domingo, 19 de junho de 2016


2ª MARATONA TEATRAL

EM SÃO PAULO - 2016

 

 

(PARTE III)

 

 

 POR QUE NEM TODOS OS DIAS SÃO DIAS DE SOL?

 

(“NEM SEMPRE O SOL BRILHA.

TAMBÉM HÁ DIAS EM QUE A CHUVA CAI”.

E TAMBÉM É BOM!!!)

 

 


 

 

           

            É preciso gostar muito de TEATRO, até mesmo infantil, sem nenhum demérito (muito pelo contrário) e admirar bastante o trabalho de uma companhia, que emplaca 20 anos de enormes sucessos, para enfrentar um deslocamento distante, de um hotel, numa cidade, que não é sua, até um teatro, às 12 horas de um sábado, num dia frio e chuvoso. Mas valeu a pena. E como valeu!

 

            A peça é “POR QUE NEM TODOS OS DIAS SÃO DIAS DE SOL?”. A companhia é a ARTESANAL CIA. DE TEATRO. A cidade em questão é São Paulo. O Teatro é o do SESC Pompeia. O resultado desse “sacrifício” foi regiamente recompensado, diante do belíssimo espetáculo – e nem poderia esperar outra coisa – que estava sendo apresentado lá, até o último dia 12 de junho (2016). A peça continuará em cartaz, viajando pelo Brasil, e chegará, em data a ser divulgada, ao Rio de Janeiro.

 

A ARTESANAL é uma companhia diferenciada, que prima pelo bom gosto, por um trabalho profundo de pesquisa e que, acima de tudo, respeita a criança e não mede esforços para levar, ao público infantil, espetáculos de altíssima qualidade, superando muitas produções do chamado “teatro para adultos”. Aliás, o TEATRO produzido pela ARTESANAL é para crianças e para adultos; é para quem tem bom gosto, sensibilidade apurada e sabe valorizar um belo espetáculo teatral, independentemente da idade cronológica do espectador. Assim tem sido em toda a sua trajetória, que lhe rendeu muitos prêmios, merecidamente conquistados, diga-se de pasagem.

 

Desta vez, para o espetáculo motivo desta análise, a ARTESANAL CIA. DE TEATRO realizou, durante dois meses, um trabalho de pesquisa, com cerca de 30 crianças, que foram estimuladas a formular suas opiniões sobre diversos temas propostos pelo grupo: "O que é o amor? O que é a liberdade? O que é a vida? O que é o medo? O que é ser adulto? Como as crianças vão parar dentro da barriga das mulheres?”, além de tantos outros.

 

Pode-se imaginar a gama de respostas interessantes e desafiadoras que brotaram das boquinhas e das cabecinhas dos pequenos, muitas das quais só possíveis dentro da “filosofia” pura e direta das crianças: "O amor é gostar de alguém e ficar juntos. Liberdade é não estar preso. A vida é quando respiramos e fazemos as coisas. O medo é algo que sentimos quando está escuro. Ser adulto é não poder brincar. As crianças são colocadas dentro da barriga das mulheres por seus papais”.

 

A partir do material em mãos, o grupo acrescentou, a ele, suas próprias experiências e vivências de sua infância, para dar forma à excelente dramaturgia, de GUSTAVO BICALHO, que se vê na peça, cujo texto é dividido em quatro pequenas narrativas, contos fabulosos, que tratam, cada um dentro de uma linguagem e técnica diferentes, de questões colocadas pelas próprias crianças.

 

O universo, apresentado nas quatro histórias, é um mundo de fábulas: histórias revisitadas pelas lembranças e ressignificadas pelo fazer teatral. São narrativas simples, singelas e poéticas, contadas, quase sempre, através do olhar infantil.

 



 


 

 
SINOPSE:
 
PRIMEIRA HISTÓRIA: “A VELHA DO SACO” - Um menino tem medo de uma velha, que se senta, todos os dias, no banco de uma praça. Isso, porque seus pais lhe diziam que não se aproximasse dela, pois era uma bruxa, que roubava a memória das crianças e a guardava dentro dos sacos que vestia. Porém, sua curiosidade faz com que ele se aproxime dela e descubra que as lembranças são histórias que contamos para as outras pessoas. A menos que eu não tenha prestado tanta atenção, não me recordo de nomes para os personagens, talvez pelo fato de a questão fazer parte do imaginário popular e existir em qualquer canto do universo. Entra, aqui, a questão do preconceito, ou “pré-conceito”, fruto da ignorância de muita gente. Cabe ao menino desfazê-lo. Neste conto, é utilizada a técnica chamada “bonecos siameses”, em que os atores e os bonecos parecem uma coisa só. Estes são presos aos corpos daqueles, pela frente, e, por eles, são manipulados . Os bonecos, de tamanho natural, praticamente, são “vestidos” no corpo dos atores. É de causar grande impressão o excesso de expressividade exposta.
 

