NA COXIA, COM...
...NATÁLIA LANA
Natália Lana.
Natália Lana.
Já a conheço faz alguns anos e o tempo não parece passar
para ela, apesar de não aparentar ter a idade registrada na certidão de
nascimento. Um rosto de menina, jeito de adolescente irrequieta e muito talento
e energia armazenados, os quais ela canaliza para a arte de criar sonhos, em
forma de cenários.
Uma das mais requisitadas profissionais do ramo,
principalmente nos últimos anos, quando vem colecionando prêmios, por seus inesquecíveis
trabalhos, reconhecidamente dignos de premiação, os quais, como eu já disse
sobre outro grande colega seu de profissão, Rogério Falcão, deveriam
ficar guardados, após o final da carreira dos espetáculos, expostos, num “Museu da Cenografia”, que deveria ser
criado, minha conversa de hoje será com NATÁLIA LANA, cujo nome nos
reporta à magia dos espaços cênicos, da cenografia, mas que também assina,
esporadicamente, figurinos, como já o fez para grandes e inesquecíveis
montagens.
Numa só pessoa, de estatura baixa, como a de NATÁLIA, custa-nos crer que possa caber tanto talento, generosidade, simpatia, carisma e humildade, qualidades que, raramente, vemos reunidas num único ser humano, principalmente em se tratando de artista, um ser, muitas vezes, difícil de ter seu ego autodominado ou administrado por outrem.
Além de ser uma grande artista de criação para o TEATRO
brasileiro, também já colaborou, por dois anos, para a formação de novos
profissionais da sua área, época em que lecionou cenografia, na Faculdade de
Belas Artes da UFRJ, dando enfoque à criação e às técnicas de construção e
montagem.
NATÁLIA já assinou um sem-número de cenários, para diversos projetos teatrais de sucesso. Por suas últimas criações, dignas de todos os elogios, seu nome nos reporta a espetáculos musicais, entretanto, também, são dela os cenários de "Homemúsica1", de Michael Melamed; “Blitz”, com direção de Ivan Sugahara; “No Piano da Patroa”, com de direção de Lena Horn; "Anticlássico - Uma Desconferência e o Enigma Vazio", de Alessandra Colassanti; o projeto "Abracadabra - Reder Circus", "Diário do Farol - Uma Peça Sobre a Maldade", "Contos Negreiros do Brasil", “Qualquer Gato Vira-Lata Tem Uma Vida Sexual Mais Ativa Que A Nossa”, com direção de DONA Bibi Ferreira, além de outros.
(Divulgação.)
No campo dos musicais,
especificamente, que lhe renderam várias indicações a prêmios e a conquista de
muitos, destacam-se “Cássia Eller, O Musical” e “Rock in
Rio, O Musical”, em parceria com Nello Marrese e direção de João
Fonseca; “Constellation”, com direção de Jarbas Homem de
Mello; “60! Década de Arromba - Doc.Musical” e "70?
Década do Divino Maravilhoso - Doc.Musical", de Marcos Nauer
e Frederico Reder; "Conserto para Dois", de Jarbas
Homem de Mello e Cláudia Raia; e "Bibi - Uma Vida em
Musical " e “A Cor Púrpura, O Musical”, ambos dirigidos
por Tadeu Aguiar, com grande destaque para este, uma unanimidade, entre
público e crítica especializada.
Também foi responsável pela cenografia dos espetáculos “Hiperativo”,
de Paulo Gustavo, e “Porto de Memórias” e "P.O.E.M.A",
com direção de Regina Miranda.
(Divulgação.)
Participa
de um trio criativo, junto com o diretor Fernando Philbert e o iluminador
Vilmar Olos, intitulado “CENA COLETIVA”, já tendo realizado
13 espetáculos em conjunto. O mais recente deles, “Ao Redor da
Mesa, Com Clarice Lispector”, estava em cartaz, no Espaço SESC
Copacabana, quando teve sua carreira ceifada, ou interrompida, pela
epidemia de COVID-19.
Algumas montagens de sucesso, todas premiadas, para as
quais NATÁLIA LANA contribuiu, com seu talento, foram "Makuru - Um
Musical de Ninar", de José Mauro Brant; "Bibi -
Uma Vida em Musical", de Tadeu Aguiar (muitas premiações); e “A
Cor Púrpura, O Musical”, também de Tadeu Aguiar (incontáveis premiações).
Sobre indicações a prêmios: Indicada a 9 prêmios, em 2018,
pelas assinaturas em "Bibi - Uma Vida em Musical", "Makuru
- Um Musical de Ninar", "O Escândalo Phillipe
Dussart", "Diário de Pilar na Grécia" e "70?
