“NÃO ME ENTREGO, NÃO”
OU
(UMA
CELEBRAÇÃO!)
OU
(UMA AULA DE
VIDA
PROFISSIONAL!)
OU
(UM ODE À
VIDA
E AO TEATRO.)
91 anos de idade, mais de 7 décadas de
profissão. E lá estava, à minha frente, a menos de dez metros, um
homem
das artes. Um homem da nobilíssima arte de representar. E eu me esforçava
para enxergar ali apenas um artista, um ator, mas não era só isso o que eu via
naquele palco; era como se eu estivesse diante de uma “entidade”, vivenciando
uma “epifania.
E a minha emoção atingiu os píncaros da Acrópole de Atenas. Acomodado na
quinta ou sexta fila do Teatro Vannucci, eu era, ao mesmo
tempo, um amante de TEATRO, um crítico teatral e um ardoroso fã de um artista;
agora, do homem também. Seu nome: OTHON BASTOS.
Até agora, pergunto-me se, naquela noite de 21 de
junho próximo passado (2024), assisti mesmo a uma peça de TEATRO.
Não parecia uma representação, uma interpretação de um texto dramático, embora
o fosse. Era um homem escancarando seu coração e falando a mais de 400
pessoas, que superlotavam o Teatro, com total lucidez e profunda
paixão sobre sua vida pessoal e sua magnífica trajetória pelos palcos, “sets”
de filmagem e estúdios de TV, no Brasil e até no exterior.
A ideia do espetáculo partiu, há bem pouco tempo, do próprio
OTHON, que, junto ao amigo de
décadas, FLÁVIO MARINHO, manifestou
o desejo de se ver num monólogo, o primeiro de sua longeva carreira artística,
no qual se propunha a fazer exatamente o que faz naquele palco: conversar com a
plateia e satisfazer a porção curiosa de todos os seres humanos. Senti-me num
ambiente acadêmico, ouvindo uma “master class” de VIDA
e de TEATRO,
mas sem a pompa que caracteriza essas ocasiões. Por 90 minutos, o público se
sente invadindo, no melhor dos sentidos, a intimidade de um homem e sua ARTE.
Ante o desejo do querido amigo, FLÁVIO
MARINHO escreveu o texto do espetáculo, que também
dirige. O roteiro, mais que uma dramaturgia, propriamente dita, nasceu da
leitura de um calhamaço de mais de 600 páginas de anotações do
próprio punho do ator, entregue ao autor, contendo informações sobre os principais
acontecimentos da existência de OTHON. O
produto final do texto foi atingido, após uma minuciosa pesquisa de FLÁVIO. Considerando-se a vasta carreira e a coleção de títulos
marcantes no cinema e no TEATRO – a TV ficou de fora -,
imagino o trabalho de MARINHO, na seleção do que poderia interessar ao público, assim
como a sua tristeza por ter que deixar de fora um importante aspecto ou outro
da vida e do ofício de OTHON BASTOS,
sob o risco de criar um solo com algumas horas de duração. Afinal, só na
televisão, de 1956 a 2024,
foram mais de 80 trabalhos, entre novelas, teleteatro, séries,
minisséries, casos especiais e outras participações. No cinema, de 1962
(“O Pagador de Promessas”) até hoje, são cerca de 80 filmes, com
destaque para o icônico “Deus e o Diabo na Terra do Sol” e “O
Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro”, ambos dirigidos por Glauber
Rocha. No TEATRO, de 1950 até os dias de hoje, OTHON reúne outros tantos títulos, tendo
representado, como um grande ator eclético, os mais importantes dramaturgos, como Shakespeare, Gil
Vicente, Augusto Boal, Strindberg, Tchékhov, Gorki,
Guarnieri,
Tennessee
Williams, Ariano Suassuna, Maria Clara Machado, Brecht
e Oswald
de Andrade. para citar alguns. De todos os seus espetáculos teatrais, dois me marcaram
indelevelmente: “Um Grito Parado no Ar”, de Gianfrancesco Guarnieri (1973)
e “Murro
em Ponta de Faca”, de Augusto Boal (1978). Fiquei muito
feliz, saboreando OTHON declamar
parte da letra da canção-título de “Um Grito...”, peça à qual assisti
algumas vezes. Mais feliz ainda, quando, terminada a peça, deixamos o Teatro
ao som da gravação original, de Toquinho, para a referida canção,
que sei cantar até hoje. O refrão: “QUEM SOUBER DE ALGUMA
COISA VENHA LOGO ME AVISAR. SEI QUE HÁ UM CÉU SOBRE ESSA CHUVA E UM GRITO PARADO
NO AR.”. No cinema, minha preferência recai sobre “São
Bernando”, um filme de Leon Hirzsman (1972). A sequência
final, que corresponde ao último capítulo da obra de Graciliano Ramos, é um
primor de direção e atuação.
