o executivo do jornal tivesse alguma ingerência sobre aquilo.



Maria Emília tinha uma imaginação muito “fértil”, para enxergar maldade em tudo o que via, entretanto, sem a menor formação psicanalítica, me atrevo a decodificar suas “interpretações” como uma revelação de si própria, uma pintura guardada no sótão, coberta por um pano, de suas próprias fantasias sexuais e sua sexualidade reprimida e jamais exercida, o que vai se encorpando, à medida que a personagem envelhece e percebe o que deixou de viver, o que “deixou de se permitir viver”. A repressão, seja de qual tipo for, sempre causa danos irreversíveis a qualquer pessoa, entretanto comungo com a teoria de que a coibição sexual, consciente e voluntária, é uma das mais cruéis e das que maiores e indeléveis marcas deixam num indivíduo, causando-lhe sensíveis instabilidades emocionais. Vejo Maria Emília como uma vítima disso.



LYGIA FAGUNDES TELLES nunca foi a única a fazê-lo, porém tinha uma espécie de dom de enxergar, com uma precisão cirúrgica, o que existe de mais profundo e verdadeiro, na alma humana, e trazer os detalhes de suas observações para o papel e foi, sem dúvida uma das nossas maiores escritoras, de todos os tempos. Vencedora do Prêmio Camões, honraria máxima da literatura em língua portuguesa, e primeira mulher brasileira a ser indicada ao Prêmio Nobel de Literatura, LYGIA FAGUNDES TELLES (1918-2022) teve algumas de suas obras adaptadas para o cinema, televisão e, curiosamente, poucas para o TEATRO...” – extraído do "release" da peça que me chegou às mãos -, o que confere uma importância maior à produção teatral aqui comentada.



         Para “tornar vertical”, como gosta de dizer SILVIA MONTE, o que está no papel, a idealizadora do projeto, dramaturga e diretora, se debruçou, exaustivamente, sobre a obra, desde março deste ano, embora já a conhecesse de longa data, e soube observar e costurar os mínimos detalhes de tudo quanto é importante ser mostrado, abrangendo importantes temas diversos, como solidão, juventude, envelhecimento, vida e morte, tudo muito bem explorado por uma das maiores atrizes do TEATRO BRASILEIRO, ANALU PRESTES, que sabe dosar a porção caricata da personagem, quer por seu andar “pelas ruas de São Paulo”, quer pelo intenso e fino trabalho com os olhos e as máscaras faciais, quer pela forma como se dirige a pessoas das plateia, praticamente cobrando-lhes que concordem com ela, utilizando diferentes tons de voz, de acordo com o teor das reclamações. ANALU foi escolhida a dedo, para compor aquela Maria Emília, de uma forma muito bem-humorada, sem exageros, e tocando em todos os assuntos “pesados” de forma leve. É assaz agradável ver aquela mulher ranzinza e “moralista” (Será até o final do livro ou só apenas até a página 5?). A personagem tem uma visão tão deturpada do mundo em que vive, superlativa todas as mazelas que, realmente, existem, em qualquer época, que é capaz de, por meio de sua visão, deformar tudo, até mesmo enxergar, num senhorzinho com sua neta adolescente, um “velho tarado, corrompendo uma menor de idade, uma prostituta”. Daquela mente, sai de um tudo... ANALU PRESTES, que eu, carinhosamente, chamo de "ANALUZ"nos brinda com uma de suas melhores criações. Tanto SILVIA quanto ANALU decodificaram, na medida certa, o tom da escrita agradável de LYGIA.




         Por “n” motivos, e não deveria mesmo ser de outra forma, o espetáculo se resume numa deliciosa montagem intimista, apresentado a, no máximo, 40 privilegiados espectadores, por sessão – uma cumplicidade total atriz/espectadores -, contando com uma única peça de um cenário minimalista, uma cadeira, assinado por ANALU PRESTES, também responsável pelo elegante e sóbrio figurino, “roupa de festa dos anos 1970”. Completam a FICHA TÉCNICA, com suas excelentes colaborações, JOSÉ HENRIQUE MOREIRA, o iluminador, e YAHN WAGNER, criador da trilha sonora incidental. Uma soma de alguns talentos, para produzir um espetáculo que RECOMENDO MUITO.

 

 




FICHA TÉCNICA:

Baseado no conto homônimo de Lygia Fagundes Telles

Idealização: Silvia Monte

Dramaturgia:  Silvia Monte

Direção: Silvia Monte

 

Atuação: Analu Prestes

 

Cenário: Analu Prestes

Figurino: Analu Prestes

Iluminação: José Henrique Moreira

Trilha musical: Yahn Wagner

Direção Musical, Produção e Arranjos: Yahn Wagner

Direção de Movimento: Mari Amorim

Fotografia: Alexia Maltner (divulgação) e Isabelle Oliveira (cena)

Identidade Visual: Gustavo Parrella e Sydney Michelette

Programa: Sydnei Miochetelli (arte) e Silvia Monte (texto)

Assessoria de Imprensa: Leila Grimming

Redes Sociais: Jessica Christina

Direção de Produção: Silvia Monte

Realização e Produção: Terceira Margem Produções Culturais

 




 

SERVIÇO:

Temporada: De 04 de outubro a 10 de novembro de 2024.

Local: Espaço Abu.

Endereço: Avenida Nossa Sra. de Copacabana, nº 249 – Loja E – Copacabana – Rio de Janeiro.

Dias e Horários: De sexta-feira a domingo, às 20h.

Valor dos Ingressos: R$ 100 (inteira) e R$ 50 (meia-entrada).

Vendas na Bilheteria e “on-line”: sympla.com.br

Duração: 50 minutos.

Capacidade: 40 lugares.

Classificação Indicativa: 14 anos.

Informações: (21) 2137-4182   /   2137-4184 (Das 15h às 19h).

espacoabu@gmail.com

@senhor_diretor

@ter_cei_ra_margem

@prestesanalu

@montesilvia

 

 


 

         Além de já ter recomendado o espetáculo, acrescento, fazendo coro a ANALU PRESTES e a SILVIA MONTE, que ESTA PEÇA É UM ESTÍMULO À LEITURA E LEVA QUALQUER ESPECTADOR A QUERER CONHECER A RIQUÍSSIMA E PREMIADA OBRA LITERÁRIA DE LYGIA FAGUNDES TELLES.

 

 



Analu Prestes e Silvia Monte.



FOTOS: ALEXIA MALTNER

e

ISABELLE OLIVEIRA

 

 

 

GALERIA PARTICULAR:

(Fotos: João Pedro Bartholo.)

 

 

 


 

 








Foto da Produção.



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