 


SEGUNDA HISTÓRIA: “PÁSAROS” - Uma menina, que gosta de pássaros, tenta ajudar seu vizinho a resgatar uma pipa, que ele estava empinando e que ficou presa, nos galhos de uma mangueira, em seu quintal, transformando-o em um pássaro. Aqui, o espectador vai conhecer BETO e NINA, e um outro tipo de medo. Não da bruxa, mas de altura. NINA diz a BETO que se prontificaria a subir na alta árvore, para buscar o brinquedo do amigo, porém tem medo de altura. E o menino não tem o menor pudor de confessar a ela que também sofria do mesmo mal, uma atitude corajosa dele, contrariando as injustificáveis “teorias machistas” de que “homem não chora, homem não tem medo...”. A técnica empregada, nesta encenação, é a das “máscaras”, uma das mais simples e utilizadas em TEATRO INFANTIL, principalmente.  
 
 


TERCEIRA HISTÓRIA: “O RELÓGIO E A RÉGUA” - Um homem, personagem anônimo, conversa com objetos em seu escritório, após seu filho, também de nome não revelado, ter-lhe dito que prefere continuar criança para sempre, pois acha que é muito chato ser adulto. Será que o menino está com medo de crescer? Estaríamos diante de uma nova versão de Peter Pan? Depois de ouvir isso, o pai vai trabalhar e, no seu escritório, depara-se com uma surpresa: os objetos começam a conversar com ele. Uma luminária puxa prosa, o relógio entra no papo e a régua também decide tagarelar. No que será que vai dar essa brincadeira, dentro do escritório do pai, de um ser adulto? Quer dizer, então, que gente grande também brinca no trabalho? O cerne deste conto é mostrar que todos podem brincar e deixar sua imaginação viajar pelo espaço. Nesta cena, é empregada a “técnica do teatro de objetos” ou “animação de objetos”. Os atores “dão vida” a seres inanimados, manipulando-os.
 

 


QUARTA HISTÓRIA: “O JARDIM DAS BORBOLETAS AGITADAS” - Uma menina engole uma semente de laranja, achando que, dessa forma, um bebê irá crescer dentro de sua barriga. Mas, ao perceber que nada acontece, começa a pensar que uma árvore está crescendo dentro dela. Os adultos costumam explicar, às crianças, a maneira como elas são geradas com a famosa história da “sementinha que o papai coloca dentro da mamãe”. Quando a mãe, personagem desta história, também sem nome definido, diz isso à filha, a menina foi correndo, engolir uma semente de laranja, como já foi dito (ela entende a palavra “semente” do ponto de vista denotativo), para ver se crescia um bebê em sua barriguinha. Em seguida, arrependeu-se, pois teve medo de que uma árvore, uma laranjeira, pudesse crescer dentro dela. Aqui, é empregada a mais sofisticada e difícil, no meu entendimento, das quatro técnicas experimentadas em cena, a do “video-mapping”, sem tradução precisa para o nosso idioma (aproximadamente, “videografismo”), que consiste em projeções de imagens animadas, no palco, em torno dos atores e com as quais eles interagem. Essas projeções são feitas nas telas de bastidores de bordados, que os atores vão deslocando pelo palco.
 

 
 

 

 


Por que Nem Todos os Dias São de Sol?
Bonecos de papel, presos a palitos.


 

Muitos, e variados, motivos são responsáveis por eu recomendar este espetáculo, de uma beleza ímpar e de uma poesia incomensurável. A começar pelo texto, com diálogos bem escritos, não subestimando a inteligência infantil. Não há espaço para a mediocridade linguística, para a pobreza vocabular, para as construções infantiloides, mas também não se explora uma erudição, que, certamente, entediaria as crianças e não as levaria a entender e acompanhar as histórias. O texto é lúdico, é leve, é bonito, é poético; é “jogo”, brincadeira séria. Há frases muito inteligentes e, no mínimo, instigantes como “Gente é uma planta que dá muito trabalho”.

 

A direção, a quatro mãos, de GUSTAVO BICALHO e HENRIQUE GONÇALVES é muito competente, como em todos os espetáculos que dirigem, sabendo explorar tanto o material humano como os recursos técnicos que dominam, como, por exemplo, na cena em que há uma projeção de pingos de chuvas nos guarda-chuvas abertos, por força de muito estudo e dedicação. Dão ao espetáculo uma leveza exigida pelas histórias, sendo, por isso mesmo, merecedores da minha admiração. Muito oportuna achei a reprodução, ao final da peça, de depoimentos de crianças sobre os dias de sol. A espontaneidade infantil é sempre motivo de surpresa, beleza e alegria para os adultos.


