“NEBULOSA DE
BACO”
ou
(DA ARTE DE
FINGIR
E ACREDITAR
NO
FINGIMENTO.)
ou
À PROCURA
DE UMA IDENTIDADE.
Quase
um mês fora do país e uma necessidade enorme de pôr em dia a minha agenda
teatral no Brasil. Aos poucos, vou conseguindo dar conta dos 26 convites recebidos,
durante o tempo em que estive fora. Não sei se conseguirei assistir a todas as peças. Do dia 23 passado até ontem, consegui
assistir a dez espetáculos, com algumas marcantes frustrações, infelizmente, o que
me causa grande tristeza. Por outro lado, quatro OBRAS-PRIMAS e outras três que quase pintaram no meu caminho com a mesma classificação. Uma dessas
peças impecáveis foi a que assisti na última 4ª feira (30/11/2024), “NEBULOSA DE BACO”, no Teatro
1, recém-inaugurado, após reforma, do CCBB - Rio de Janeiro,
que, muito merecidamente, deveria receber o nome de “Sala Sibéria”, de tão
frio que estava o ambiente. Levem bons agasalhos, porque foi um suplício ser
obrigado a suportar a gélida temperatura do sistema de ar-condicionado, naquela
noite. Deve ter havido algum problema técnico, que espero já tenha sido sanado.
Se o espetáculo não fosse uma OBRA-PRIMA, creio que muita gente
teria deixado o Teatro. Talvez, até mesmo, eu.
Desde
sua estreia, venho recebendo a indicação e os maiores elogios à montagem de “NEBULOSA DE BACO”, mas sempre com uma
advertência, ou sei lá que nome dar a isso: “Não vá, pensando em ‘A
Aforista’, porque é uma coisa totalmente diferente da outra”, dito no sentido de qualidade, em que a segunda ficasse a dever à primeira. “A
outra” é “A Aforista”, com texto e direção de MARCOS DAMACENO, o qual executa as mesmas tarefas na montagem aqui
analisada. Em “A Aforista”, a atriz também era a mesma de agora, ROSANA STAVIS, uma de duas da montagem em tela. Tratava-se “a
outra” de um solo, no qual a atriz era acompanhada por dois pianistas
clássicos, de talento indescritível. Como se eu pensasse que iria ao CCBB
RJ (Teatro 1) para assistir a “A Aforista – 2 – O Regresso da Atriz Fenomenal”. Ainda não cheguei a tal grau de idiotice ou demência.
É
óbvio que eu sabia que a peça era uma segunda proposta, diferente da anterior,
e achava que seria tão boa quanto “a outra”. E era (É) mesmo!!!, ainda
que não haja, em mim, o menor desejo de estabelecer comparações entre as duas, o que seria uma comparação entre duas coisas totalmente díspares. O meu palpite sobre uma excelente qualidade da nova peça da CIA.
STAVIS - DAMACENO existia, sim, já antes de eu ter ido ao Teatro, naquela noite, por conta das duas ou três leituras que havia
feito do “release” da peça, a mim chegado pelas mãos de NEY MOTTA, assessoria de imprensa.
Também achava muito difícil, quase impossível, DAMACENO escrever um texto ruim e, menos ainda, que nos
apresentasse uma direção “quadradinha ou tortinha”. Sobre ROSANA, não pairava a menor dúvida de
que eu assistiria a mais um magnífico trabalho de interpretação uma das
melhores atrizes deste país, sediada em Curitiba. Talvez –
ideia minha - se residisse no eixo Rio/São Paulo, já estivesse até
estrelando algum folhetim global, que lhe renderia muita fama, o que nem sei se
seria seu desejo. ROSANA STAVIS me
pareceu sempre ser uma ATRIZ DE TEATRO; e continua parecendo. Mas é que os “espiões”, os “cata-talentos”, os produtores
de elenco das emissoras de televisão, alguns meus amigos, costumam frequentar
mais os Teatros do Rio de Janeiro e de São
Paulo.
A minha grande
dúvida, na FICHA TÉCNICA da peça,
tinha nome e sobrenome: HELENA DE JORGE
PORTELA, que nem nome de atriz me parecia ter - lembrava-me mais nome de personagem de novela de TV - e que, até tê-la visto em
cena, não passava de uma ilustre desconhecida para este crítico. Acontece que,
naquela noite, meus olhos, ouvidos e o coração inteiros tiveram que se dividir
entre a beleza do texto, a sua milimetricamente medida arquitetura teatral; a
direção; os demais elementos de criação; e, sobretudo dois talentos
indiscutíveis: ROSANA STAVIS e HELENA DE JORGE PORTELA.