Década do Divino Maravilhoso - Doc.Musical". 2019 foi outro
ano de muitas indicações e várias conquistas de prêmios, pelo espetáculo "A
Cor Púrpura, O Musical”.
Só com a dupla Charles Möeller e Claudio
Botelho, NATÁLIA LANA trabalhou, na assistência de
cenografia, em “A Noviça Rebelde”, “Hair”, “Um
Violinista no Telhado”, “Gypsy” e “7 – O Musical”,
entre outros espetáculos.
Para conhecer melhor os trabalhos de NATÁLIA LANA, na área da cenografia, acesse o “portfolio visual” no “site” http://www.behance.net/natalialana.
1) O TEATRO ME REPRESENTA: NATÁLIA,
é um prazer enorme poder bater este papo com você, dizendo, de antemão, que vou
procurar conduzir os trabalhos pelo viés profissional, do crítico de TEATRO,
tentando anular o seu grande admirador, e amigo, brincando, “atuando”,
de jornalista, entrevistador. Acho que, como primeira pergunta, cabe desejar
saber como, quando e onde se deu a sua formação acadêmica, especificamente,
voltada para a cenografia, e se, nesses estudos, você também desenvolveu outra
atividade paralela, como a de figurinista, uma vez que, também, já foi
responsável por esse setor, em algumas montagens teatrais.
NATÁLIA LANA: É um prazer enorme poder participar de um projeto que GILBERTO BARTHOLO esteja desenvolvendo, este grande admirador de TEATRO e, por que não dizer, um HOMEM DE TEATRO, que sempre nos incentiva e instrui, com suas críticas, complexas e bem elaboradas. (Aqui, eu faço um sincero agradecimento à querida NATÁLIA, por suas palavras.) Talvez seja bom falar, um pouco, de minha vida, antes de embarcar nesta paixão, que é a cenografia. Tive o privilégio de nascer em uma família de artistas, com pai e mãe publicitários, que se conheceram na Escola de Belas Artes, chamada carinhosamente de EBA; portanto, os passeios de infância, com meus irmãos, por muitas vezes, eram relacionados à arte. Minhas melhores lembranças de infância foram passadas em locais como o MAM, o Museu de Belas Artes ou algum outro museu ou local de cultura. Desde nova, criava maquetes e inventava brinquedos. Quando chegou o momento de escolher qual curso superior cursar, a EBA me pareceu um caminho natural. A princípio, pensava em cursar escultura, mas, por ter uma inclinação matemática e o gosto pela logística de projeto, acabei despertando interesse pela cenografia. Chegando à Escola de Belas Artes, senti que aquele era meu lugar; finalmente, encontrei meus pares. A EBA me proporcionou contato com conhecimentos que trago guardados, como tesouros, e sou muito grata a diversos grandes mestres que pude encontrar em minha trajetória. No meio do curso, na parte profissional, sentia falta de práticas de montagem, pois, na minha época, o curso não oferecia essas práticas. Foi, então, que prestei concurso de transferência e ingressei na Escola de Teatro da UNIRIO, onde pude aprender, na prática, o fazer teatral. Já formada em cenografia, ingressei no curso de arquitetura, cursando boa parte dele, mas tive que interromper o curso, pois já estava trabalhando muito, em cenografia, e comecei a dar aula, de cenografia também, como professora substituta, na UFRJ. Não posso deixar de ressaltar o meu marido e grande incentivador, Tony Lupidi, que me auxilia e com quem aprendo muito, na área de projetos em 3D e computação. Uma área do conhecimento que foi, e é, essencial, na minha formação, é o conhecimento empírico que recebo, da troca que tenho com técnicos de TEATRO e galpão e o grande mestre que tenho, como parceiro de TEATRO, o cenotécnico André Salles.
"Homemúsica1"
(Divulgação.)
"Homemúsica1"
(Divulgação.)
2) OTMR:
Uma curiosidade: existem dois termos, considerados sinônimos (Ou estarei
errado?), os quais, para um leigo – e creio que, até mesmo, para os que
fazem parte do universo teatral -, criam uma certa confusão: “cenário”
e “cenografia”. É comum ver os dois termos se alternando nas
fichas técnicas. Chamamos de cenógrafo(a) a um(a) profissional que se ocupa
dessa parte, vocábulo formado pelo processo de “redução” da palavra “cenografia”.