 


 


 



O mínimo que se pode dizer do elenco é que é formado por atores de inquestionável competência e de uma indiscutível versatilidade, uma vez que, além do ato de representar, usam máscaras e manipulam bonecos e objetos com precisão, e executam, com maestria, diferentes técnicas associadas à representação. Não faço destaque a nenhum dos quatro em cena, BRUNO OLIVEIRA, DÉBORA SALÉM, EDEÍLTON MEDEIROS e LÍVIA GUEDES, por notar um total equilíbrio na atuação do quarteto, bastante positivo, é óbvio.

 

O fato de o espetáculo poder ser considerado um “quatro em um”, já que são contadas quatro pequenas histórias, bem diferentes umas das outras, também marca ponto na excelência do espetáculo, pois isso concede maior agilidade às cenas e à própria peça, dinamizando a montagem e afastando-a do perigo da monotonia, ainda mais quando o público-alvo é a criança. O término de uma narrativa gera, imediatamente, um interesse pela próxima.

 

A plasticidade é um dos pontos altos de todos os trabalhos da ARTESANAL CIA. DE TEATRO. Sempre há um grande destaque para o visual das peças: cenários, figurinos e iluminação, os quais, em conjunto, são um prazer indescritível para os olhos e uma grande alegria para a alma.

 

            No cenário, não predominam peças de grandes proporções, além de uma árvore, uma mesa, cadeiras e bancos, entretanto a grande quantidade de material de cena, o qual fica exposto nas duas laterais do palco, gerando curiosidade, são detalhes que agregam muitos valores positivos às cenas. Tudo isso leva a competente assinatura de KARLLA DE LUCA, assim como os já citados objetos de cena. Os bonecos, uma obra de arte, são confeccionados por BRUNO DANTE, e as máscaras levam a marca de FLÁVIA LOPES e MARISE NOGUEIRA.


 


 


            Os figurinos, muito criativos e confeccionados com requinte, são criação de FERNANDA SABINO e HENRIQUE GONÇALVES, que também são responsáveis pelos adereços.

 

Quanto ao desenho de luz, este elemento é de fundamental importância no espetáculo, por ser capaz de ajudar, e muito, na construção da beleza as cenas, quer nas que necessitam de mais luz, coloridas, quer naquelas em que é preciso construir um ambiente mais fechado, sombrio. Esse belo trabalho leva a assinatura de POLIANA PINHEIRO e RODRIGO BELAY, dois jovens, na idade e na função, e que demonstram total domínio do saber iluminar. É difícil estabelecer qual a história mais interessante, assim como assegurar que a luz funciona melhor, nesta ou naquela.

 

 


 


 


Para não me estender muito na análise da peça, acrescento que todos os demais profissionais envolvidos na montagem estão de parabéns por suas importantes contribuições para a grandeza do espetáculo.



 

 
FICHA TÉCNICA:

Dramaturgia e Texto: Gustavo Bicalho

Elenco: Bruno Oliveira, Débora Salém, Edeílton Medeiros e Lívia Guedes

Direção Artística: Gustavo Bicalho e Henrique Gonçalves
Bonecos: Bruno Dante
Direção de Movimento dos Bonecos e Preparação Técnica: Márcio Nascimento
Máscaras e Preparação Técnica: Flávia Lopes e Marise Nogueira
Direção de Movimento e Preparação Corporal: Paulo Mazzoni
Cenário e Objetos de Cena: Karlla de Luca
Figurinos e Adereços: Fernanda Sabino e Henrique Gonçalves
Pesquisa Musical: Gustavo Bicalho
Desenho de Luz: Poliana Pinheiro e Rodrigo Belay
Desenho de som: Luciano Siqueira
Video-Mapping: Dado Marietti
Animação: Rafael Cazes e Renata Nassur
Ilustrações e Projeto Gráfico do Programa: Gabriela Gil
Fotografias: Jackeline Nigri
Direção de Produção: Henrique Gonçalves
                                                                                                                                                      Realização: Artesanal Cia. de Teatro
 

 


DETALHES DO BELÍSSIMO TRABALHO DE

PROGRAMAÇÃO VISUAL DO PROGRAMA DA PEÇA:

 

 


 

 


 

 


 

 

 

         Torçamos para que o público carioca possa ter, muito em breve, a oportunidade de experimentar o grande prazer que senti ao ver esta peça!!!

 

 

 

(FOTOS JACKELINE NIGRI.)

 

 



 


 

 

 

(GALERIA PARTICULAR – VÁRIOS FOTÓGRAFOS.)

 

 


À frente de parte do cenário da peça.

 


Aguardando o início do espetáculo.

 


Com o elenco e parte da equipe de produção do espetáculo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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