QUEM TEM MEDO DE VIRGÍNIA WOOLF? - A GENTE RI
DE QUÊ?
Está
em cartaz, no Teatro dos Quatro, um dos clássicos da dramaturgia norte-americana:
QUEM TEM MEDO DE VIRGÍNIA WOOLF, de EDWARD ALBEE, que, ao lado de A HISTÓRIA DO ZOOLÓGICO, sua primeira
peça, de 1959, escrita em apenas duas semanas, é um dos textos mais encenados e
uma espécie de cartão de visitas do dramaturgo.
Esta
é, oficialmente, a quarta encenação da peça no Brasil, tendo ficado célebres a
de 1965, assinada por MAURICE VANEAU,
com CACILDA BECKER, WALMOR CHAGAS, LILIAN LEMMERTZ e FÚLVIO
STEFANINI; a de Antunes Filho, com RAUL
CORTEZ, em 1978; e a dirigida por JOÃO
FALCÃO, com MARCO NANINI e MARIETA SEVERO, em 2001. Além disso, a peça, que foi escrita em 1962,
ganhou, quatro anos depois, uma inesquecível e premiada adaptação para o
cinema, a cargo de MIKE NICHOLS, com
ELIZABETH TAYLOR e RICHARD BURTON , como protagonista.
Depois
de três bem-sucedidas montagens, é sempre um desafio levar ao palco mais uma
versão desta peça, o que, para os atuais envolvidos no projeto acabou por
atingir um excelente resultado.
Elenco
SINOPSE: Toda a ação se passa numa
madrugada, na sala de estar do casal Jorge
(DANIEL DANTAS) e Marta (ZEZÉ POLESSA). Ele,
professor de História de uma universidade norte-americana; ela, filha do
reitor. Após uma festa da universidade, o
casal, contra a vontade de Jorge,
recebe, em sua casa, por determinação do próprio reitor, um jovem casal, Nick (EROM CORDEIRO) e Mel (ANA KUTNER) - ele, um recém-admitido
professor na mesma universidade - para uns drinques, como uma espécie de “boas-vindas”
aos dois. Entretanto, aquilo que se
esperava ser um encontro amigável, prazeroso e civilizado transforma-se numa “noite
de horrores”, numa “lavagem de roupa suja”, entre o casal “anfitrião”, contaminando
e envolvendo os convidados, cheia de jogos perversos e manipulações, brigas, ataques,
humilhações, revelações, traições, tudo regado a muito álcool. Muito álcool mesmo.
Do
início ao fim do espetáculo, que dura mais de duas horas, a plateia não se
cansa de rir dos embates travados entre os quatro “novos amigos”. Ocorre, porém, que se trata de um riso
nervoso, tenso, em função do humor cáustico, sarcástico, que caracteriza os textos de ALBEE. É para se perguntar: estou rindo de quê? Por trás de cada alfinetada, esconde-se um
desejo de libertação de algo que sufoca cada um dos quatro personagens, mais Jorge e Marta, e do que parece não há como se libertar.
Os
protagonistas desta peça têm de ser interpretados por atores de primeiríssimo nível,
dada a complexidade do caráter de cada um e, também, para que todo o já
referido humor albeeano possa atingir o público. Não poderiam ter sido mais bem escolhidos DANIEL e ZEZÉ para tal função. Apesar
de atuarem, com bastante frequência em outras mídias, parece-me bem razoável
afirmar que ambos são atores de TEATRO. Admirador do talento dos dois, é sempre no TEATRO que percebo suas maiores atuações. No caso de VIRGÍNIA WOOLF, os louros devem ser igualmente divididos entre ambos. Ele, por seu jeito descontraído de dizer o
texto, parecendo que não foi um autor que o escreveu, para ser dito por um
personagem, mas sim que se trata do que o DANIEL,
pessoa física, está pensando e querendo dizer a cada momento. Ela, por sua exuberância em cena, também pela
descontração e pelo tom de veracidade que imprime à sua “perigosa” Marta.
Na verdade, é para se ter muito medo, sim, mas de Marta, ardilosa, cruel, “sem-noção”, quando o que está em jogo são
seus interesses e ambições. Duas
inesquecíveis interpretações!
Daniel Dantas e Zezé Polessa
Muitas
vezes, a função de coadjuvantes (acessórios, secundários, complementares) se
reveste de uma importância de tal envergadura, numa trama, que se torna até
injustiça, atribuir tal adjetivação a quem interpreta esses papéis. Neste espetáculo, apesar de coadjuvantes,
faz-se necessário dizer que EROM
CORDEIRO e ANA KUTNER são dois
coadjuvantes de luxo, sem os quais o brilho do espetáculo seria menos
intenso. Dois excelentes atores, que,
aqui, não são apenas escadas para o primeiro plano dos protagonistas. O casal, com seu talento, dignifica, mais
ainda, a já tão dignificante função dos coadjuvantes. Parabéns aos dois!
Ana Kutner e Erom Cordeiro
Por
ser mito extensa, vamos a apenas alguns dos destaques da FICHA TÉCNICA:
A
direção, de VICTOR GARCIA PERALTA, é muito boa.
Ele procurou se pautar nos detalhes da vida e da sociedade norte-americana
na época em que a trama se passa (década de 60), conseguindo,
satisfatoriamente, transportar o público para uma realidade tão distante da
nossa: a vida acadêmico-social num campus universitário, onde reside o casal de
protagonistas. Dirigir os movimentos de
quatro atores num único cenário, por mais de duas horas, sem provocar tédio, não
é tarefa das mais fáceis, assim como orientar os atores na contenção do
sarcasmo cruel de Albee.
Embora
tenha lido o texto, no seu original, há quase quatro décadas, na Faculdade de
Letras da UFRJ, não me lembro de detalhes, todavia considero muito boa a tradução de JOÃO POLESSA DANTAS, que também assina a assistência de direção.
Um
destaque vai para GRINGO CARDIA, por
seu trabalho na direção de arte, cenografia e programação visual.
Boa
a iluminação de MANECO QUINDERÉ.
MARCELO PIES também foi muito feliz nos
figurinos, que retratam bem a época
em que se passa a peça. De uma forma
geral, não se notam grandes disparates entre a maneira de se trajar dos quatro
em cena, entretanto foi reservado um destaque às roupas de Marta, o que combina com sua “importância”, como filha do reitor;
em outras palavras, a que, por tabela, detém o poder naquele ambiente.
Completa
a composição dos personagens o bom visagismo,
comedido, de FERNANDO TORQUATTO.
Boa
a trilha sonora de MARCELO ALONSO NEVES.
Cena de tensão
Raro momento de descontração
EDWARD ALBEE, vivo ainda, aos 85 anos,
afirmou, certa vez: “Se existir uma
história daqui a alguns anos e eu fizer parte dela, atrevo-me a dizer que QUEM
TEM MEDO DE VIRGÍNIA WOOLF? será a peça que melhor se identifica com o meu nome.”
Assino
embaixo, Mr. ALBEE, e recomendo
muito esta encenação, que ficará em cartaz até o dia 22 de dezembro, no Teatro
dos Quatro (Shopping da Gávea), sempre às 6ªs e sábados, às 21h, e aos
domingos, às 20h.
Bravooooo!!!!
ResponderExcluirNão tinha pensado na pergunta que sua análise deixa no ar: a gente ri de quê?
Verdade. Belo texto, Gilberto.
Rimos da desgraça alheia, mas aí nos damos conta que ela não é tão alheia assim. Ótima peça que depois de ter lido várias vezes tive o prazer de ver sua encenação. Parabéns pelo texto!
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