EM
UMA
MANHÃ
DE SOL
(A ARTE, DE FORMA BONITA,
IMITANDO O LADO FEIO DA
VIDA.)
“Em uma manhã de sol, ELE e
ELA iriam andar de mãos dadas no calçadão de Copacabana, ELES iriam andar de
bicicleta no Aterro do Flamengo, ELES iriam subir, a pé, o Horto, até o Solar
da Imperatriz. Mas ELES não fizeram nada disso. Em uma manhã de sol, ELE e ELA
estavam em uma Unidade de Pronto Atendimento em Botafogo.”. Assim começa o “release” da peça “EM UMA MANHÃ DE SOL”, enviado por LYVIA RODRIGUES (AQUELA QUE DIVULGA –
ASSESSORIA DE IMPRENSA). Assim, também, começa o texto da peça. O espetáculo cumpre uma curta temporada,
encerrada hoje, no dia em que estou escrevendo esta crítica (19 de agosto de 2018) no Teatro II do SESC Tijuca, apenas nove sessões, mas merece outras
pautas, por sua inquestionável boa qualidade.
É um comovente “diário” de uma
verdadeira “via crucis”, percorrida pela atriz,
dramaturga, diretora e professora de
TEATRO, FLÁVIA LOPES, e seu marido, em busca da sobrevivênvia deste, após,
“EM UMA MANHÃ DE SOL”, ter sido
diagnosticado com leucemia, contra a
qual o casal travou uma luta, tendo, felizmente, saído vencedor. Estas últimas
palavras, que não considero “spoiller”,
já indicam que o espetáculo não
deprime ninguém; antes, serve como uma catarse, para exorcizar um fantasma que,
apesar dos avanços da ciência, ainda assusta, e muito, as pessoas: o câncer.
SINOPSE:
Solo inspirado em uma
compilação de crônicas escritas pela atriz
FLÁVIA LOPES, desde o diagnóstico de leucemia do marido, em outubro de 2016, passando pela
internação, às pressas, no Hospital
Universitário Pedro Ernesto (HUPE)
até o transplante de medula óssea 50% compatível, ocorrido um ano depois da
descoberta da doença.
Um olhar poético e
humanizado sobre a luta pela vida, solidariedade e resistência em um ambiente
hospitalar e seus personagens reais.
A
última frase da sinopse da peça acima ratifica a minha última,
também, no parágrafo que a antecede. Antes que possam pensar que o espetáculo é “para baixo”, que fique
bem claro que todo o sofrimento do casal, o físico, por parte do paciente, e o
interior, vivenciado por FLÁVIA, teve
um final feliz, também “EM UMA MANHÃ DE
SOL”.
Acompanhei,
interessado e solidário, pelas postagens no Facebook, todo o drama e o sofrimento vividos pelo casal e torci
bastante, assim como outros amigos de FLÁVIA,
para que tudo desse certo. Em cada postagem, podia sentir, mesmo a distância, a
sua dor e toda a expectativa para que “a
medula pegasse”, expressão utilizada no texto da peça e pelos
que passam pelo mesmo seriíssimo problema. A cada passo, a cada nova conquista,
a cada iminência de vitória, eu vibrava, como se aquilo estivesse acontecendo
com um ente querido meu. E “a medula
pegou”.
O
interessante do texto, escrito pela
própria personagem do drama, é que ele é leve e poético,
embora trate de um tema tão triste e "pesado". Além disso, FLÁVIA se vale da sua experiência, para mesclar uma história pessoal com a de outras mulheres
que frequentaram o Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE), no auge
da crise, a qual durou sete meses, durante os quais ela passava a maior parte do
tempo como acompanhante do marido, uma espécie de enfermeira, já que havia
carência de mão de obra especializada naquele nosocômio. Aliás, o texto
também se presta, e bastante, a uma denúncia, muito bem formulada, contra o
sucateamento da saúde pública no Brasil, em especial naquele
hospital-escola, ligado à Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ),
vilipendiada pelos (des)governos do estado do Rio de Janeiro, principalmente
nas duas últimas décadas, o que se intensificou nesta última. Ela fala das
greves dos funcionários e, também, daqueles que não abandonaram o posto e, mesmo
sem receber seus salários, continuavam trabalhando, para que os pacientes não
tivessem sua morte antecipada. Denuncia a falta de recursos, de toda ordem: dos
medicamentos aos equipamentos fora de uso, por estarem danificados; da falta de
comida à higiene precária.