Quando soube que a peça teria duas atrizes e que uma delas seria ROSANA STAVIS, pensei em quem poderia dividir o palco com aquela diva das tábuas. Vieram-me, aleatoriamente, à cabeça alguns nomes, mas achei que nenhuma delas, por motivos vários, aceitaria o convite. Não conhecia HELENA e fiquei, deveras, curioso, para saber quem teria “pique!” e coragem, para, em cena, trocar passes com a consagrada ROSANA, vencedora de tantos prêmios e indicações a outros, mas, depois de ter assistido à montagem, cheguei à conclusão de que não poderiam ter encontrado companheira de cena mais bem preparada do que HELENA DE JORGE PORTELA.
SINOPSE:
A peça traz à cena duas
mulheres, expondo a “confusão” de serem elas mesmas, mas também de serem outras,
inventadas, atrizes, vivendo outras realidades, que, às vezes, são mais
verdadeiras do que a própria verdade.
A dramaturgia parte da “confusão”
provocada pelo excesso de informações, de muitas situações acontecendo ao mesmo
tempo, tudo embaralhado, e a velocidade com que nós, consumidores desse excesso
de mídias, sem moderação, temos que processar o que passa da medida.
Assim, a peça discute
manipulações mentais e abusos emocionais, em diferentes situações, que todos
nós sofremos, em tempo real.
Em “NEBULOSA DE BACO”, duas mulheres, que também são atrizes, estão em seus “habitats naturais” – que são as salas de ensaio, “espaços fascinantes, de caos e criação”, para MARCOS DAMACENO, diretor da peça, onde atrizes, reconhecidamente fortes, revelam suas fragilidades e inseguranças – com a tarefa de convencer a si mesmas a acreditar em si mesmas, ao mesmo tempo em que tentam entender e dar andamento aos preparativos de uma peça, que se equilibra entre o riso e o choro, repleta de confusões e ansiedades, próprias da cabeça de todo ser humano do século 21, entre o que é e o que não é, o que parece que é, mas também não é, entre o que é verdade e o que é manipulado, ou mera narrativa, entre o que é realidade e o que é ficção, ou imaginação.
Não é uma SINOPSE simples de ser compreendida, o
que exige, mais ainda, a atenção do espectador, no decorrer da encenação. É um
texto extremamente inteligente, "complicado", contudo simples de ser entendido, quando sai das
bocas da dupla de atrizes, e que conduz o leitor a nenhuma “confusão” de verdade.
Esta é apenas aparente; antes, provoca, em quem assiste à peça, muito material
para reflexões e superlota de informações importantíssimas as nossas cabeças, tão
iguais às daquelas duas personagens fantásticas, por meio das quais o autor do
texto não poupou a oportunidade de criticar os próprios atores, cobrando-lhes
mais coerência e menos fantasia, na construção dos personagens. Durante 80
minutos, não se ouve o nome de nenhuma das duas personagens. Isso,
porque uma é “A Atriz” e a segunda, “A Outra Atriz”. Vejo nessa
determinação do autor a ideia de criar “carapuças elásticas” que possam
caber nas cabeças de quaisquer atores/atrizes.
Ouvi, antes de ter ido ver a peça, um ou outro comentário improcedente com relação ao tempo de duração da peça (80 minutos), nada absurdo; porque, em determinados momentos “o texto se torna chato”, repetitivo; poderiam ter cortado algumas coisas”. Tais comentários são desprovidos de bom senso, apreciação estética e mais uma porção de outras carências, as quais não permitem a essas poucas pessoas – mas elas existem – a percepção de que tudo - absolutamente tudo – o que é dito e repetido se faz necessário, tem um porquê. E que é exatamente essa repetição que pode fazer parecer mais longo o texto. Mas todas as falas são justíssimas, perfeitas; e, acima de tudo, necessárias.
MARCOS DAMACENO teve a brilhante ideia de
criar uma dramaturgia em que duas mulheres, duas atrizes, uma explicitamente apresentada;
outra sugerida, como uma “coach” - palavra do momento, que eu
odeio e que me remonta a “cocheira” - parecem agir e ser de formas
diferentes, entretanto têm os mesmos interesses e guardam os mesmos vícios dos
atores, suas fraquezas e incertezas, em geral. Como convencer o outro, a sua parceria cênica, de que ele/a está diante de alguém que não existe, mas está no
palco, sendo outra pessoa. Alguém que não é ele/a mesmo/a, mas que também não é
o outro? Como alguém pode se convencer, primeiro a si próprio, para, depois, aos
pagantes, os quais podem ter ido ao TEATRO para dormir (Adorei
a crítica.) e/ou para chorar. Ou, talvez, para passar o tempo ou fazer as
vezes de acompanhante de alguém? Como convencer alguém de que TEATRO
é uma “verdade de brincadeirinha”?