Existe o termo “cenarista”, nada tendo a ver com “cenário”,
como sendo a “pessoa que faz a adaptação cinematográfica de um enredo”,
também podendo ser aplicado ao TEATRO, com o mesmo sentido de “roteirista”.
A pergunta é: qual é a diferença, se é que ela existe, entre “cenário” e
“cenografia”?
NL: Esta é uma pergunta que pode gerar várias respostas. Pamela Howard, em seu livro "O que é Cenografia?", fez esse exercício de fazer esta pergunta a alguns cenógrafos, e as respostas são as mais diversas. Costumo usar a palavra “cenário”, quando me refiro a um cenário específico. Por exemplo: Este foi o “cenário” que fiz para o espetáculo "A Cor Púpura". Quanto à “cenografia”, parece-me uma expressão mais ampla, quase que um grupo e subgrupo de um nome científico. Para mim, a “cenografia” é a arte de criação do espaço, de forma mais ampla.
"Blitz"
(Portfólio Natália Lana.)
3) OTMR:
Fale um pouco de como você percebeu que seu futuro profissional estava em
projetar, criar, imaginar cenários? Como surgiu essa vocação?
NL: Na universidade, já percebi que aquele era meu caminho. Encontrei-me
não somente com a criação, mas também com a confecção de adereços, pintura de
arte; enfim, toda esta gama artesanal que a cenografia proporciona. Mas comecei
a me entender como uma pessoa de TEATRO, trabalhando com o cenógrafo Nello
Marrese, um profissional do palco, ator, diretor, figurinista e cenógrafo,
de grande talento. Tivemos uma parceria de dez anos, quando fui assistente dele
e assinamos alguns projetos juntos.
"Não Sobre Rouxinóis" (assistente de Nello Marrese)
(Foto: Dalton Valério.)
"Piquenique no Front"
(Portfólio Natália Lana.)
"Agonia do Rei" (figurinos).
(Portfólio Natália Lana.)
4) OTMR:
Que critérios, basicamente, a fazem acreditar num projeto e a aceitar fazer
parte da equipe de criação?
NL: Penso que a cenografia é uma arte que está a serviço de
algo maior, que é o espetáculo. Quando digo “a serviço”, não me
refiro a serviço de possíveis vaidades, mas a serviço da cena. O que me encanta,
em cenografia, é a pluralidade estética que posso desenvolver. Com isso, acabo
criando cenários dos mais diversos. E, para isso, preciso ter liberdade e
confiança, para executar minha função.
"Aos Domingos".
(Portfólio Natália Lana.)
"A Ratoeira".
(Portfólio Natália Lana.)
(Porto de Memórias".
(Portfólio Natália Lana.)
5) OTMR:
Acredito que seja muito trabalhoso e difícil criar um cenário de época. Isso
demanda um longo e cansativo tempo de pesquisa, além de muito meticuloso. E o que mais? Diante de uma
proposta desse tipo, você se utiliza de assistentes, como também já foi um dia?
NL: Todo trabalho demanda uma grande
pesquisa, e este momento é um dos que mais me proporcionam satisfação, mas,
além da criação, temos toda a parte envolvida no projeto: detalhamento,
orçamentos, logísticas e listas sem fim. Para isso, conto com duas grandes
parceiras, e cenógrafas, Marieta Spada e Gisele Batalha, e com o meu
irmão, Kadu Lobato. Essas parcerias são fundamentais para a realização
de um projeto, principalmente em grandes musicais, em que a demanda é enorme. Passei
muitos anos sendo cenógrafa assistente de diversos cenógrafos e posso perceber
a grande importância dessa função, no processo, como um todo.
"No Piano da Patroa"
(Portfólio Natália Lana.)
"No Piano da Patroa".
(Portfólio Natália Lana.)
"No Piano da Patroa".
(Foto: Rubens Cerqueira.)
6) OTMR: Que
elementos, especificamente, como paredes, móveis, objetos de decoração, por
exemplo, fazem parte de um cenário?
NL: A cenografia pode ser executada das mais diferentes formas
e materiais, mas temos elementos e maquinarias básicas da cenotecnia, como trainéis,
praticáveis e muitos outros recursos, com os quais trabalhamos. Seria
impossível citar todas essas estruturas, mas, no nosso canal youtube/cenogravando,
tratamos muito da parte construtiva da cenografia e temos uma “playlist”,
denominada CENO TEC, na qual demonstramos o uso e a construção dessas
estruturas tão importantes para o fazer da cenografia.
"Anticlássico - Uma Desconferência e o Enigma Vazio"
(Foto: Paula Kossatz)
7) OTMR:
Às vezes, numa ficha técnica, a rubrica cenário/cenografia não existe, porém,
para substituí-la, deparamo-nos com a chamada “direção de arte”.