“Uma médica, que precisa escolher
qual, entre dois pacientes com risco de morte, receberia a única bolsa de
sangue daquele dia; uma enfermeira – sem salário - que abrigou, em sua casa,
uma paciente de outra cidade, que não tinha condições de custear a viagem de
ida e volta ao hospital, para dar continuidade ao tratamento; uma enfermeira –
também sem salário - que comprou, por conta própria, uma pomada anestésica e um
esparadrapo antialérgico para um paciente; são algumas das histórias tocantes e
cheias de compaixão, que atravessam a história de FLÁVIA, contadas, na terceira
pessoa, pela personagem “ELA”, uma narradora afetiva, que conhece, intimamente,
as situações vividas naquele hospital”.
Por outro lado, a dramaturga aproveita para enaltecer aquilo que parece ser um oásis no deserto em que se
transformou a saúde pública, no Brasil, ao falar do Hospital de
Câncer de Barretos, no interior de São Paulo, para onde foi com o
marido doente, e onde se deu o vitorioso transplante de medula óssea. O Hospital
de Câncer de Barretos, hoje conhecido como Hospital de Amor, é um
centro de pesquisas de ponta, referência no tratamento de câncer e que atende,
pelo SUS, gratuitamente, a pessoas que não dispõem de recursos próprios, num belo
trabalho de filantropia e amor e respeito ao próximo. É mantido pela Fundação
Pio XII e vive, basicamente, de doações, conseguindo, com a total dedicação
de todos os que lá trabalham, oferecer um tratamento digno às pessoas que o
procuram. É a maior instituição oncológica do Brasil, sendo, hoje, um
complexo que se expandiu pelos país e faz, por ano, cerca de 1,2 milhão de
atendimentos. “É uma instituição reconhecida, no Brasil e no mundo,
como referência na atuação do campo da oncologia, com elevados padrões de
qualidade e de humanização no atendimento. Ao lado do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP), foi eleito, em pesquisa popular, o
melhor hospital conveniado ao SUS do Estado de São Paulo, com 97,2% de
aprovação em categorias como serviço, infraestrutura, limpeza e qualidade do
atendimento”. (Wikipédia).
Mas voltemos ao nosso foco
principal, que é o espetáculo de TEATRO, continuando a falar do texto, muito bem costurado e elaborado,
por FLÁVIA, contando com a colaboração
de ALINE MAROSA e EDUARDO VACCARI, na pesquisa e organização dramatúrgica.
Nele, ela associa o interior do hospital com o mundo exterior e a vida que
segue lá fora, em suas dezenas de postagens, quase diárias, na sua página no Facebook. Nelas, a autora “falava
sobre a fragilidade da vida no risco iminente da morte. Aos poucos, com a
repercussão de suas publicações, a artista ampliou sua fala e mesclou, aos seus
contos, histórias de outras mulheres presentes naquela unidade de saúde,
formando um coro feminino em uníssono: mães, esposas, pacientes, enfermeiras,
técnicas em enfermagem, cuidadoras, psicólogas e médicas. Um solo narrativo
polifônico, que nasce no momento em que a história de FLÁVIA e do marido
ultrapassa o nível individual e torna visível a decadência da saúde pública no
nível social, sobretudo a do HUPE, onde, na época, com a falta de repasse de
verba do Governo do Estado, os funcionários trabalhavam em condições precárias
e sem receber os salários por mais de três meses”. (Extraído do “release”.).
A narrativa,
já que se trata de um monólogo, nada
enfadonho, em terceira pessoa, já
começa interessante e vai num crescendo, prendendo a atenção do espectador, o
qual se emociona bastante com o que vai ouvindo e vendo, muitos – talvez a
maioria – demorando a entender que a personagem
e a atriz são a mesma pessoa.
Alguns podem, até, não atingir essa percepção, porém, certamente, se emocionam
com o espetáculo, que é belíssimo – não me canso de dizer -,
não só pelo texto, já tão elogiado,
como também por conta da excelente e
comovente interpretação de FLÁVIA, apoiada em recursos de extremo bom
gosto, o que só faz agregar valores positivos ao seu trabalho.