Como
sou amante da metalinguagem, não tinha como não vibrar de alegria diante
daquela encenação. Ver o TEATRO dentro do TEATRO. E como também me agrada o que
hoje “está
na moda”, o chamado TEATRO autoficcional, uma forma de
encenação que utiliza relatos pessoais como instrumento criativo! Na autoficção,
o autor explora o teor de uma biografia, por meio do texto ficcional, sendo que
sempre é o texto literário que está em primeiro plano. Nesse tipo de TEATRO, o ator intensifica o seu eu,
enaltecendo as suas próprias características, para colocá-las em cena. O
objetivo é tornar-se o mais eu possível, para que ocupe toda a sala de TEATRO
e alcance o público. É tentar fazer como, por meio de uma “verdade
maior”, a emoção domine, mais rápida e fortemente, o espectador.
No que diz
respeito à receptividade do público, com relação ao TEATRO autoficcional, parece
que as plateias, cada vez mais, vêm preferindo histórias reais, vividas pelos
próprios de um elenco, a saborear puras ficções, saídas de uma mente fértil e
brilhante de um “inventor de histórias”, por mais curiosas e interessantes que
sejam. O público parece estar mais "voyeur" que nunca. NEBULOSA DE BACO” é um ótimo
exemplo de tudo isso, em que características já inseridas totalmente no TEATRO
moderno, atraem o público, tudo reunido num texto só; num excelente texto só,
que consegue amalgamar discussões sobre manipulações mentais e abusos
emocionais, em diferentes situações, que todos nós sofremos, em tempo real.
A direção
está em total consonância com as propostas do texto, não fossem o autor
e o diretor
a mesma pessoa. As marcações são acertadíssimas e a ideia de levar as ações
para uma sala de ensaios, como cenário, também criado por DAMACENO (Salas de ensaio = espaços fascinantes de caos e criação, segundo
DAMACENO.), não poderia ter sido melhor pensada. Afinal de contas, é
nessas salas que brotam e florescem as produções teatrais. Como está no já
citado “release”, são elas os “habitats naturais” dos atores,
diretores e artistas de criação. São como um “útero teatral” onde é
gestado um “filho”. Há todo um clima especial para que “duas
mulheres, que também são atrizes, reconhecidamente fortes, revelem suas
fragilidades e inseguranças – com a tarefa de convencer a si mesmas a acreditar
em si mesmas, ao mesmo tempo que tentam entender e dar andamento aos
preparativos de uma peça, que se equilibra entre o riso e o choro, repleta de
confusões e ansiedades próprias da
cabeça de todo ser humano do século 21; entre o que é e o que não é; o que
parece que é, mas também não é; entre o que é verdade e o que é manipulado; ou
mera narrativa, entre o que é realidade e o que é ficção, ou imaginação.”
(Texto, quase repetitivo – entrei na onda - extraído do “release”, com pequenas
adaptações.)
O espectador
pode, com esta peça, tentar entender, um pouco, o que se passa na cabeça de um
ator, durante o processo de dar vida a um personagem, até que ponto o artista
consegue administrar uma determinada “confusão mental”, ainda que sem
exageros. É preciso pôr rédeas na “confusão” de serem elas mesmas, mas
também de serem outras, inventadas. No caso, aqui, são duas atrizes, vivendo
outras realidades, que, às vezes, são mais verdadeiras do que a própria
verdade.
O interessante
nome do espetáculo tem inspiração na astronomia e na mitologia. As nebulosas
são onde nascem as estrelas, são os berços das estrelas. Assim, o “NEBULOSA DE BACO”, da Cia. Stavis-Damaceno,
é o lugar onde nascem as estrelas de TEATRO,
sendo Baco (romano) o deus do TEATRO, equivalente a Dionisio
– grego).
Passam, com louvor e total facilidade, pelo meu modesto crivo todos os elementos que, reunidos,
ergueram este espetáculo. Só para, também ser
repetitivo, muito intencionalmente, o texto é um primor,
assim como a direção, a cenografia. E quando BETO BRUEL nos deu, dá ou dará motivos
para críticas negativas aos seus trabalhos? Jamais!!! A luz
de BRUEL funciona da forma mais
objetiva e criativa possível, além de, plasticamente, linda e funcional. KAREN BRUSTOLIN optou por um figurino
único, para “A Outra Atriz”, visto que a personagem já traz prontos os seus
conceitos sobre o TEATRO e o que é “ser atriz”. Pelo menos, aparenta.
Roupa de trabalho, de ensaio. Por outro lado, numa das laterais do palco, como
parte do cenário, vê-se uma “arara”, com várias sofisticadas
peças de vestuário, assim como perucas, botas e outros acessórios. Esse
guarda-roupa não está lá por acaso. “A Atriz”, durante o ensaio, troca
de “looks”
algumas vezes, como se, por meio de experimentos, procurasse uma ajuda, para o encontro e a criação de sua personagem, o que me faz lembrar muitos amigos meus, atores e
atrizes, que vivem a repetir que só encontram o tom correto do personagem
depois de já dentro do figurino, o que, para mim, pelo
menos, faz sentido, pois já vivi tal experiência.