Isso é apenas sofisticação ou o termo engloba mais alguns elementos plásticos,
presentes no espaço cênico do espetáculo?
NL: O termo “direção de arte” vem do cinema e é
utilizado, por vezes, em TEATRO. A meu ver, essa função tem maior possibilidade
de acerto, quando o profissional responsável por ela cria tanto a "cenografia" quanto o "figurino".
"Qualquer Gato..."
(Divulgação.)
"Qualquer Gato..."
(Portfólio Natália Lana.)
"Qualquer Gato..."
(Divulgação.)
8) OMTR: Eu
sempre a conheci como uma artista de criação, assim como são os figurinistas,
os iluminadores, os visagistas, os responsáveis pela parte de música e som... Eu
não consigo enxergá-la em outra função, numa montagem teatral, mas já lhe
passou, alguma vez, pela cabeça, o desejo de desenvolver outra atividade, numa
produção teatral, atuando, dirigindo, produzindo ou executando outra função
ligada ao TEATRO?
NL: Na verdade, eu atuei em várias áreas, antes de trabalhar, exclusivamente, com criação. Desenvolvi vários outros trabalhos, como aderecista, pintora de arte, cenógrafa assistente e produtora de objetos. Mas sempre dentro do universo da cenografia. Nesta quarentena, tenho descoberto uma nova área de interesse, editando e produzindo conteúdos educacionais, como o “CENOGRAVANDO”, com Marieta Spada, e o “CENA COLETIVA”, com Vilmar Olos e Fernando Philbert. Esta pergunta é, realmente, muito importante, pois, na formação acadêmica em cenografia, muito se fala da função do cenógrafo criador, mas, para a verdadeira realização de um cenário, contamos com diferentes funções.
"Contos Negreiros..."
(Divulgação.)
"Contos Negreiros..."
(Divulgação.)
9) OTMR:
Como se dá o seu processo de criação, tão logo aceita fazer parte de um
projeto?
NL: Tenho uma metodologia de
processo que, por vezes, varia, mas costumo iniciar com uma pesquisa visual,
histórica e do tema, propriamente dito, podendo acrescentar, a essa pesquisa,
sons e sensações. Normalmente, apresento essa primeira pesquisa ao diretor,
para entender se a minha linha de pensamento está trabalhando em harmonia com a
linha da direção. Costumo ser uma das primeiras profissionais a iniciar o
trabalho junto com a direção; por vezes, antes mesmo do texto. Só então, parto
para os desenhos. Entendo o desenho não somente como representação, mas também
como ferramenta de estudo. Tenho utilizado muitos programas de modelagem e
renderização em 3D, para que, cada vez mais, possa estudar, no projeto,
o que vamos ter na realidade.
"Diário do Farol..."
(Foto: Rafael Blasi.)
10) OTMR:
A pergunta, certamente, vai soar como óbvia, uma vez que parece que todos já
sabemos a resposta, entretanto é possível que muitos estejam enganados ou a têm
de forma incompleta. Você poderia sintetizar qual é a real função do "cenário" num espetáculo teatral, assim como a sua importância? Ele é imprescindível para
que se consiga erguer uma peça teatral?
NL: Entendo que a boa cenografia funcione como dramaturgia. Ela tem a
função de, junto com os outros elementos, contar uma história. Por muitas vezes,
a cenografia, como uma arte de criação do espaço, proporciona novas formas de
cena. É possível fazer um espetáculo sem cenografia, mas poderia fazer uma
pergunta: Como seria esse mesmo espetáculo com uma cenografia?
"Constellation"
(Foto: LightFarm Brasil.)
"Constellation"
(Foto: LightFarm Brasil.)
"Constellation"
(Foto: LightFarm Brasil.)
11) OTMR:
Você já fez cenários para outros tipos de espetáculo ou eventos, além de TEATRO.
Em que consiste a diferença do trabalho, em cada uma dessas diferentes
propostas?
NL: Trabalho, também, na área de “shows”, tendo
criado cenários para vários artistas, como Lenine, Ludmilla e Nego
do Borel, entre outros, bem como cenários para o “Missisipi Blues
Festival”, em parceria com minha irmã, Barbara Lana. O processo é um
pouco diferente, pois não partimos de um texto e de ensaios, mas, sim, da
música, esta arte tão ampla. E, no caso da música, temos que mergulhar na
estética do artista, para, assim, criar um cenário que possibilite participar
da turnê ou funcionar para a gravação de um DVD.