Refiro-me à ótima direção, de EDUARDO
VACCARI, com ideias e soluções brilhantes, não impondo limites à emoção da atriz, em harmonia com o lindo cenário, de CARLOS ALBERTO NUNES, que, também, assina o criativo e funcional figurino, bastante original também; a “iluminada” luz (Perdão pelo
pleonástico trocadilho!), criação de ANA
LUZIA DE SIMONI, valorizando todas as cenas e criando belas imagens; um
trabalho de quem conhece muito o ofício. Acrescentem-se a ótima direção musical, de KARINA
NEVES e BRUNO DANTON, ajudando a
criar o clima para cada cena e transportando o espectador para o ambiente hospitalar,
com sons sugestivos deste; o visagismo,
de MONA MAGALHÃES; a preparação vocal, feita por PAULA SANTORO; e a instrução de yoga, a cargo de NINA
KRIEGER. Tudo isso, reunido, deságua num encantador espetáculo, uma grata surpresa para mim – confesso -,
pois não imaginava que o tema
pudesse render uma peça de tão alto nível, nada piegas, que toca,
profundamente, cada espectador.
Se tiverem a oportunidade de
assistir ao espetáculo (Queiram os DEUSES DO TEATRO que ele volte à
cena!!!), prestem bastante atenção às metáforas que emanam do magnífico cenário, “uma
grande caixa de areia, que surge como elemento simbólico do tempo, que escorre
pelas mãos, que se transforma, de acordo com o seu manusear ou, até mesmo, como
um grão de areia no universo”.
FICHA TÉCNICA:
Dramaturgia: Flávia Lopes
Colaboração Dramatúrgica: Aline Macedo e Eduardo Vaccari
Pesquisa e Organização Dramatúrgica: Aline Marosa e Flávia Lopes
Direção: Eduardo Vaccari
Atuação: Flávia Lopes
Cenógrafo e Figurinista: Carlos Alberto Nunes
Cenógrafa e Figurinista Assistente: Arlete Rua
Iluminação: Ana Luzia de Simoni
Visagismo: Mona Magalhães
Direção Musical: Karina Neves e Bruno
Danton
Preparação Vocal: Paula Santoro
Instrutora de Yoga: Nina Krieger
Assessoria de Imprensa: Lyvia Rodrigues (Aquela que Divulga)
Design Gráfico: Guilherme Fernandes
Fotos: Rodrigo Menezes
Produção: Pagu Produções Culturais
Gênero: Drama
SERVIÇO:
Temporada: 03/08 a 19/08 de 2018.
Local: SESC Tijuca
(Teatro II).
Endereço: Rua Barão de Mesquita, 539 - Tijuca - Rio de Janeiro.
Telefone: (21) 3238-2139
Dias e Horários: De 6ª feira a domingo, sempre às 19h.
Valor do Ingresso: R$30,00 (inteira), R$15,00 (meia
entrada) e R$7,50 (associados do SESC).
Duração: 60 minutos.
Capacidade: 50 lugares.
Classificação Etária: 14 anos.
“EM UMA MANHÃ DE SOL” é um espetáculo que deveria ser levado ao
maior número possível de pessoas, porque mexe com o humano, com os sentimentos,
trata de um tema de relevante interesse de todos e, ainda, serve como uma
denúncia contra as atrocidades que os (des)governos praticam contra,
principalmente, a população mais desassistida, economicamente, no que tange à
saúde pública, felizmente, também, jogando um merecido foco a quem pratica o
amor e a dedicação ao próximo, além de ser, também, um raio de esperança para
os que sofrem de doenças que provocam grande quantidade de óbitos, como o
câncer.
E VAMOS AO TEATRO!!!
OCUPEMOS TODAS AS SALAS DE
ESPETÁCULO DO BRASIL!!!
COMPARTILHEM ESTA CRÍTICA,
PARA QUE, JUNTOS, POSSAMOS DIVULGAR O QUE HÁ DE MELHOR NO TEATRO BRASILEIRO!!!
(FOTOS: RODRIGO MENEZES.)
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