Sem querer dar qualquer
tipo de “spoiler”, quero agradecer a uma certa professora, por seu
equivocado vaticínio. Se ela tivesse que trocar o magistério por consultas de
cunho “ocultista”, teria morrido de fome. E também confessar que
fiquei muito emocionado com a declaração de amor que o ator faz a sua esposa,
há 57 anos, Martha Overbeck.
Sempre acho que os
grandes artistas brasileiros não recebem o merecido reconhecimento, por parte
da imprensa e, até mesmo, do grande público; principalmente em vida. Apesar das
suas várias nomeações a prêmios de TEATRO e cinema, tendo vencido muitos,
continuo achando que OTHON BASTOS merecia muito mais.
O “release” da peça, que recebi
de BRUNO MORAIS (Marrom Glacê – Assessoria de Imprensa”),
diz que OTHON é considerado “o
maior ator brasileiro vivo”. Confesso que não sou muito chegado a essa
história de “o/a mais isso ou aquilo” e jamais havia pensado nisso, porém,
depois de ter lido isso, fiz um exercício de memória, levando em consideração a
idade dos atores ainda em atividade e acabei me rendendo a tal consideração. Que ainda possamos vê-lo atuando por mais tempo, até porque, do ponto de
vista da resistência física, o ator “está em forma”. Não é fácil, para um
homem de 91 anos, ficar em cena, durante
uma hora e meia, sem parar de falar e se movimentar - até pulinhos ele dá -, e sair da sessão cansado, evidentemente,
mas inteiro, a ponto de se dispor a receber os amigos e tirar fotos com quem
as solicita a ele.
Apenas a memória, às vezes parece falhar. Ou seria “fake”? Mas, para auxiliá-lo a se lembrar do texto, há, em cena, a presença da atriz JULIANA MEDELLA, que representa a sua “memória”. Ela também é a assistente de direção da peça.
Acho bem interessante o formato da peça, dividida em blocos temáticos: trabalho, amor, TEATRO, cinema, política..., cujas reflexões envolvem citações e referências de alguns dos autores mais importantes do mundo. "A peça é uma lição de vida e de resiliência, de como enfrentar os duros obstáculos que se apresentam em nossa existência - e como superá-los.".
E pensar que os primeiros trabalhos de OTHON, desde seus 11
ou 12 anos, foi para substituir algum outro ator... Mas é o próprio ator que
diz: “O Chico Xavier já dizia que se uma coisa é sua, ela te
encontra, não é preciso se preocupar.”. Eu diria que, com relação a OTHON BASTOS e o TEATRO, ambos se procuraram; e se encontraram.
Recuso-me, terminantemente, a perder um segundo sequer para
analisar o trabalho de OTHON BASTOS em cena. "Não tenho nem roupa para isso". Minha ousadia e impertinência não chegariam a tanto. OTHON BASTOS é o suprassumo da perfeição.
Deixo, então, para ocupar meu tempo com algumas observações sobre os demais
elementos que entram numa produção de TEATRO, como a cenografia, por exemplo, que, aqui, na FICHA TÉCNICA é chamada de direção de arte, assinada por RONALD TEIXEIRA. Logo que adentrei o salão do Teatro e me deparei com
aquele estupendo painel ao fundo do palco, não tive olhos para mais nada.
Que obra tocante, sensível, delicada, de bom gosto e muito bem acaba é o trabalho do artista! Quadros de artes e cenas de filmes e
peças marcantes na vida do ator formam um painel belíssimo, em molduras
deslumbrantes, a valorizar cada uma daquelas imagens. Depois do impacto dessa
primeira visão, detive-me numa cadeira de diretor de cinema no meio do palco
e, ingenuamente, pensei: um homem de 91 anos não pode ficar em pé o tempo inteiro
da peça. É bem provável que ficará o maior tempo de duração do espetáculo
sentado nela. Ledo engano!. Ele a utiliza muitíssimo menos tempo do que imaginei Há, também num dos cantos do palco,
um cabide de pé. Na outra extremidade, uma carteira escolar, onde a atriz
que faz “memória” fica sentada, atenta, durante, praticamente, todo o espetáculo;
o “ponto” do ator. Considero muito interessante a escolha de uma carteira
escolar: é uma discípula diante de seu mestre.