"Carbono" ("Show" - Lenine)
(Divulgação.)
"Depois do Amor"
(Portfólio Natália Lana.)
12) OTMR:
Você costuma trabalhar apenas em cima de um projeto, por vez, ou consegue se
desdobrar e desenvolver mais de um, simultaneamente?
NL: Infelizmente, seria impossível, financeiramente, viver
somente de um projeto. Por vezes, adoraria ter esta dedicação exclusiva e, por
outras, amo esta multiplicidade.
"Hiperativo"
(Foto : Jiro Goldflus)
"Hiperativo"
(Foto: Jiro Goldflus)
"Hiperativo"
(Foto: Jiro Goldflus)
13) OTMR:
Quantos cenários você cria, em média, por ano?
NL: Depende um pouco do ano e do tamanho dos projetos. Quando
trabalho em um musical, por exemplo, acabo tendo que não me comprometer com
muitos outros projetos ao mesmo tempo. Em média, crio em torno de 10 ou 12 cenários em um ano, mas já aconteceu de terminar um ano, tendo me envolvido em
mais de vinte projetos, e outros, quando me envolvi numa quantidade menor.
"Makuru..."
(Foto: Marian Starosta)
"Makuru..."
(Foto: Marian Starosta)
"Makuru..."
(Foto: Marian Starosta)
14) OTMR:
O cenógrafo tem liberdade total de criação ou as ideias para os cenários estão
na dependência direta da concepção do diretor para o espetáculo? Como se dá
esse diálogo?
NL: O TEATRO é uma arte coletiva e a total liberdade me
parece uma utopia. Em certos projetos, tenho, mais ou menos, liberdade, mas,
com o passar dos anos, tenho escolhido participar de projetos que me
proporcionam mais liberdade, para que possa, realmente, contribuir para a cena.
Mas o diálogo é muito rico, e penso que é bom estarmos abertos para a mudança.
Gosto tanto de criar, que, quando um projeto não é aprovado, acabo me
apaixonando por outro.
"Cássia Eller"
(Foto: Marcos Hermes.)
"Cássia Eller"
(Foto: Marcos Hermes.)
15) OTMR:
O trabalho do cenógrafo termina com a estreia do espetáculo ou continua durante
toda a temporada? Neste caso, de que
maneira?
NL: Salvo casos de remontagem, normalmente, o meu trabalho é
considerado entregue no dia da estreia. A partir daí, o cenário toma vida na
mão dos atores, músicos e bailarinos.
"Rock in Rio..."
(Divulgação.)
"Rock in Rio..."
(Divulgação.)
"Rock in Rio..."
(Divulgação.)
16) OTMR:
Que cenário você considera ter sido o mais trabalhoso para ser criado? Por quê?
NL: Cada projeto que estou realizando, num determinado
momento, me parece o projeto da minha vida, e isso me instiga a, cada vez mais,
buscar o melhor possível, lembrando sempre da tríade: tempo, orçamento e
qualidade. Poderia citar alguns trabalhos, mas, com certeza, os musicais são os
que, normalmente, demandam mais tempo de dedicação.
"...Pilar..."
(Foto: Marcos Silva.)
"...Pilar..."
(Foto: Marcos Silva.)
17) OTMR:
E o mais difícil de ser confeccionado?
Por quê?
NL: As dificuldades variam, Por
vezes, temos um cenário mais complexo, como o de um musical, mas, ao mesmo
tempo, temos mais estrutura de equipe. Em outros casos, um cenário visto como
mais simples se torna muito complexo, por conta da equipe reduzida.
"O Escândalo..."
(Foto: Paula Kossatz.)
"O Escândalo..."
(Foto: Paula Kossatz.)
18) OTMR:
Que trabalho cenográfico de algum colega você gostaria de ter assinado?
NL: Admiro o trabalho de inúmeros
cenógrafos brasileiros e estrangeiros, mas nunca me vi pensando assim. Talvez,
a partir desta pergunta, possa começar a me questionar dessa forma.
"Conserto..."
(Divulgação.)
"Conserto..."
(Divulgação.)
19) OTMR: Você teria o desejo de criar cenários grandiosos para a televisão? Falo de “cidades cenográficas”.
NL: A cenografia para a televisão se
assemelha muito à criação de arquitetura e, normalmente, é, verdadeiramente,
criada por arquitetos. Apesar de minha formação como arquiteta, acabo me
interessando mais por uma criação mais escultórica da cenografia. Mas a vida
nos leva para diferentes caminhos, e um pensamento de hoje pode se transformar, amanhã.