Reservei,
para o final, os comentários sobre o trabalho da dupla de atrizes. Não
há protagonistas, porque ambas se apresentam assim, em tal posição. De ROSANA STAVIS, não esperava outra
coisa, pelo conjunto de sua obra, uma atriz que dispensa epítetos, visto que todos
os positivos, que já existem registrados oficialmente, lhe cabem e ainda sobra
espaços para outros, que possam surgir, em forma de neologismos. ROSANA se metamorfoseia no palco, uma
verdadeira atriz camaleônica, que, por hábito da profissão, dos muitos anos “de janela”,
mantém, em qualquer espetáculo, um equilíbrio, total controle de corpo, expressões
faciais e voz marcantes e expressivíssimas. Isso não seria nenhuma novidade ver
no palco. E eu vi. E aplaudi.
O que me
deixou pasmo, no melhor sentido possível, e extremamente feliz e me vendo mais recompensado, ainda, por
ter assistido à peça, foi ter constatado que HELENA DE JORGE PORTELLA atua como uma “sombra” de ROSANA, seguindo os seus passos, em
tudo de positivo que vem da veterana atriz. Que atriz esplêndida é HELENA, a qual já entrou para a minha
seletíssima cadernetinha com os nomes de grandes artistas. É linda e tem uma
postura cênica invejável. Uma voz que é um bálsamo para os nossos ouvidos. Ela já é uma moça alta, em termos de estatura, mas a atriz/personagem "crescem" em
cena. Sua preparação para interpretar “A Atriz” não lhe poupou esforços e
cobranças, e o resultado é o melhor possível, no conjunto final do espetáculo.
FICHA TÉCNICA:
Texto: Marcos Damaceno
Direção: Marcos Damaceno
Elenco: Rosana Stavis e Helena de Jorge Portela
Cenário: Marcos Damaceno
Figurino: Karen Brusttolin
Iluminação: Beto Bruel
Visagismo: Claudinei Hidalgo
Produção Executiva: Bia Reiner
Produção de Cenários: Carla Berri
Assistente Administrativo / Financeiro: Edilaine Maciel
Produção Local (RJ): Bárbara Montes Claros
Assessoria de Imprensa: Ney Motta
Fotos: Renato Mangolin (fotos oficiais) e Nanda Rovere (avulsas)
Criação e Produção: Cia. Stavis - Damaceno
SERVIÇO:
Temporada: De 12 de outubro a 24 de novembro de 2024.
Local: Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB Rio de Janeiro) – Teatro I.
Endereço: Rua Primeiro de Março, nº 66 – Centro - Rio de Janeiro.
Informações: (21) 3808-2020 | ccbbrio@bb.com.br
Dias e Horários: De 4ª feira a sábado, às 19h; domingo, às 18h.
Valor do ingresso: R$ 30 (inteira) e R$15 (meia-entrada). (Estudantes,
maiores de 65 anos e Clientes Ourocard pagam meia-entrada.)
Ingressos adquiridos na bilheteria do CCBB ou antecipadamente pelo site
https://ccbb.com.br/rio-de-janeiro
Funcionamento do CCBB Rio: De 4ª feira a domingo, das 9h às 20h (Fecha
às 3ªs feiras).
bb.com.br/cultura.com.br | facebook.com/ccb
Duração: 80 minutos.
Classificação Etária: 18 anos.
b.rj | instagram.com/ccbbrj | tiktok.com/@ccbbcultura
Atendimento à Imprensa: Ney Motta | Contemporânea Comunicação e Cultura
- Assessoria de imprensa para Artes e Espetáculos.
Assessoria de Imprensa CCBB RJ: Giselle Sampaio -
gisellesampaio@bb.com.br | 21
Nada mais a
comentar, apenas a minha "intimação": Não deixem de assistir a mais esta
grande montagem do casal ROSANA STAVIS e MARCOS DAMACENO! Recomendo muito o espetáculo!!!
FOTOS: RENATO MANGOLIN (Oficiais)
(Fotos adicionais: Nanda Rovere.)
GALERIA PARTICULAR:
VAMOS AO TEATRO!
OCUPEMOS TODAS AS SALAS DE
ESPETÁCULO DO BRASIL!
A ARTE EDUCA E CONSTRÓI, SEMPRE; E
SALVA!
RESISTAMOS SEMPRE MAIS!
COMPARTILHEM ESTA CRÍTICA, PARA
QUE, JUNTOS, POSSAMOS DIVULGAR O QUE HÁ DE MELHOR NO TEATRO BRASILEIRO!
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