segunda-feira, 12 de setembro de 2022

 

“BELCHIOR – 

ANO PASSADO,

EU MORRI,

MAS, ESSE (SIC) ANO,

EU NÃO MORRO

– O MUSICAL”

ou

(UMA JUSTA E MERECIDA HOMENAGEM.)

ou

("AMAR E MUDAR AS COISAS ME INTERESSAM MAIS".)


 

        Apesar de bastante assoberbado, consegui encontrar um tempo para escrever um pouco sobre este espetáculo, que merece ser visto. Será uma crítica breve - espero -, mas direi o suficiente para procurar motivar os que me leem a uma ida ao Teatro Dulcina, onde o musical está em cartaz (VER SERVIÇO.).



    A vitoriosa trajetória desta montagem começou em 2019, quando, pela primeira vez, a peça foi encenada, em abril daquele ano, lotando, sempre, o Teatro João Caetano, no Rio de Janeiro. Até o presente momento (Há temporadas agendadas pelo Brasil afora até dezembro deste ano, após a que está em curso.), o espetáculo já foi aplaudido por mais de 20 mil pessoas, em importantes Teatros do Brasil, como o belíssimo Theatro José de Alencar, em Fortaleza (CE); o Theatro Via Sul, também em Fortaleza; o Teatro Liberdade, em São Paulo (SP); a Sala Municipal Baden Powell, no Rio de Janeiro (RJ); o Teatro Rival, também no Rio, entre outros.



      Para que possam ter uma ideia da qualidade do espetáculo, basta dizer que a peça passou pelo crivo da família do cantor, a qual lhe deu o aval e ficaram muito felizes com o resultado mostrado no palco. Seus filhos, Camila e Mikael Henaman Belchior, fizeram a seguinte declaração: Nos emocionamos em ver uma produção, sobre a obra do nosso pai, tão alinhada com a proposta artística dele. O foco nas palavras de BELCHIOR, tanto de músicas quanto de entrevistas, enaltece o compromisso do espetáculo com a sua filosofia. Desejamos vida longa ao musical e que ele alcance o Brasil inteiro. Parabéns a todos, pelo lindo trabalho e empenho!”.

 


 

SINOPSE:

O musical faz um recorte da juventude do cantor e compositor BELCHIOR, através de uma dramaturgia formada por trechos de entrevistas do próprio cantor.

Entrelaçando seus pensamentos acerca de um mundo desconcertado, revive apresentações de seu “show” em diversas fases da vida.

Na história, o ator e cantor PABLO PALEOLOGO vive o cantor cearense, enquanto BRUNO SUZANO interpreta o “CIDADÃO COMUM”, personagem recorrente, nas canções de BELCHIOR e, de certa forma, seu “alter ego”.

 

 



        Faço coro às palavras dos dois irmãos, filhos de BELCHIOR, visto que, ainda que eu faça algumas pequenas restrições à montagem, não se trata, apenas, de mais uma biografia, em cena, o que, via de regra, não gera bons resultados. De acordo com o diretor do espetáculo, PEDRO CADORE, Mais do que sua biografia, a peça pretende mostrar, ao espectador, a filosofia de um dos ícones mais misteriosos da Música Popular Brasileira. Queremos trazer uma sessão de nostalgia aos fãs e aos que não conhecem sua poesia inigualável.”.

        E, para aqueles que não conhecem a pessoa e a obra de BELCHIOR, principalmente as gerações mais novas, as quais, infelizmente, a meu juízo, não conhecem a verdadeira MÚSICA POPULAR BRASILEIRA, com raras exceções, acho importante falar um pouco sobre o homenageado, utilizando-me de informações que eu já havia adquirido, ao longo de minha vida, e outras, pesquisadas.



 Antônio Carlos Gomes BELCHIOR, foi cantor, compositor, músico, produtor, artista plástico e professor . “Jogava nas onze posições o rapaz”. Um nome importantíssimo para a MÚSICA POPULAR BRASILEIRA. Ao lado de alguns amigos, conhecidos como o “Pessoal do Ceará” - Fagner, Ednardo, Amelinha e outros -, BELCHIOR foi um dos primeiros cantores de MPB do nordeste brasileiro a fazer sucesso internacional, em meados da década de 1970. Aliás, mesmo eu considerando ótimos seus amigos do “Pessoal”, foi ele, na minha modesta opinião, quem mais se destacou e se manteve na memória dos brasileiros, até hoje, gravado pelos maiores intérpretes da nossa música, com destaque para Elis Regina.

Seu álbum "Alucinação", de 1976, produzido por Marco Mazzola, é considerado, por vários críticos musicais, como um dos mais revolucionários da história da MPB e um dos mais importantes, de todos os tempos, para a música brasileira. Participou de vários Festivais de Música, venceu alguns e ficou como finalista em outros, o que lhe conferiu grande visibilidade.