"60!..."
(Divulgação.)
20) OTMR:
Quais as suas referências profissionais, na sua área, obviamente, do passado e
atuais?
NL: As minhas referências são as mais diversas, pois acabo
bebendo em várias águas de criação, tanto em artes plásticas, como em
cenografia. Acaba que, em cada projeto, eu busco referências diferentes.
"60!..."
(Divulgação.)
"60!..."
(Divulgação.)
"60!..."
(Divulgação.)
21) OTMR:
Qual cenário seu você considera sua “obra-prima”? Por quê?
NL: Escolher uma cenografia favorita seria como escolher um
filho de que se goste mais. Acho que seria pretensioso da minha parte ter uma “obra-prima”,
mas trabalhos como os que realizo no “CENA COLETIVA”, em parceira
com o iluminador Vilmar Olos e com o diretor Fernando Philbert, muito
me orgulham, além de vários musicais dos
quais tenho tido o privilégio de participar.
"70?..."
(Foto: Robert Schwenck.)
22) OTMR: Como
você reage às críticas negativas a algum trabalho seu, quando as considera
improcedentes? Refiro-me à crítica “especializada” e a do público, em
geral. O retorno do público chega até você?
NL: Muitas pessoas chegam a mim, por meio do “youtube” e
do “instagram” ou, até mesmo, por encontros nos Teatros. Tento
sempre ouvir críticas negativas e aprender com isso, mas, por sorte e por
trabalhar duro, recebo bem mais críticas positivas. Mas entendo que temos que
aprender a filtrar, tanto as críticas positivas quanto negativas.
"70?..."
(Foto: Robert Schwenck.)
"70?..."
(Foto: Robert Schwenck.)
23) OTMR: Você
trabalha com uma equipe fixa, para a confecção dos cenários, ou com diferentes profissionais
em função de algum detalhe?
NL: Sempre que possível, trabalho com o cenotécnico André
Salles, meu parceiro de TEATRO há mais de 21 anos. Ele é um
profissional atento, extremamente inteligente e talentoso. Tenho diversos
parceiros já citados anteriormente, bem como pintores de arte e aderecistas com
os quais trabalho.
"70?..."
(Foto: Robert Schwenck.)
"70?..."
(Foto: Robert Schwenck.)
24) OTMR:
Você é daquelas que apenas supervisionam o trabalho de construção do cenário ou
também “mete a mão na massa”?
NL: Já "meti muito a mão na massa", mas, como
a parte de pesquisa, projeto, detalhamento e orçamentos demanda muito do meu
tempo, acaba não sobrando muita disponibilidade para essa parte mais artesanal.
Mas acabo, sempre, fazendo algum objeto ou adereço, pois isso me proporciona uma
enorme satisfação.
"Bibi..."
(Divulgação.)
25) OTMR:
Você faz maquetes dos cenários ou só os traça no papel e já parte para a
execução?
NL: Maquete física raramente faço, a não ser quando é necessário um estudo de volumes, para maior compreensão, mas maquete 3D realizo sempre, independentemente da dimensão do projeto, pois esses desenhos fazem parte do meu processo de criação.
"Bibi..."
(Divulgação.)
"Bibi..."
(Divulgação.)
26) OTMR:
O cenógrafo participa dos ensaios de uma peça ou trabalha isoladamente, em seu
atelier, escritório ou coisa parecida? Qual o grau de envolvimento direto do cenógrafo
com o processo de criação do espetáculo?
NL: Isso varia de cenógrafo para cenógrafo. Eu costumo
participar bastante dos ensaios, pois o espetáculo é um organismo vivo e gosto
de estar presente, para sugerir novos usos daquele espaço e para modificar o
projeto, se necessário. Cada vez mais, temos menos tempo de montagem no Teatro;
portanto, esse acompanhamento e um projeto estudado são primordiais.
"Bibi..."
(Divulgação.)
"Bibi..."
(Divulgação.)
27) OTMR:
Como há muitos espetáculos para poucas salas, torna-se difícil encontrar uma
pauta nas grandes cidades, como Rio de Janeiro e São Paulo. Alguns Teatros, pejorativamente
chamados, por alguns, de “Teatros de alta rotatividade”, chegam a
abrigar, simultaneamente, quase uma dezena de espetáculos, em dias e horários
alternativos, contando com os infantis.
Isso passou a ser mais uma preocupação para o cenógrafo, que se vê na
contingência de ter de fazer algo fácil de ser montado e desmontado? O mesmo se aplica a espetáculos que se
destinam a viajar? Isso limita a
criatividade do artista?
