segunda-feira, 25 de novembro de 2019


AQUILO
QUE ACONTECE
ENTRE NASCER
E MORRER

(QUANDO SE CELEBRA A VIDA,
FALANDO-SE DA MORTE.)






            Gosto de solos. Gosto de solos bem feitos. Gosto de solos que me fazem deixar o Teatro feliz, recompensado. Gosto de FABRICIO MOSER. Comecei a gostar dele, depois de ter assistido a um outro solo seu, “Laura”, em agosto de 2018, um espetáculo comovente, tanto quanto o que está servindo de inspiração e motivo para esta crítica, “AQUILO QUE ACONTECE ENTRE NASCER E MORRER”, em cartaz na Casa Quintal de Artes Cênicas (VER SERVIÇO).

            Logo que saí, no ano passado (2108), de um espaço alternativo, ligado à Sala Baden Powell, no Rio de Janeiro (Copacabana), depois de ter assistido a “Laura”, caminhei até a estação mais próxima do metrô (Cardeal Arcoverde), peguei o meu carro, estacionado no final da linha do metrô (Jardim Oceânico) e dirigi, por uns 20 minutos, até a minha casa, no Recreio dos Bandeirantes, sem conseguir pensar em outra coisa, que não fosse aquela peça, não vendo a hora de escrever sobre ela. Chegando a casa, comecei a escrever, compulsivamente, sobre “LAURA”, o que não é um hábito. Por mais que um espetáculo tenha me agradado, só escrevo sobre ele no dia seguinte. O que aconteceu naquela noite posso contar nos dedos de uma as mãos, e vai sobrar dedo.  Mas o fato é que fiquei muito bem impressionado com tudo: texto, direção, interpretação, elementos cênicos... Assim também me senti, ontem, 24 de novembro de 2019, depois de ter assistido ao monólogo aqui analisado, embora pensasse, até mesmo, em que, infelizmente, não encontraria tempo para escrever sobre ele. Hoje, pus-me a continuar o que eu já vinha fazendo, mas não deixava de pensar no solo de ontem. De repente, decidi parar tudo e iniciar esta crítica.




            A vida, pessoal, de FABRICIO foi marcada, ou melhor, é, e, indelevelmente, o será, por momentos trágicos, de perdas irreparáveis e de formas tão doídas, o que, paradoxalmente, ou, talvez, como um instrumento de fuga, ou de autoterapia, para afastar seus fantasmas, move o ator/dramaturgo/diretor a montar seus espetáculos, pelo menos, os dois aqui citados anteriormente. Em “Laura”, prestava ele uma linda e comovente homenagem à sua avó, cujo nome serve de título à peça, morta, a tiros, numa tarde, em 1982, no meio de uma rua, em Cruz Alta, interior do Rio Grande do Sul, por um desafeto amoroso, de apelido Candoca, o qual, em seguida, se suicidou. Não há uma precisão quanto à idade de Laura, quando do crime, oscilando entre 56 e 66 anos. Talvez, por ter sido registrada incorretamente, o que, até hoje, é comum, no interior. Ela estava fazendo algo de que muito gostava: dançava num baile para a terceira idade. FABRICIO, seu neto, nascido em 1981, em Dourados, Mato Grosso do Sul, tinha nove meses, na época da tragédia, e não pôde conviver com a avó materna. O trauma, ocasionado pela forma como Laura morreu, provocou o seu afastamento do convívio familiar, sobre a sua história de vida. Estabeleceu-se um vazio existencial e só ficaram raras lembranças do seu passado. Um "apagão" inconsciente. (Será?). Ninguém falava dela. Fora enterrada totalmente, o corpo e tudo o que pudesse lembrá-la. FABRICIO mora no Rio de Janeiro, desde 2009. Após a morte dos seus pais, em um acidente trágico , de carro, em 2014, decidiu criar a peça autobiográfica, para homenagear a falecida, ao mesmo tempo que isso poderia servir para um mergulho no seu passado, que o levasse a se autoconhecer melhor, utilizando as suas descobertas, em pesquisas, que foram da reunião de fotos e documentos até entrevistas com familiares, amigos e conhecidos de LAURA, que testemunharam o crime ou estiveram próximos a ele. (Muito do que você está lendo, neste parágrafo, está na crítica que escrevi sobre "Laura".).