        Natural do interior cearense, Sobral, em 1962, mudou-se para Fortaleza, onde estudou Filosofia, que ele tanto aplica em suas belas e profundas letras. A seguir, optou por vivenciar um período de disciplina religiosa, vivendo em comunidade com frades italianos, no mosteiro Guaramiranga, onde aprimorou seu latim, que ele utiliza em trechos de algumas canções, italiano e canto gregoriano. Após isso, regressou a Fortaleza, onde estudou Medicina, mas abandonou o curso no quarto ano, em 1971, para dedicar-se à carreira artística. Nesse mesmo ano, mudou-se para o Rio de Janeiro. Em São Paulo, para onde se transferiu, no ano seguinte, compôs canções para alguns filmes de curta metragem, continuando a trabalhar, individualmente e, às vezes, em grupo.



Elis Regina foi uma espécie de “fada madrinha”, para BELCHIOR, gravando muitas de suas canções, tornando-o muito mais conhecido e abrindo-lhe as portas para o sucesso. Foram canções como "Mucuripe", composta em parceria com Fagner, "Velha Roupa Colorida", “Apenas um Rapaz Latio-Americano” e "Como Nossos Pais", por exemplo. Esta se tornou um dos maiores ícones do nosso cancioneiro.



Durante muito tempo, BELCHIOR se tornou quase uma “lenda”, em função de um desaparecimento do convívio público e social. Muito se especulou sobre esse fato. O grande artista morreu em 30 de abril de 2017, aos 70 anos, na cidade de Santa Cruz do Sul, no Rio Grande do Sul, muito distante de sua terra natal, onde foi sepultado, um de seus desejos em vida. A causa da morte foi a ruptura de um aneurisma da aorta, a principal artéria do corpo humano.



Em suas canções, como bom filósofo (Popular, entendido por todos, de qualquer escolaridade.), o compositor sempre fez críticas ao “status quo” e nunca deixou de demonstrar sua fé, ingênua, talvez, mas muito poderosa, no seu entender, no povo brasileiro. E a maior prova disso está no trecho da canção “Sujeito de Sorte”, de onde foi retirada uma estrofe, para ajudar a compor o título deste musical: “Tenho sangrado demais / Tenho chorado pra cachorro / Ano passado, eu morri / mas, esse (sic) ano, eu não morro”. Isso pode ser completado com outra estrofe da mesma canção: “E tenho comigo pensado / Deus é brasileiro e anda do meu lado / E assim já não posso sofrer / No ano passado”. Ou seja, não posso lutar contra o que já passou, mas, daqui para frente, não vou permitir mais que me “façam de cachorro”.



O espetáculo ora encenado retorna aos palcos com novos textos e músicas, para “celebrar a poética do compositor”dirigido por PEDRO CADORE, que também assina a organização de textos, ao lado de CLÁUDIA PINTO. Além dos dois atores em cena, PABLO PALEOLOGO e BRUNO SUZANO, uma banda, ao vivo, com quatro músicos: EMÍLIA B. RODRIGUES (bateria), RICO FARIAS (violão/guitarra), SILVIA AUTUORI (baixo/violino) e THOMAS LENNY (teclado). No repertório, apenas sucessos, "hits" como “Alucinação”, “Apenas Um Rapaz Latino Americano”, “A Palo Seco”, “Na Hora do Almoço”, “Todo Sujo de Batom”, “Coração Selvagem”, “Medo de Avião”, “Mucuripe”, “Como Nossos Pais”, “Paralelas”, “Velha Roupa Colorida”, “Sujeito de Sorte”. Nenhuma das letras de BELCHIOR traz um conteúdo “raso”; muito pelo contrário, são todas muito profundas, políticas, no sentido mais amplo da palavra, e, ao mesmo tempo, recheadas de um lirismo incomensurável. A utilização delas, no “set list” desta montagem, justifica as palavras do diretor da peça: Com o espetáculo, queremos marcar o resgate de Antônio Carlos BELCHIOR, trazendo à tona seu discurso ainda atual em relação à política brasileira. O cantor acreditava na potência transformadora da arte na vida das pessoas e, diante de um cenário repleto de insegurança sobre o futuro, a voz desse belíssimo poeta se faz necessária, para pensarmos um novo mundo.”. Uma mensagem irrefutável!



Já vinha ouvindo muitos comentários favoráveis a respeito deste espetáculo, porém confesso que "tenho sempre um pé atrás", com relação a musicais biográficos, e cabava priorizando outros espetáculos, por não ter tempo de assistir a tudo; não consigo atender a todos os convits, embora o desejasse. Mas o que acontece neste trabalho é que ele não é um musical biográfico, propriamente dito, e sim um espetáculo com músicas, que não se propõe a falar da vida do homenageado, mas, sim, mostrar um homem e seu tempo, seu pensamento diante do mundo em que viveu e no qual ainda vivemos (“Ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais.”). Não há a menor intenção de marcar, no tempo cronológico, fatos da vida de BELCHIOR, mas, sim, a de homenagear uma pessoa que, com sua ARTE, tentou abrir nossos olhos para o perigo iminente (“Por isso cuidado, meu bem / Há perigo na esquina”). E, também, é muito pertinente, quando, em 1976, preconizava que “É você que ama o passado / E que não vê / Que o novo sempre vem”, ou, ainda em 1976, com “Você não sente, não vê, mas eu não posso deixar de dizer, mau amigo / Que uma nova mudança, em breve, vai acontecer” (A plateia entende o recado e aplaude em cena aberta.) e “No presente, a mente, o corpo é diferente / E o passado é uma roupa que não nos serve mais”.