NL: Não sei se, exatamente, limita a criatividade, mas, com
certeza, é mais um desafio, pois temos que ter um cenário criativo, que
contribua para a cena, que caiba em uma verba, normalmente reduzida, que seja
desmontado e que seja transportado no menor custo possível; em resumo, muitas
demandas. Mas, quando se tem uma equipe técnica profissional e uma produção que
entenda a importância da cenografia para a cena, tudo fica mais fácil, pois
estaremos trabalhando no coletivo. Posso citar o exemplo de "A Cor
Púrpura", em São Paulo, em que metade da casa era desmontada todos
os dias.
"Bibi..."
(Divulgação.)
"Bibi..."
(Divulgação.)
28) OTMR: Quando
surgiu a pandemia de COVID-19, em qual(quais) projeto(s) você estava
trabalhando? E como é que fica agora?
NL: Estava para estrear "Quando
For Mãe, Quero Amar Desse Jeito", com direção de Tadeu Aguiar
e texto de Eduardo Bark; "Cliff", com direção de
Fernando Philbert e atuação de Gustavo Gasparani; e "Vozes",
com direção de Frederico Reder. Todos os espetáculos foram adiados e,
realmente, não sabemos quando vai ser possível retornar.
"Bibi..."
(Divulgação.)
"Bibi..."
(Divulgação.)
29) OTMR:
Na minha visão, se pusermos em prática o bom senso, creio que, infelizmente, o
ano teatral de 2020 já pode ser dado como encerrado, não se considerando
as várias tentativas que vêm sendo feitas de “TEATRO”, feito por “streaming”,
nas mais diversas plataformas, uma atitude de coragem e resistência, à qual eu
dou total apoio. Tenho prestigiado algumas, porém, valem muito mais pelo ato
político, de resistência e sobrevivência, do que, propriamente, pela qualidade
artística, pelas muitas limitações e grandes óbices que envolvem essas
transmissões (Falo do aspecto tecnológico.). Já há algum projeto de “TEATRO
de verdade” acertado para o próximo ano? Pode nos antecipar?
NL: Todos os projetos nos quais estava envolvida estão em
suspenso. Tenho participado de algumas experiências “on-line” e
na tela. Fica, ainda, mais clara a importância de uma cenografia.
"A Cor Púrpura..."
(Divulgação.)
30) OTMR:
Há alguma diferença técnica entre criar cenário para um musical e para
espetáculos que não o sejam, o chamado TEATRO “declamado”?
NL: O musical é nossa ópera contemporânea e, se entendermos
que, na ópera do barroco, surgiu a caixa cênica à italiana, que possibilitou
muitas mudanças de cenografia e que utilizamos até hoje, entendemos que,
normalmente, o musical apresenta a necessidade de mutações de cenário, o que
nem sempre é necessário em um TEATRO dramático ou de comédia.
"A Cor Púrpura..."
(Divulgação.)
31) OTMR:
Eu venho, há alguns anos, me interessando muito por "iluminação" e
tenho percebido grandes novidades, nesse ramo, que, de uma forma direta, estão
relacionadas com a cenografia. São muito os trabalhos em que você e o grande iluminador
Vilmar Olos trabalham juntos. E os resultados são sempre fabulosos. Qual a relação e a importância desse
binômio cenografia/iluminação e como se deu esse “casamento”, que,
queiram os Deuses do TEATRO, me parece indissolúvel, com o querido Vilmar?
NL: Tenho grandes parceiros iluminadores, como Rogério Wiltgen, mas, realmente, a parceria com oVilmar é muito especial. E, nesta fase de isolamento social, temos nos unido ainda mais, no estudo da relação da iluminação com a cenografia. Ter um parceiro de trabalho como o Vilmar é, de verdade, um presente dos Deuses do Teatro. Muitas vezes, em nossos trabalhos, fica impossível dissociar o cenário da iluminação. Outras parcerias que, para mim, têm sido muito frutíferas são as que estabeleci com os diretores Fernando Philbert, Tadeu Aguiar e Frederico Reder.
"A Cor Púrpura..."
(Divulgação.)
"A Cor Púrpura..."
(Divulgação.)
32) OTMR: O
sucesso do trabalho do cenógrafo está na dependência direta da execução de seu
projeto, por parte dos cenotécnicos. A sua equipe é muito grande e já trabalha fixamente
como você ou varia, a cada nova produção?
NL: Parece-me que já respondi a esta questão acima, mas,
realmente, é impossível fazer cenografia e, até mesmo, TEATRO sem
técnicos. Meu grande parceiro, que admiro muito, é o cenotécnico André
Salles.