            Agora, tomando por base o citado acidente de carro, em 2014, mencionado no parágrafo anterior, FABRÍCIO volta a se envolver numa espécie de catarse, criando este espetáculo, “Dando continuidade às pesquisas que mesclam arte com vivências pessoais (...)”, de acordo com o “release”, enviado por BRUNO MORAIS (MARROM GLACÊ – ASSESSORIA DE IMPRENSA) Trata-se de um “espetáculo de autoficção, documental e autobiográfico”, uma montagem muito interessante, uma proposta diferente, que foge aos padrões “normais” de TEATRO convencional e que merece ser vista pelo maior número possível de pessoas, ainda que, de cada sessão, só possam participar 40 pessoas, em função das pequenas dimensões do espaço em que a peça vem sendo encenada, com muito sucesso e casa lotada, um salão do andar superior da Casa Quintal de Artes Cênicas. Acho ótima a proposta e muito bem desenvolvida, contando, sempre, com a participação do público, sem o que não poderá existir a peça, participação esta que pode gerar um bom rendimento ou não, a cada apresentação, dependendo da plateia. Mas acho que nunca será ruim, porque FABRICIO sabe ser o maestro, na regência do espetáculo. Na sessão a que assisti à peça, o resultado foi excelente, porque o público embarcou, de cabeça, na proposta, e o resultado foi o melhor possível, uma vez que as dores e sofrimentos dos assistentes são divididos entre todos, e o vital sentimento de empatia, para o - e pelo - ser humano, é totalmente exposto e explorado ao máximo.

 




SINOPSE:
Diante da vida, como lidar com a morte?
Diante da morte, como lidar com a vida?
“Nascer” e “morrer”, como verbos que delimitam o que entendemos por vida, viver como uma sucessão de nascimentos e mortes – e o TEATRO como uma centelha de vida, que nasce e morre diante dos nossos olhos.
Enxergando o coração da experiência teatral na vida do artista, a peça, documental e autobiográfica, toma, como parâmetros dramáticos, os verbos “nascer” e “morrer” e coloca, no horizonte da criação artística, as vozes do passado, do presente e do futuro, os documentos e a memória do ator e do público.
Mais que um ator, no fundo, um homem convida o público a celebrar a vida, a partir de tantas dores e perdas, causadas por mortes trágicas em sua existência, que não é diferente da de todos; ou quase todos.


 


Não sabemos lidar com as perdas, menos ainda com a morte. Não estamos preparados para ela. A morte, para nós, principalmente quando nos tira da convivência um ente querido, familiar ou amigo, será sempre uma bomba de efeito destruidor, que deixa marcas para o resto da vida; quando não acelera a nossa própria. “Diante da vida, como lidar com a morte? Diante da morte, como lidar com a vida?”

Como eu “Laura”, FABRICIO MOSER partiu de uma experiência duplamente trágica e dos questionamentos advindos dela, sobre o valor da vida, o significado da morte, o quão estamos vivos por um fio, o quanto dependemos que ele não se rompa, o que ganhamos ou perdemos com cada uma delas – vida e morte – e, dessas questões, desenvolveu este novo, e excelente, trabalho cênico. Extraído do “release”, já citado: “Enxergando o coração da experiência teatral na vida do artista, o projeto autobiográfico toma, como parâmetros dramáticos, os verbos ‘nascer’ e ‘morrer’ e busca a encenação de si, sob o olhar do outro, e dos outros, sob o olhar sobre si. Desse modo, coloca, no horizonte da criação artística, as vozes do passado, do presente e do futuro, os documentos e a memória do ator, dos colaboradores e do público".




Diz FABRICIO: “O desafio de abordar dramas íntimos surgiu em ‘DUO Sobre Desvios’ (2012) – a este, infelizmente, eu não assisti - e se intensificou em ‘Laura’ (2015), quando parti em busca da história da minha avó materna, assassinada em 1982. A morte dos meus pais, durante o processo criativo da segunda peça, em 2014, e a necessidade de renascer, de alguma forma, depois disso tudo, foram sinais para continuar minha pesquisa autobiográfica e documental no TEATRO”. Os dois primeiros trabalhos, aqui citados pelo ator, chegaram a ser apresentados em Portugal e na Espanha.

Não só a concepção, como também a estrutura deste solo, seguem o modelo de “Laura” e o de “DUO Sobre Desvios”, com a utilização de muitas e diferentes linguagens, apelos sensoriais diversos, um tom “artesanal” e contando com a colaboração de artistas de diversas áreas.






Se prestarem atenção à ficha técnica do espetáculo, mais abaixo apresentada, perceberão a falta de citação dos nomes de profissionais que assinaram o cenário, o figurino, a iluminação, a direção do movimento, por exemplo, e outros elementos técnicos, necessários a uma montagem teatral. Entenderão o porquê agora, quando passo a transcrever o que me respondeu FABRICIO, quando lhe perguntei o que ele queria dizer, na citada ficha técnica, com “Colaboração Artística”, seguida de seis nomes: CASSIANA LIMA CARDOSO, GABRIEL MORAIS, GABRIELA LÍRIO, RICARDO MARTINS, SILVANA ROCCO e TATO TEIXEIRA. Resposta dele: “Como no ‘Laura’, neste processo, eu convidei seis artistas, de diferentes áreas - do TEATRO, da dança, das artes visuais, a colaborarem no processo. Então, esses seis colaboradores participaram, sem hierarquia ou especificidade, vindo aos ensaios e fazendo provocações, para ajudar a orientar a criação. Eles também podem ser entendidos como parte da direção. Gosto de ter esse olhar de fora, para ampliar a experiência coletiva da proposta. Eles trouxeram propostas, durante a criação, ou observaram o material que eu oferecia, traçando caminhos, fazendo sugestões, apontando problemas.”. Seria, portanto, contando com a generosidade de FABRICIO, um trabalho que partiu de uma ideia e de uma criação coletiva.