Não há, propriamente, uma dramaturgia, neste espetáculo, visto que se trata de um trabalho de colagem de um material garimpado, reunindo as letras das canções e depoimentos e entrevistas de BELCHIOR, mas, se não há uma dramaturgia "concreta", há um belo trabalho de seleção do que deveria ser dito ao público, falado ou cantado.

Sempre considerei BELCHIOR muito mais um intérprete que um cantor, tecnicamente falando, além de um grande poeta / compositor, o que não lhe tira o brilho, da mesma forma como analiso o trabalho de PABLO PALEOLOGO, interpretando o cantor. PABLO dá umas “escorregadas”, às vezes, quando “canta”, e tem a liberdade de fazê-lo, de falar, até, em certos momentos, a letra, em vez de cantar. BELCHIOR fazia o mesmo. Está registrado em gravações. Mas isso não diminui o trabalho do ator / cantor, até porque qualquer pequeno deslize pode ser creditado à imensa emoção, à visceralidade com que PABLO se apresenta. Um detalhe interessante, no seu trabalho, bastante perceptível, é que ele não tenta imitar BELCHIOR, porém faz, de uma forma perfeita, divisões que fogem ao “padronizado”, da mesma forma como BELCHIOR o fazia. Isso é muito interessante.



Quanto à atuação de BRUNO SUZANO, senti-me bastante feliz e recompensado, além de emocionado, com a forma como ele diz seus textos. A maneira como as palavras saem de sua boca faz com que elas nos toquem bem no fundo e nos levem a reflexões muito profundas. Gosto muito de sua presença em cena, e o ator / cantor surpreende a plateia, quando consegue empinar uma pipa, do palco, que atinge o teto, altíssimo, do Teatro Dulcina, sem vento, algo que só acredita quem vê.  Pensei em não falar sobre isso, porque considerava um “spoiler” desnecessário, guardando a surpresa, mas, como o próprio BRUNO me disse, muita gente se refere ao espetáculo como “a peça da pipa”. Mas não é, apenas, "a peça da pipa". Longe disso, é muito mais.



A banda executa muito bem a sua parte, obedecendo à ótima direção muisical, igualmente competente, de PEDRO NÊGO. Há uma cenografia bem simples, que funciona bem, assinada por JOSÉ DIAS, que também é responsável pelo figurino do musical. Um desenho de luz, também correto, foi ciado por RODRIGO BELAY.

 

 

 


 

FICHA TÉCNICA:

 

Organização de Texto: Cláudia Pinto e Pedro Cadore

Direção: Pedro Cadore


Elenco: Pablo Paleologo e Bruno Suzano


Banda: Emília B. Rodrigues (bateria), Rico Farias (violão/guitarra), Silvia Autuori (baixo/violino) e Thomas Lenny (teclado)

Direção Musical: Pedro Nêgo

Cenografia: José Dias

Figurino: José Dias

Iluminação: Rodrigo Belay

Programação Visual: Nos Comunicação

Fotos: Ivana Mascarenhas

Produção Executiva: Rafael Barcellos e Well Riac

Direção de Produção: Rodrigo Medeiros e Pedro Cadore

Assistente de produção: Rodrigo Naice

Realização: R+Marketing e Cadore Produções Artísticas

Assessoria de imprensa: MercadoCom (Ribamar Filho e Leonardo Minardi) 


 

 

 



SERVIÇO:

Temporada: De 08 a 25 de setembro de 2022.

Local: Teatro Dulcina. 

Endereço: Rua Alcindo Guanabara, nº 17 – Centro – Rio de Janeiro.

Dias e Horários: De 5ª feira a domingo, às 19h.

Valor dos Ingressos: R$60,00 e R$30,00 (meia entrada).

Os ingressos estão à venda pelo “site” https://www.sympla.com.br/belchiormusical

Duração: 80 minutos.

Classificação Indicativa: 12 anos.

Gênero: Musical.

 

 




 

      Acho que vale a pena assistir a este musical, porque, além da bela iniciativa de homenagear quem merece ser homenageado, a proposta é bem “honesta” e, de uma ideia e um desejo, se tornou realidade, num palco, com uma equipe dedicada a fazer o melhor ao seu alcance. Eu, até, assistiria novamente, se tivesse disponibilidade, na agenda, para isso. Vida longa ao espetáculo!!!






 


FOTOS: IVANA MASCARENHAS

 

 

 

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