"A Cor Púrpura..."
(Divulgação.)
"A Cor Púrpura..."
(Divulgação.)
33) OTMR:
Embora eu considere um elemento à parte, e que já estava na hora de os prêmios
de TEATRO reservarem um, isolado, para a categoria “videografismos”,
eles, que, cada vez mais, vêm sendo utilizados nas produções teatrais, ainda
estão sendo considerados como fazendo parte do cenário. Como você encara a
inclusão desse componente “hi-tech” no TEATRO?
NL: Desde que comecei a trabalhar com cenografia, já se fazia
o uso de videografismos, mas o advento do “video mapping”, realmente,
criou uma nova forma de trabalhar, possibilitando a projeção nas mais diversas
superfícies. Três grandes parceiros, nesse processo de criação, tão interligada
à cenografia, são os irmãos Rico e Renato Vilarouca e Thiago
Stauffer.
"A Cor Púrpura..."
(Divulgação.)
"A Cor Púrpura..."
(Divulgação.)
"A Cor Púrpura..."
(Divulgação.)
34) OTMR:
O TEATRO é “arte do faz-de-conta”, em que “tudo é de mentirinha”,
inclusive no cenário (até a página 5). Para o premiadíssimo musical “A
COR PÚRPURA – O MUSICAL”, você criou um cenário que eu considero uma
verdadeira OBRA-PRIMA. Gostaria de que você falasse um pouco sobre ele,
sua concepção e construção, e “nos provasse” que aquilo tudo, que
parecia madeira, portanto, pesado, não o era, a ponto de o elenco fazê-lo girar
com relativa facilidade.
NL: Fico grata pelo elogio e,
realmente, este cenário me proporcionou muitas alegrias, felicidade e reconhecimento,
por meio do público e dos prêmios, tendo sido indicado a 6 prêmios e
recebido quatro. Em uma entrevista escrita, seria difícil descrever toda a
complexidade dessa cenografia, mas, no nosso canal youtube/cenogravando,
fizemos dois vídeos, nos quais mostramos tudo sobre essa cenografia.
"Ao Redor da Mesa,..."
(Foto: Nil Caniné.)
"Ao Redor da Mesa,..."
(Foto: Nil Caniné.)
"Ao Redor da Mesa,..."
(Foto: Nil Caniné.)
"Ao Redor da Mesa,..."
(Foto: Nil Caniné.)
"Ao Redor da Mesa,..."
(Foto: Nil Caniné.)
UMA
OBSERVAÇÃO FINAL:
Quando
estava encerrando esta “matéria”, lembrei-me de um detalhe interessante,
que diz respeito à revelação do cenário, para o público.
Antigamente,
quando as pessoas adentravam o auditório, as cortinas estavam sempre
fechadas, e a plateia ficava imaginando o que veria, quando fossem abertas.
A
partir de um determinado momento – não vou me lembrar, exatamente, de quando –,
começaram a aparecer espetáculos em que a cortina continuava fechada, na
entrada do público, porém um detalhe do cenário - um objeto ou um móvel, como
uma bacia, um microfone de pé, uma cadeira, uma mesa ou qualquer outra coisa -
ficava à frente da cortina, no proscênio, iluminado por um foco de luz, com
muito ou pouco destaque. Aquilo – para mim, pelo menos – aguçava bastante a
curiosidade do espectador, que passava a fazer um exercício de imaginação,
pensando na relação daquele objeto com o restante do cenário.
Hoje
em dia, na grande maioria dos espetáculos, ao entrar no salão, o público já
encontra o palco com as cortinas abertas e o cenário à mostra, revelado, com ou
sem iluminação, forte ou fraca. Não há mais aquele mistério de outrora.
Parece
um detalhe “bobo”, sem maior importância, mas deixo, para cada um dos
que me leem, uma reflexão sobre o que preferem ver, quando entram, no auditório
de um Teatro e olham logo para o palco.
EU PREFIRO A SEGUNDA OPÇÃO.
E VAMOS AO TEATRO (QUANDO HOUVER SEGURANÇA.)!!!
OCUPEMOS TODAS AS SALAS
DE ESPETÁCULO DO BRASIL (QUANDO HOUVER SEGURANÇA.)!!!
A ARTE EDUCA E
CONSTRÓI!!!
RESISTAMOS!!!
COMPARTILHEM ESTE
TEXTO, PARA
QUE, JUNTOS, POSSAMOS DIVULGAR O QUE HÁ DE MELHOR NO
TEATRO BRASILEIRO!!!