Transcrevo, porque gosto dela, a afirmação do ator, com a qual também faço coro: “Acredito num TEATRO que se caracterize pelo desejo de transformar vivências pessoais em experiências coletivas de aprendizado. Elas podem ser trágicas, cômicas, sublimes, delirantes ou até cruéis. (...) Talvez, de alguma forma, realizando as apresentações públicas, ocorra comigo um processo de cura ou catarse, mas as três peças não nasceram desse desejo. E, se há cura ou catarse, ela não é só minha; é também do público”.

A participação da plateia, a qual é recebida, com muito carinho e respeito, pelo ator, uma pessoa que transborda afetividade, além de talento profissional, é fundamental nesta peça, tecnicamente, um monólogo, mas que, também, não poderia ser assim considerada, pela participação efetiva do público, com o qual o ator interage, mais do que representa, da primeira à ultima cena, com um final muito surpreendente, lindo e delicioso, denotativa e conotativamente falando, sobre o qual não me cabe dizer nada, para não dar “spoiler” e roubar, aos que ainda vão assistir ao espetáculo, a surpresa e o imenso prazer que tive. Foi uma experiência difícil se ser descrita em palavras.




Ainda extraído do “release”: “Se ‘morrer’ e ‘nascer’ são os verbos que delimitam aquilo que entendemos por vida, o TEATRO pode ser compreendido como um grande ritual de passagem, em que viver pode ser um limite.”. Concordo plenamente, e acrescento: um grande ritual de passagem.






FICHA TÉCNICA:

Criação, Direção e Atuação: Fabrício Moser

Colaboração Artística: Cassiana Lima Cardoso, Gabriel Morais, Gabriela Lírio, Ricardo Martins, Silvana Rocco e Tato Teixeira
Programação Visual: Davi Palmeira
Fotos: Ricardo Martins e Pedro Bonfim Leal
Consultoria Audiovisual: André Boneco
Assessoria de Imprensa: Marrom Glacê – Gisele Machado & Bruno Morais
Produção: Fabrício Moser e Gabriel Morais










SERVIÇO:

Temporada: De 09 de novembro a 15 de dezembro de 2019.
Local: Casa Quintal de Artes Cênicas.
Endereço: Rua Sílvio Romero, 36 – Lapa – Rio de Janeiro.
Dias e Horários: Sábados e domingos, às 20h.  
Valor dos Ingressos: R$30,00 (inteira) e R$15,00 (meia entrada)
Classificação Etária: 16 anos.
Duração: 60 minutos.
Capacidade: 40 pessoas.
Gênero: Autoficção







Para mim, não chegaram, com o encerramento da peça, as respostas exatas para estas duas perguntas: “Diante da vida, como lidar com a morte? Diante da morte, como lidar com a vida”. Por outro lado, com muito mais valor e importância, ficaram a provocação e o desafio, para continuar a perseguição às respostas para elas, as quais, com quase totalíssima certeza (O pleonasmo é proposital.), jamais encontrarei. Mas o importante é continuar tentando, e aprendendo, e vivendo, e sonhando, e aproveitando cada fração de segundo, enquanto estamos respirado, uma vez que “A Vida è Bela” e devemos seguir a máxima “Carpe Diem!”.

Não deixem de participar, mais do que assistir, a este ótimo espetáculo, uma experiência boa, muito boa, pela qual todos deveriam passar. Recomendo, em especial, aos meus queridos amigos e leitores, com os quais tenho um enorme prazer em dividir as coisas boas a que tenho acesso.


 


E VAMOS AO TEATRO!!!

OCUPEMOS TODAS AS SALAS DE ESPETÁCULO DO BRASIL!!!

A ARTE EDUCA E CONSTRÓI!!!

RESISTAMOS!!!

COMPARTILHEM ESTE TEXTO,
PARA QUE, JUNTOS, POSSAMOS DIVULGAR
O QUE HÁ DE MELHOR NO
TEATRO BRASILEIRO!!!





CENSURA NUNCA MAIS!!!



(FOTOS: RICARDO MARTINS
e
PEDRO BONFIM LEAL.)



(GALERIA PARTICULAR.)

















































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