Não vi, na FICHA TÉCNICA, o nome de ninguém responsável, especificamente, pelo elegante figurino usado pelo ator. Certamente, foi criado por RONALD TEIXEIRA, dentro da rubrica "direção de arte". FERNANDO OCASIONE assina o visagismo do espetáculo e LILIANE SECCO, sempre presente nas montagens de FLÁVIO MARINHO, é responsável pela correta trilha sonora do solo. A luz, de PAULO CESAR MEDEIROS, dispensa qualquer comentário, de tão correta e bonita. Quanto à direção, de FLÁVIO MARINHO, também muito ela me agradou, mas fiquei com a impressão de que, diante daquele monumento de ator, o diretor não teve muito o que fazer, a não ser deixá-lo livre para o voo. Fosse eu o diretor da peça, diria a OTHON: "Fique à vontade! O palco é todo seu! Estou aqui apenas para aplaudi-lo".
FICHA TÉCNICA:
Texto e Direção: Flavio Marinho
Elenco: Othon Bastos
Diretora Assistente e
Participação Especial: Juliana Medella
Direção de Arte: Ronald
Teixeira
Iluminação: Paulo Cesar
Medeiros
Visagismo: Fernando
Ocazione
Trilha Sonora: Liliane
Secco
Programação Visual:
Gamba Júnior
Fotos: Beti Niemeyer
Alfaiataria: Macedo Leal
Coordenação de Produção:
Bianca De Felippes
Consultoria Artística:
José Dias
Assessoria de Imprensa:
Marrom Glacê Comunicação
Assessoria Jurídica:
Roberto Silva
Coordenador de Redes
Sociais: Marcus Vinicius de Moraes
Assist. de Diretor de
Arte: Pedro Stanford
Assistente de Produção:
Gabriela Newlands
Administração: Fábio
Oliveira
Desenho de Som e
Operador: Vitor Granete
Operador de Luz: Marco
Cardi
Contrarregra: Paulo
Ramos
Realização: Marinho
d’Oliveira Produções Artísticas
SERVIÇO:
Temporada: De 14 de
junho a 28 de julho de 2024 (Observação: Não haverá espetáculo no dia 05/07.).
Local: Teatro Vannucci.
Endereço: Rua Marquês de
São Vicente, nº 52 – Shopping da Gávea – 3º piso – Gávea – Rio de Janeiro.
Telefone: (21) 2274-7246.
Dias e Horários: 6ª
feira, às 20h; sábado, às 20h30; domingo, às 20h.
Valor dos Ingressos: 6ª
feira e domingo: R$ 50 (meia-entrada) e R$ 100 (inteira); sábado: R$ 60
(meia-entrada) e R$ 120 (inteira).
Classificação Indicativa: 12 anos.
Duração: 90 minutos.
Gênero: Monólogo.
RECOMENDO, SEM PESTANEJAR, O ESPETÁCULO E JÁ
AGENDEI UMA DATA PARA REVÊ-LO. Saí do Teatro Vannucci com a
convicção de que vivenciei ali um dos momentos mais lindos e importantes, para
mim, no TEATRO BRASILEIRO. E
mais: penso que todos os grandes atores e atrizes vivos, evidentemente,
deveriam seguir o exemplo de OTHON
BASTOS e abrir o seu baú de recordações e compartilhá-lo com quem os ama e
admira. E mais esta: Todas as escolas de formação de atores da atualidade deveriam obrigar seus alunos a assistir a este espetáculo. Tenho dito!
FOTOS: BETI NIEMEYER
VAMOS AO TEATRO!
OCUPEMOS TODAS AS SALAS DE
ESPETÁCULO DO BRASIL!
A ARTE EDUCA E CONSTRÓI, SEMPRE; E
SALVA!
RESISTAMOS SEMPRE MAIS!
COMPARTILHEM ESTA CRÍTICA, PARA
QUE, JUNTOS, POSSAMOS DIVULGAR O QUE HÁ DE MELHOR NO TEATRO BRASILEIRO!
Nenhum comentário:
Postar um comentário